A analogia automobilística do título vai ser perdida para muitos até ao final do artigo mas se lá chegarem vão perceber o que quero dizer porque hoje vamos falar de Gloomhaven – Jaws of Lion um dos melhores jogos de tabuleiro de 2020 e talvez dos últimos 20 anos. 

Digo eu. 

E a minha opinião vale o que vale. 

Antes de mais, um ponto de situação sobre o que é Gloomhaven. Criado por Isaac Childres este jogo teve uma campanha de Kickstarter com algum sucesso angariando pouco mais de 385 mil dólares para a sua criação. Após uma avassaladora salva de críticas positivas, foi criada uma segunda campanha em 2017 que angariou 4 milhões de dólares e o jogo deixou de ser exclusivo de Kickstarter passando a ser encontrado em lojas da especialidade. Em Março de 2020 Frosthaven angariou 13 milhões de dólares tornando-se a campanha mais bem sucedida em boardgames no Kickstarter e no mesmo ano Jaws of the Lion foi lançado em venda directa. Isto tudo para dizer que se nós jogadores votamos com a carteira, Isaac Childres e a Cephalofair Games ganham as eleições com maioria absoluta. Mas vamos lá focar outra vez a nossa mira e ver porque vale a pena jogar Gloomhaven – Jaws of the Lion olhando para o que está na caixa:

 

Porque a lista é longa demais e não quero estar aqui o dia todo vou simplificar as coisas

  • 4 miniaturas de personagem para jogadores e acessórios
  • 4 miniaturas surpresa para depois do nível 5.
  • 16 inimigos incluindo bosses e stand-ins para os mesmos
  • Mais de 500 cartas
  • Um manual
  • Um glossário
  • Um livro de campanha
  • Um livro de suporte de campanha
  • Um mapa
  • Tokens para várias funções, inimigos, e cenários
  • Sacos com fecho para guardar os componentes todos arrumados (só por meter isto na caixa estes tipos são os MVP)

Basicamente o que está nesta imagem, quando tiramos tudo ficamos com a ideia que foi construído por Time Lords e a caixa é maior por dentro.

 

O que é e como se joga?

Gloomhaven Jaws of the Lion é um legacy adventure-dungeon crawler para 1 a 4 jogadores que tentam completar uma campanha de 25 capítulos na cidade de Gloomhaven antes dos acontecimentos do jogo principal. Uma espécie de prequela isolada. Podemos controlar o Red Guard, Hatchet, Voidwarden ou Demolitionist cada um com jogabilidade e habilidades diferentes. Idealmente feito para 4 jogadores para tirar o máximo de proveito das combinações de capacidades entre eles é perfeitamente jogado com menos pessoas. Eu estou a meio de duas campanhas, uma a solo em que controlo o Red Guard e a Voidwarden, e outra com a minha mulher em que jogo com o Hatchet e ela como Demolitionist. O jogo é simples, cada missão é feita por turnos nos quais cada jogador tem duas cartas para utilizar, cada uma dessas cartas tem duas escolhas, habitualmente movimento ou acção e os jogadores só têm que escolher o que fazer entre essas com a regra máxima que se escolhem  a acção de uma carta são obrigados a utilizar o movimento da outra. Num ponto de vista simplificado é isto.

Antes de continuar, posso só dizer que nunca vi um jogo tão bem organizado como Jaws of the Lion e acho que todos os criadores de jogos de tabuleiro sejam eles do estilo que forem deviam olhar para esta maravilhosa caixa e a maneira como todo o seu conteúdo está organizado como uma lição em “como deve ser feito”? A sério, já alguma vez abriram um jogo de tabuleiro e por mais arrumado e empacotado que tenha o seu conteúdo ficam assoberbados e não sabem o que fazer com aquilo? Bom, isso não acontece em Jaws of the Lion porque a primeira coisa que vão ver ao abrir a tampa é uma bela folha que nos diz para não mexer em nada até a ler na sua totalidade e essa mesma folha explica tudo o que está lá dentro, para que serve, como devemos abrir e arrumar etc. e esse cuidado é continuado no jogo.

O livro de aventura do jogo funciona também como “tabuleiro”, em cada página (às vezes complementado com o livro suplementar) tem a missão na sua totalidade. Setting, cenário, objetivos, posicionamento inicial de inimigos e tokens, tudo perfeitamente estruturado da forma mais simples do mundo. Também está muito bem desenhado de modo a introduzir qualquer jogador ou grupo de jogadores ao mundo de Gloomhaven e às mecânicas de jogo. As 5 primeiras missões funcionam como tutoriais que explicam gradualmente como se joga. Na primeira missão aprendemos movimentação e acção de personagens, o mesmo para os inimigos e combate. Na segunda trocamos de cartas para os nossos personagens para introduzir ataques mais complexos, introduzimos cartas de acção para os inimigos, armadilhas e loot. Na terceira, novas cartas com efeitos, novos movimentos, compras de objectos e acções entre missões, na quarta são adicionados elementos novos e na quinta como fazer level up entre outras coisas. O importante é que ao chegar ao fim da quinta missão aprendemos com calma e de forma acessível como jogar. Sabemos todas as bases para completar as várias horas que vai demorar acabar esta história interessante.

 

Sendo um legacy game é recomendável que quando começam a jogar mantenham a vossa personagem porque durante as missões vão ter que fazer escolhas de evolução que inclui as cartas do vosso baralho e outras opções, é fácil recomeçar pondo tudo na forma inicial mas até acabarem a campanha não é recomendado, daí eu ter dois jogos com personagens diferentes porque a minha construção de Red Guard para jogar acompanhado de uma Voidwarden é diferente do que seria se eu fosse usar um Red Guard para jogar com o Demolitionist da minha mulher. Podem fazê-lo mas… é convosco se querem andar sempre a trocar de cartas e papéis. 

Já agora vamos falar dos personagens.

Todos eles são interessantes de sua maneira e bastante equilibrados (além disso são muito bem desenhados. Tanto a arte como as miniaturas são cinco estrelas). O Hatchet é o nosso ranger, uma espécie de pistoleiro misterioso que usa machados à distância em vez de pistolas. Move-se bem e apesar de ter sempre desvantagem se for lutar corpo a corpo esta pode ser corrigida parcialmente com a evolução. Demolitionist é o oposto, luta mano a mano e utiliza explosivos. Não ao mesmo tempo. Estes dois são provavelmente os melhores para jogadores mais inexperientes porque são táticos q.b. mas não em demasia enquanto já o Red Guard já tem um nível de estratégia diferente. Ou melhor, dá abertura a táticas diferentes. O Red Guard é o nosso tanque, tem uma movimentação acima dos outros e a sua função é puxar os inimigos para si e absorver dano enquanto distribui algum tanto ranged como melee mas a um nível mais baixo que os outros. A Voidwarden é sem dúvida o mais complexo e deve ser deixada para alguém mais experiente já que é quase como jogar com dois personagens ao mesmo tempo. A sua capacidade de movimento é mais limitada e é um personagem de support e mindcontrol. O que isto quer dizer? Nunca ou raramente ataca directamente, mantém-se longe do foco da acção e dá buffs ou curas aos aliados ou controla a mente dos inimigos para os fazer dar dano a outros. Sabendo jogar com ela pode ser das mais recompensadoras mas é preciso paciência.

De resto não há muito a dizer sobre Gloomhaven Jaws of Lion que não vá estragar as surpresas da descoberta do jogo e do enredo. Acho um jogo quase perfeito para quem quiser entrar neste estilo de aventuras e apesar de não poder dizer que é melhor que Gloom ou Frosthaven posso dizer com toda a certeza que é mais acessível em qualquer aspecto. A única coisa que posso fazer para terminar é utilizar esta comparação:

Isto é Gloomhaven em forma de carro, um Ford V8 de 1932. Robusto e capaz de levar a família ou amigos numa campanha de 200 horas nas quais 120 são passadas a montar a estrutura e numa viagem emocionante mas a velocidade moderada com várias paragens longas

Isto é Gloomhaven Jaws of the Lion em forma de carro, um Ford V8 de 1932 melhorado, com um motor afinado, sem peso desnecessário, rebaixado, esguio e mais fácil de manobrar, pronto a divertir quem está lá dentro ao rodar da chave e arrancando a 120km/h.

Gloomhaven Jaws of the Lion pode ser comprado entre €45 e €55 em várias lojas como esta ou esta.

Gloomhaven já vos vai custar perto do €140 novo aqui, ou se não se importarem da caixa ter alguns danos está mais barato aqui. Também podem ver se há promoções em sites estrangeiros mas eu prefiro dar algum apoio a lojas nacionais e ambas apresentadas são as que uso sempre.