Muitos não acreditam que o título Salt and Sanctuary foi produzido por apenas uma pessoa, James Silva, o responsável pela Ska Studios. E há cinco anos mostrava-se como era possível fazer um jogo inspirado em Dark Souls, mas num formato de plataformas em perspetiva lateral 2D. Salt and Sacrifice mantém a mesma essência e ainda procura algumas mecânicas típicas de um metroidvania. Agora imaginem jogar um título de Metroid ou Castlevania sem o tradicional mapa: este é o elemento que torna o novo capítulo ainda mais difícil e ingrato. 

Sempre que um jogo se apresenta com uma dificuldade acima do normal, o cliché é dizer que este não é para todos. Mas acreditem, Elden Ring “é um menino” perto de Salt and Sacrifice. O jogo é difícil, os inimigos não dão tréguas e a nossa personagem começa a aventura a parecer um esparguete: um sopro e já morreu, contra o mais fraco dos inimigos. 

Este é um jogo que vai testar a vossa persistência, acima dos skills. Porque não se tratou apenas de construir um mundo repleto de inimigos difíceis e bosses “impossíveis”. Todo o design deste mundo foi feito para castigar o jogador. Exemplo disso começa com o sistema de evolução da personagem, igualmente inspirado nos soulslike: todos os inimigos mortos deixam sal, a essência da vida neste universo que serve para subir os níveis da personagem. Mas em vez de usarem os pilares espalhados pelo cenário, que funcionam como as bonfires para recuperar os elixires de saúde e fazer respawn aos inimigos, terão de regressar à base principal. 

Isto significa que além do respawn dos inimigos, quando regressam à área, voltam ao início e terão de percorrer tudo de novo. Ou seja, aquele nervosismo de acumular sal, funde-se com a tentação de continuar em frente para não ter de regressar ao início da exploração. E se o percurso até um boss permitir acumular o suficiente para subir um ou dois preciosos níveis de experiência, terão sempre esta balança, o pensamento que podem deitar tudo a perder que acumularam até então. 

Nesse sentido, os loops de repetição sucedem-se, vão passar horas neste ciclo e rodopio, a desenvolver a personagem que sobe de nível muito lentamente até começarem a ver resultados realmente interessantes, como dar um golpe para eliminar inimigos que anteriormente nos desfaziam. E esse progresso lento é que é o verdadeiro teste de perseverança colocado aos jogadores, o que pode significar uma experiência bastante repetitiva. É preciso ter olho para uma alavanca ou uma escada que pode ser estendida que abrem preciosos atalhos para facilitar o regresso ao local. Mas ainda assim, é demasiado time consuming. 

E o jogo não tem problemas em assumir-se como repetitivo e não linear. O jogador assume o papel de um inquisidor que tem de procurar mages, bosses que aparecem em determinados locais das regiões desbloqueadas. Estas caçadas, que terminam a devorar a sua alma, acabam por ser essenciais para abrir portas fechadas até que eliminem determinado número destes inimigos. 

E estes não estão inicialmente no mesmo local. Estes percorrem o cenário, lançam inimigos sobre nós até causar-lhes dano. Vão fugindo pelo cenário até chegar ao local do derradeiro encontro. E estes estão longe de serem fáceis, com mecânicas de ataque próprias, obrigando o jogador a estar preparado para os confrontos. Caso contrário, de regresso ao grind para melhorar a personagem. E esta é a estrutura do jogo. Sempre que encontram um novo local, desbloqueiam um sistema de runas que servem de código para usar no portal do acampamento. 

O problema do jogo é que as pistas por onde seguir são sempre muito vagas. O jogador é quase obrigado a explorar cada recanto dos mapas à procura de um local novo para avançar. E a fazer notas mentais de portas fechadas sem explicação de como abrir ou outras que requerem um número de bosses derrotados. Além do backtracking, a falta de direções na aldeia principal ou os diálogos vagos das personagens não ajudam a orientar. 

E como disse, noutras situações aplicam-se as regras dos metroidvanias: itens que são necessários encontrar para interagir com mecânicas no cenário. Por exemplo, um grappling hook que ajuda a pendurar em locais elevados; ou um mineral que permite ativar as roldanas de um sistema de cordas. Apenas pedia, neste caso em concreto, um mapa para nos orientarmos. Mas o jogo pende para o formato Souls e esse elemento está proibido no género… 

Para subir de nível e melhorar a personagem, terão de visitar um santuário na cidade. Cada nível requer a quantidade de sal, desbloqueando uma órbita para investirem numa gigantesca árvore de talentos, em vez dos diferentes atributos. Este sistema permite uma maior liberdade nas builds, enquanto investem pontos em força, saúde, stamina, etc. Podem colocar vários pontos no mesmo elemento, mas devem ter em conta o desbloqueio das diferentes classes de armas e armaduras. Só assim podem usar as mais poderosas e resistentes que vão encontrando no jogo. E ainda devem gerir o peso do equipamento e a respetiva capacidade da personagem. 

Há uma grande variedade de espadas, machados, lanças, arcos e até magias para utilizar no jogo. Tudo depende do estilo de jogo de cada um.  Assim, o sistema é simples de entender, mas altamente complexo no que diz respeito à estratégia para a construção da build que desejam. Também vão desbloqueando pontos de correção, ou seja, a possibilidade de os recuperar e investir noutros caso necessitem de fazer uma correção na build

Retirando a dificuldade extrema e a facilidade com que se vão perder neste mundo, no geral o jogo melhorou bastante face ao primeiro. A jogabilidade é excelente, mantendo-se simples, em combos construídos com um ataque leve e outro pesado. O sistema de defesa e rebolar necessitam ser dominados para evitarem dano. E nem falta a mecânica de Unkindled de Dark Souls, em que é necessário devorar itens específicos para recuperar a totalidade da energia. 

O jogo suporta multijogador, obrigando a ter a alma purificada para chamar ou entrar nas partidas. E como se esperaria, outros jogadores podem decidir atacar-nos, por isso é sempre uma lotaria entre a chamada de ajuda ou alguém que se vai divertir a prejudicar-nos. 

Feitas as contas, estamos perante um jogo muito desafiante, mas igualmente viciante. Quando a personagem começa a evoluir e a tornar-se uma forma destruidora contra inimigos que anteriormente nos eliminavam com um “sopro” é bastante gratificante. É como deixar de sofrer de bullying, para sermos nós o bully. Neste contexto, não tem nada de mal. Mas acreditem, vão sofrer muito mais que os inimigos…