The Ascent é daqueles jogos que se preza a ser jogado com o cérebro desligado. Embora comigo não faça grande diferença, tenho que admitir que depois do impacto inicial em que adoramos a forma como o mundo foi construído, o jogo acaba por nos levar de forma descomprometida até chegarmos aos momentos em que o grind é forçoso demais. Sejamos honestos, o jogo é giro, mas não é uma grande especialidade.

O único jogo em ambiente cyberpunk que verdadeiramente gostei foi Ghostrunner. Sempre associei isso um bocado ao facto de ser sempre passado no interior dum edifício, o que diluía muito algumas das caracterizações que considero exageradas, e pela mesma razão dispensava a necessidade da construção dum mundo real, ao mesmo tempo que oferecia todas as novidades tecnológicas e uma história pós-apocalíptica que todos esperamos. The Ascent representa ao mesmo tempo o oito e o oitenta, já que me apresentou um dos melhores mundos cyberpunk que alguma vez vi, mas associou isso a uma história do mais cliché que poderiam ter apresentado, pejada de momentos que variavam entre o não fazer sentido e o nem dar vontade de ler. Ok, lá pelo meio apareciam partes que eram somente cinzentas.

The Ascent joga-se como um twin stick shooter em perspectiva maioritariamente isométrica. Tem pelo meio algumas mecânicas de cobertura como tem, por exemplo, a franquia Gears, mecânica que tem uma ênfase especial já que em muitas secções torna-se um auxiliar muito importante ao nosso progresso. Há também um rudimentar componente RPG, mas somente de subida directa de atributos, em nenhum momento pensei mais que dois segundos no que deveria escolher.

Volto ao mundo porque ele merece mesmo. É impressionante a vida que os programadores incutiram nele. Para onde quer que nos viremos há gente nas suas actividades mundanas, e não só duas ou três pessoas, as cidades estão apinhadas de pessoas, que vão a lojas, andam dum lado para o outro, trabalham, espairecem, comem, enfim andam na sua vidinha sem que aparentemente a nossa presença interesse. Toda essa vida também leva a pontos negativos. Em qualquer escaramuça em que participamos os civis, como é óbvio, temem pela sua vida e fogem, mas no segundo em que a escaramuça acaba retomam a normalidade como se nada fosse, voltando a nossa pessoa a interessar para nada, voltamos ao bom velho obscurantismo que tínhamos apenas uns minutos antes, provavelmente um minuto antes de matarmos os seus melhores amigos como efeito colateral de não ser simples apenas acertar nos maus quando está um maralhal de malta a fugir em todas as direcções. Esse é outro ponto. Embora eu tivesse sido medianamente cuidadoso, não tendo matado nenhum inocente propositadamente, apenas me avisaram para eventuais consequências dessas mortes nas comunicações, quando na realidade não me parece ter sofrido nenhuma enquanto joguei.

Os inimigos sobem de dificuldade consoante a zona, não consoante o nosso nível, e admito que prefiro quando um jogo funciona dessa forma, pois me dá a possibilidade de fazer grind sem me obrigar a combater sempre contra inimigos muito fortes. Neste caso a desvantagem é que temos de voltar múltiplas vezes ao hub inicial, lutando contra os inimigos mais fracotes, que aparentemente não se lembram que são meros insectos na sola do nosso chinelo. Isso aborrece ao fim de algumas horas.

Não é só a subir características que ficamos mais fortes. Vamos apanhando melhores armas e melhor equipamento ou habilidades. Temos também a opção de comprar e vender tudo isso, o que vai tornando a progressão interessante… ao princípio, onde ainda procuramos que arma se adequa melhor a que tipo de inimigo.

Há que reconhecer que numa fase inicial The Ascent é bastante divertido. O combate é recompensador, o bailado entre disparar, desviar, usar cobertura, alternar habilidades, tudo isto acompanhado de música electrónica que não pára um segundo durante o combate é entusiasmante. Não me posso queixar da diversidade dos inimigos, são mesmo diferentes entre si, além disso mesmo esteticamente o são, pois temos humanos, extra-terrestres, animais ou máquinas. Os bosses são bastante mais poderosos que o rufia ralé, e por mais que uma vez tive de subir uns níveis antes de os conseguir derrotar. Também temos alguns pontos em que necessitamos de aguentar uma posição durante alguns minutos. Da maneira como descrevo parece um combate bastante diverso, mas na prática não o é. Tudo funciona em matilha. Ataque meio acéfalo duma turba, atrás doutro ataque meio acéfalo doutra turba. Apesar de existirem mecanismos de fast travel estes não são os ideais, e dá para perceber que o jogo foi programado para existir esta multiplicidade de encontros repetidos, que nos permitem ir subindo de nível e mantermo-nos a par do nível de dificuldade da história.

Mesmo assim não chega. Para compensarmos a dificuldade da história temos de ir fazendo missões acessórias. A maioria delas são simples missões às que chamo “chega-m’isso” em que o NPC nos pede para ir buscar algo. Para além de não acrescentarem nada à história são repetitivas e, por vezes, requerem que entremos em zonas muito acima do nosso nível. Usava-as sempre que precisava de subir uns níveis. A verdade é que este jogo, embora seja perfeitamente jogável enquanto sozinho, parece feito para jogar em cooperativo e talvez às 10 horas de jogo cheguei a uma barreira que não estou disposto a transpor. Embora me sinta bastante poderoso não consigo passar uma secção, e não creio que esteja perto de o conseguir. Como habitualmente o meu filhote mandou-me pastar, isto não é algo que o motive, logo é para esquecer o cooperativo local. Estou a jogar o jogo no PC, usando o serviço Game Pass e, por estranho que pareça, não consegui juntar-me a ninguém. Acho difícil não estar a ter algum problema, já que o jogo é bastante recente e foi muito falado pela Xbox, mas o que é certo é que esta análise acaba por ser somente à campanha jogada a solo.

Tive também um punhado de crashes para o Ambiente de Trabalho, umas dificuldades anormais do meu PC em lidar com a miríade de explosões e outros efeitos visuais que por vezes se conseguem aglomerar no ecrã, mas fora isso não tive outros problemas.

The Ascent é um jogo estranho. Ao contrário da maioria dos jogos indie investiu na forma em vez de no conteúdo. Não quero que me interpretem mal, este é um jogo bem feito, engraçado, bonito e com momentos entusiasmantes falta-lhe, no entanto, aquela pitada de sal que o torne especial. O maior problema é a falta de pontos interessantes na história e o gameplay repetitivo, problemas que até são comuns em vários jogos, e se tiveres amigos com que o possas jogar de certeza que te vais divertir imenso.