Killzone: Shadow Fall foi o jogo de lançamento da PlayStation 4, aquele que supostamente demonstrava o potencial da então nova consola da Sony. Mas era apenas mais um FPS, que não acrescentava muito ao que se tinha feito na geração anterior. Mal se sabia que a Guerrilla tinha em preparação um ambicioso jogo para lançar anos depois. Algo que nunca tinha feito: um RPG baseado num mundo aberto, num futuro pós-apocalíptico dominado por máquinas e o que resta da humanidade dispersa em tribos. 

A Sony ganhava assim mais um IP impressionante, mais importante, a Guerrilla conseguia descolar-se de uma série gasta e sem expressão. Apresentou-nos um mundo fantástico, uma protagonista carismática e um conceito com capacidade de ser expandido. 

É com naturalidade que Forbidden West se tornou um dos jogos mais aguardados da PlayStation 5. Se o primeiro jogo era um deslumbre gráfico, com um mundo vasto para explorar, como seria a sua versão de nova geração? Os primeiros trailers deixaram logo antever a escalada técnica, novas máquinas, gigantes, prometendo novas abordagens. 

E o primeiro contacto demonstra logo o amadurecimento do novo jogo. Como os jogadores já conhecem o universo, a protagonista e as mecânicas base, a Guerrilla não precisou de muito para construir todo o embalo inicial necessário no primeiro jogo para introduzir a pária Aloy. A guerreira de cabelos de fogo surge neste jogo como uma heroína, com estátuas construídas em sua homenagem e um respeito geral das tribos espalhadas por Meredian. 

E essa familiaridade é transferida para o jogador, que não tem de aprender de novo as mecânicas do jogo, a abordagem às máquinas e as mecânicas principais do jogo. Ainda assim, considerando que podem haver novos jogadores, o jogo começa com um ritmo apropriado, nem que seja apenas para relembrar as suas regras. 

Mas isso significa que estamos perante uma repetição do primeiro jogo, com a escala da nova geração? Podem considerar que sim. Afinal equipa que ganha não se mexe. Mas tudo está elevado a um novo expoente. Muita coisa é familiar, mas a Guerrilla melhorou o jogo em todos os aspetos. Mas também introduziu novas mecânicas, máquinas, armas e claro, abordagens distintas. E há muito mais para fazer neste mundo gigantesco que está muito bem estruturado. 

Começando por duas novas mecânicas: o sistema de gancho e a capacidade de planar. Não são mecânicas novas nos videojogos, e nota-se alguma inspiração em Breath of the Wild, mas que no caso de Horizon funcionam também muito bem. O jogo ganha mais verticalidade ao usar-se o gancho para alcançar locais mais elevados, ainda que só seja possível de o utilizar em locais assinalados. Mas o escudo de energia que serve para planar permite maior flexibilidade a navegar pelo cenário, sem termos a preocupação de saltar de um penhasco e nos despenharmos em baixo. 

Os combates também foram melhorados em todos os sentidos. Há mais golpes e combinações de combos, com o jogo a incentivar a variedade, pois os inimigos topam padrões, desviando-se e defendendo-se. Os humanos são bem mais duros e resistentes, muitos deles munidos com armas de energia que tornam o desafio mais elevado. E o jogo introduz atividades de arenas espalhadas pelo mundo, que servem para testarmos golpes e combos específicos à medida que os vão desbloqueando na árvore de talentos da personagem. Há habilidades especiais para cada arma, que podem ativar quando enchem a respetiva barra. 

E a abordagem às máquinas é mais diversificada. A possibilidade de abordagens furtivas é uma possibilidade, mas há novas aberrações, que necessitam ser analisadas com o sensor especial de Aloy, identificando os seus componentes vitais e pontos fracos que podem ser mirados independentemente. Não só para descobrir os seus pontos sensíveis a elementos como o fogo, veneno, gelo ou eletricidade, como em muitas quests nos é pedido por partes específicas que necessitam ser desmontadas das máquinas antes destas serem destruídas. Componentes que também são usados como ingredientes para fazer upgrade às armas e armaduras que os jogadores devem estar atentos. Isso faz com que as abordagens sejam ainda mais táticas, mediante o que necessitam de farmar

Independentemente disso, os confrontos com as máquinas são brilhantes, seja qual for a abordagem. Por um lado a protagonista está mais poderosa, os jogadores têm mais experiência, mas ainda assim há máquinas verdadeiramente assustadoras. E o estúdio não fez por menos, criando máquinas com um detalhe e complexidade incrível, sejam as mais pequenas às maiores das aberrações. E há algumas bestas gigantes, que nem são bosses, que requerem algumas abordagens cuidadas, planeadas e até com um sentido nos arredores, para que se usem derrocadas, elementos explosivos e outros para ajudar a eliminar. 

Sem querer dar qualquer spoiler quanto à história, se no primeiro jogo tudo se centrou na personagem, no seu crescimento e como uma jovem banida da sua tribo se tornou na heroína que conhecemos. Esta sequela é tudo sobre a construção de um mundo e estabelecer alicerces do que poderá ser o futuro deste universo. E acreditem, o potencial é enorme, com algumas surpresas que estaríamos longe de imaginar no primeiro capítulo. 

Depois de destruir Atlas no primeiro jogo, Aloy descobre que há uma peste que está a destruir a natureza, uma ameaça ao planeta, sendo necessário encontrar a origem e recompor. Isso faz com que a protagonista precise de viajar para o ocidente, uma área interdita devido aos perigos, das máquinas, mas também é ao mesmo tempo um mundo vastíssimo e lindo de explorar. E em termos narrativos, não se apeguem ao que foi introduzido no primeiro jogo, porque muitos dos pilares foram baralhados pela Guerrilla, para dar de novo as cartas das regras. 

Ao longo da aventura a protagonista vai encontrar caras conhecidas do primeiro capítulo, mas também outras que se juntam a si. O estúdio criou uma base que podem regressar e conversar, ficando a conhecer melhor as suas motivações e histórias sobre si. Lembra os clássicos RPGs da BioWare, como Mass Effect e devem perder um pouco de tempo a explorar todas as opções de diálogo. As personagens são carismáticas, com um voice acting brilhante e um design muito definido. 

Se mencionei que o gancho e o escudo para planar eram novidades, também a possibilidade de Aloy mergulhar e explorar mundos subaquáticos é outra novidade. Mais uma nova perspetiva de exploração que adiciona muito à experiência. Este é provavelmente o jogo mais bonito debaixo de água. 

Como seria de esperar, estamos perante um jogo massivo, um mundo aberto com muito por fazer. É interessante que o jogo apresenta uma estrutura narrativa principal, com quests que fazem avançar a história, com outras secundárias, que não sendo obrigatórias têm histórias próprias e recompensas que valem a pena. Mesmo as errands, que são basicamente mini quests conseguem ser mais interessantes que muitos RPGs. E tudo isso recheado com inúmeras atividades, desde arenas de combate, zonas de caça, acampamentos de inimigos para limpar, puzzles de alinhamento de hologramas, cavernas por explorar, casas que funcionam como cofres para penetrar, colecionáveis de diferentes formas para encontrar. Uma imensidade de tarefas para irem explorando. 

E ainda houve tempo para inserir um mini-jogo chamado Machine Strike, que é um jogo de tabuleiro de estratégia, ao nível do Gwent do Witcher 3 ou o jogo de dados Orlog de Assassin’s Creed Valhalla. Há novas peças para procurar e colecionar ou criar com matérias-primas. 

Na minha experiência acabei o jogo em 40 horas, com com cerca de 40% concluído, completando a maioria das quests secundárias e algumas atividades. Pela frente terão mais algumas dezenas para descobrir todo o conteúdo interessante. E a maioria das atividades fazem sentido, são divertidas, contam histórias e recompensam o jogador com armas e armaduras melhores. 

E o mapa é massivo, com diferentes biomas lindíssimos, como montanhas de neve, desertos vermelhos, as zonas costeiras, florestas e pântanos. Os cenários são belíssimos nesta versão PlayStation 5, com uma grande distância do horizonte, ciclos noite e dia e diferentes condições meteorológicas. E há uma grande atenção ao detalhe, tudo parece ter vida, o vento, as partículas de pólen, os insectos, tudo contribui para um quadro rico em texturas e cores. Claro que os efeitos de ray tracing e HDR ajudam, e felizmente o jogo é bastante jogável no modo visual, mas podem optar pelo modo performance e ter maior fluidez nas animações. 

E ainda no que diz respeito aos visuais, o departamento de guarda-roupa fez um trabalho incrível, criando diferentes designs tribais representativos das diversas tribos. À medida que avançam no mapa e conhecem novas tribos, vão reconhecer os seus costumes, ligados às suas pinturas e roupas. E há uma grande diversidade, sendo fácil distinguir aqueles que adotam um estilo de vida mais ligado à terra, como agricultores, aos que utilizam máquinas ao seu serviço. 

O novo jogo oferece diferentes árvores de talento para investirem os pontos, quando sobem de nível, de forma a especializar a abordagem à ação, como guerreira, caçadora, abordagens furtivas, mas também a lidar com as máquinas e elementos de sobrevivência. O sistema de armas funciona de forma semelhante, com diferentes munições com elementos e a possibilidade de inserir gemas nas suas sockets, neste caso circuitos integrados das máquinas.

De notar ainda o uso do DualSense da PS5 para complementar a experiência, desde os gatilhos adaptativos no uso do arco, como o sentir de muitas ações com a sua vibração suave. E o altifalante ajuda a prolongar a experiência, com diferentes sons envolventes, embora se jogarem com auscultadores podem passar despercebidos. 

E também temos de dar os parabéns à Guerrilla pelo extenso leque de opções de acessibilidade, permitindo maior inclusão dos jogadores. Uma medida que os vários estúdios da Sony têm investido nos últimos anos. Mas se há opções para daltónicos, pessoas com limitações visuais ou auditivas, também há ferramentas que tornam o jogo mais fácil, guias e diversas ajudas para jogadores menos experientes. O jogo tem mesmo um sistema de copiloto que permite um segundo jogador, com um segundo comando possa apoiar um utilizador invisual. 

Quando se apanha matérias-primas a mais ou itens que não cabem no inventário, estes são enviados automaticamente para o baú, acessível nos acampamentos e cidades. Uma forma de reabastecer com itens em excesso. Porém, nesta versão, e mesmo aplicada a patch de lançamento, deparei-me com um bug de não conseguir abastecer as poções de energia a certa parte do jogo. Mensagens de que tinha o inventário cheio, mesmo quando estava com os itens a zero. 

Ainda no que diz respeito a alguns problemas assinalados, notou-se alguns pop ups de itens a aparecer, sobretudo em cut-scenes nas cidades. Problemas que à partida foram corrigidas na patch de lançamento. 

Horizon: Forbidden West é uma sequela que expande a narrativa de forma interessante e épica, apresenta novas personagens, histórias, tribos e monstros robóticos. O jogo foi melhorado em todos os aspetos, do sistema de combate, gráfico e introduz novas mecânicas como mergulhar, glide e gancho. É um jogo cheio de atividades para completar e muito para explorar. E por isso, não só é obrigatório para quem gostou do primeiro capítulo, como estamos perante um dos primeiros candidatos a GOTY de 2022.