É pouco provável que em 2005 os donos da TT Games tivessem ideia do que o lançamento de Lego Star Wars criaria, e de que forma mudaria a sua empresa. Não falo, obviamente, da questão financeira. A histórica empresa de Knutsford teve quase desde a sua criação uma série de jogos com IPs de alto perfil na mão, e soube sempre respeitá-los e desenvolver grandes títulos à sua volta. A parceria com a LEGO e a Star Wars seria, aparentemente, mais uma de uma longa lista de acordos desde 1989, de um dos estúdios mundiais mais direcionados para jogos familiares. Mas a realidade, como a História nos provou, é que o lançamento de LEGO Star Wars viria a tornar-se altamente lucrativa, condicionando os quase 20 anos seguintes de uma dedicação única à fórmula criada com este título.

Desde 2009 que a TT Games tem desenvolvido exclusivamente jogos LEGO. Da minha parte comprei e joguei a todos, sem excepção, completei a quase totalidade. Um conjunto de 26 jogos que se observarmos do ponto de vista cronológico foram crescendo progressivamente, implementando e melhorando mecânicas, até àquele que foi para mim o momento mais desinteressante, LEGO Worlds, e a aplicação da sua fórmula que efetuaram com The LEGO Movie 2 Videogame

Depois de um ritmo de pelo menos 1 jogo de LEGO por ano – tendo chegado ao máximo de 3 em apenas 12 meses – o hiato de pouco mais de 3 anos desde o lançamento de The Lego Movie 2 Videogame sem qualquer novo lançamento deixou uma certa fome nos fãs da série, como é o meu caso. Aproveitei, porém, para fazer completionist ao backlog que tinha, mas a cada novo vídeo de jogabilidade do anunciado e esperado LEGO Star Wars: The Skywalker Saga tornava as notícias dos sucessivos adiamentos ainda mais dolorosas.

Resta-me dar-vos um enquadramento: os jogos da LEGO da TT Games foram a grande porta de entrada nos videojogos do meu filho mais velho. Ainda hoje sinto que há uma grande aprendizagem cognitiva e de motricidade fina que os jogos da LEGO trazem de forma lúdica. Seja a capacidade de raciocinar para resolver os puzzles, o reconhecimento de que habilidade e personagem utilizar para ultrapassar determinada parte, passando até pelo desenvolvimento da percepção tridimensional dos mais novos. 

Mais de 6 anos depois de LEGO Dimensions ter sido a grande aventura cooperativa partilhada com o meu filho mais velho, é hora dessa passagem de testemunho para o meu filho mais velho, que já se tornou há muito um habitué dos jogos da LEGO. Aliás, foram também eles a porta de entrada nos jogos, ainda a meio da pandemia, com quase 3 anos. É já um ano inteiro de vivência de videojogos, onde a LEGO ainda tem a maior preponderância. Poder partilhar com ele um novo título é o reviver de uma experiência que já tinha tido, demarcando de forma definitiva os jogos da LEGO como momentos importantes das memórias videolúdicas que vamos criando na nossa família.

LEGO Star Wars: The Skywalker Saga chega-nos simultaneamente como um amigo que conhecemos bem, mas ao mesmo tempo um amigo que não vemos há tanto tempo que rapidamente notamos as diferenças das suas mudanças. 

Começando pela ambição de fazer deste possivelmente o maior jogo de LEGO de sempre (se excluirmos Dimensions, obviamente). São 45 níveis espalhados pelos 9 filmes da série, interligados entre si com hubs em mundo aberto que nos impelem a explorar as localizações, tanto nos planetas como nas galáxias. Quem jogou jogos da TT Games sabe que o conteúdo destes jogos não se esgota por terminarmos os seus níveis. Muito pelo contrário. Os mais versados fãs de jogos LEGO dirão que aí é que o jogo realmente começa, com o desbloqueio sucessivo dos modos free play em cada nível e cada planeta, dando-nos a possibilidade de resolver puzzles e locais secretos com acesso a todos os personagens já desbloqueados.

Não sinto que LEGO Star Wars: The Skywalker Saga tenha sido inovador em nenhum dos aspectos, mas tornou-se mais ambicioso e desafiante nesta exploração de mundos fora dos níveis. Várias são as side quests e rumores que referem os outros espaços da galáxia, e que nos impelem a tentar conversar com a maioria dos NPCs assinalados para tentar obter estas informações.

O sistema de rumores foi uma ideia bem implementada: é-nos possível trocar alguns milhares de studs pela informação de onde encontrar algum dos coleccionáveis, sejam personagens ou mesmo minikits espalhados nos níveis.

Os coleccionáveis e conteúdo adicional em cada nível também mudou ligeiramente. Já não temos apenas de apanhar um determinado número de studs para receber o prémio indicado. Agora temos três patamares de recolecção de studs, cada um a conferir-nos um Kyber Block, o novo elemento raro que necessitamos de gastar para desbloquear as muitas skill trees. Mas já lá iremos quanto a isto. Para além disso, cada nível tem um conjunto de desafios escondidos que nos conferem kyber blocks, e cuja informação podemos comprar através de rumores. E claro, os minikits, 5 em cada nível, que servirão para obter as informações de construção de uma nave para a nossa colecção que terá de ser comprada com os nossos mui prezados studs.

O combate foi amplamente melhorado, e parece-me que finalmente a TT Games se afastou do sistema de button mashing básico que notabilizou os seus jogos. Aliás, aprenderam até com uma das subsidiárias, a TT Fusion, e as inovações ao combate que foram implementadas em The Lego Ninjago Movie Video Game. Aqui temos uma miríade de ataques diferentes para fazer combinações, entre três botões de ataque que temos de ir utilizando para encher a barra de multiplicadores de studs. Para combater o nosso button mashing os inimigos começam a bloquear os ataques se carregarmos apenas no mesmo botão. Conseguimos ainda utilizar counters aos ataques dos inimigos, para além de termos dodges disponíveis.

Se a maioria das mecânicas de LEGO Star Wars: The Skywalker Saga parecem clássicas, quase que sinto que para a TT Games houve um compromisso de elevar ligeiramente a fasquia da dificuldade e do desafio do jogo. E não falo apenas dos desafios opcionais, como os coleccionáveis, especialmente os datacards (que vieram substituir os eternos red bricks) que estão escondidos nos hub worlds e que são difíceis de encontrar. Falo dos puzzles comuns de cada nível, que parecem elevar ligeiramente o desafio mecânico. Um bom medidor disso mesmo foi o número de vezes que o meu filho mais novo necessitou de ajuda, comparando com a grande independência que teve em grande parte dos jogos LEGO que jogou.

Outra boa ideia que LEGO Star Wars: The Skywalker Saga trouxe foram as skill trees por classe de personagens – em que utilizamos studs e Kyber Blocks – para melhorar habilidades, seja de Jedi, Sith, Droids de Protocolo, entre muitos outros.

Seguindo o que já tinham conseguido demonstrar em Force Awakens, as dogfights estão verdadeiramente interessantes e dinâmicas, sendo dos meus momentos favoritos do jogo. Utilizar os pequenos X-Wings para atacar os gigantes Star Destroyers enquanto muitos Tie Fighters nos tentam abater, traz um dinamismo muito bem estruturado ao jogo, e que, perdoem-me a comparação, não envergonha de forma nenhuma este LEGO Star Wars: The Skywalker Saga quando comparado com Star Wars – Battlefront II, de 2017.

Por outro lado, parece-me que a equipa da TT Games já tem quase décadas de experiência a adaptar IPs, especialmente filmes, traduzindo-os para níveis divertidos da LEGO. E aqui, ao longo dos 45 níveis, parece-me que muitos deles falham o alvo. Entre as sequências muito pouco originais, e outras muito pouco inspiradas, é fácil sentir que alguns destes momentos representam uma forma apressada de nos conduzir ao longo da história, já que é sabido de antemão que vamos repetir todos os níveis do jogo.

A separação entre nível e os momentos que interligam os níveis também nem sempre soam ao mais entusiasmante. Entre as situações que parecem passagens orgânicas e aquelas que estão completamente cortadas, quase soando a jogos diferentes, quase que sinto que, tirando momentos de algum brilhantismo nos 45 níveis, a grande maioria dos episódios são bastante esquecíveis, fazendo-nos pensar em tantos bons momentos memoráveis de jogos anteriores.

LEGO Star Wars: The Skywalker Saga é possivelmente um dos grandes jogos familiares deste ano. O jogo mais ambicioso que a TT Games já fez, visualmente brilhante a demonstrar a tremenda evolução que o mercado, a tecnologia e o próprio estúdio tiveram desde o primeiro jogo da série em 2005. É diversificado, tem muito conteúdo adicional (ao qual ainda podemos adicionar os DLCs que trazem personagens das séries do Universo Star Wars, como Mandalorian e Bad Batch) e certamente garantirá muitas dezenas de horas de exploração e coleccionismo. 

Depois de ter jogado todos os jogos LEGO tenho dificuldade em dizer se é o melhor. Mecânica e visualmente não tenho qualquer dúvida. Em termos de game e level design até Force Awakens teve momentos mais altos do que o geral deste longo jogo. Mas, ainda assim, é impossível não o definir como verdadeiramente obrigatório, especialmente para quem tem filhos em casa. Acreditem, que dividir a experiência de LEGO Star Wars: The Skywalker Saga com o meu filho mais novo tem sido uma tremenda diversão.