Depois de vários meses de grande hype, Stray chegou às mãos dos jogadores e já é considerado um dos maiores sucessos da Annapurna Interactive, a editora que tem no seu catálogo diversos títulos indie de grande potencial narrativo, mas com premissas bastante originais, como Outer Worlds ou 12 Minutes. 

Obviamente que se o interesse em Stray estava centrado no seu protagonista improvável, um simples gato, penso que a grande curiosidade era a sua integração num mundo com um ambiente cyberpunk, mas distópico sem a presença de humanos. Os cenários repletos de néons, robots e outros elementos futuristas, mas degradados são ingredientes que aguçaram ainda mais o interesse do jogo produzido pelo estúdio independente BlueTwelve Studio. 

Aquilo que ficou por confirmar era a real qualidade do jogo em geral e se a narrativa conseguia ser interessante para nos agarrar até ao fim, mesmo considerando que esta seria uma experiência curta. O interessante é que o protagonista é realmente um gato, sem superpoderes, habilidades especiais ou capacidade de comunicar. E isso é o que torna esta aventura tão especial, a capacidade de se contar uma história de um gato que se comporta como um gato – este mia, ronrona, arranha, enfia-se pelos buracos, faz asneiras de partir objetos, saltita entre plataformas ou simplesmente enrola-se para dormir. 

Estas são ações fofinhas que à primeira vista assumem a captação da atenção dos amantes de felinos, e julgo que grande mediatismo do jogo foi exatamente virado para esse público. Mas depois percebemos que a maioria destas ações acabam por ser contextuais e com impacto na narrativa e gameplay: o gato arranha portas para que alguém as abra, mia para chamar a atenção de inimigos e claro, a sua agilidade permite explorar este mundo com bastante verticalidade. 

E por isso, sim, é o jogo de um gato sem nome, com a história mais simples do que se poderia imaginar: o felino perdeu-se da sua família e precisa de encontrar o caminho para casa. O gato acaba por cair numa cidade sem humanos, habitada por robots inteligentes, com uma personalidade muito interessante de se explorar. Todos eles têm algo a dizer e vão preenchendo os buracos daquilo que o jogador necessita saber sobre a história. 

Mas é claro, o gato não fala e tampouco compreende o que os robots dizem e é aqui que entra o pequeno drone B12, que se torna na chave-central de ligação do felino a este mundo. É através deste que passamos a compreender os robots, as mensagens das placas e a interação geral com este mundo futurista. 

Inicialmente o jogo parece um walking simulator, uma experiência linear, sem grandes interações, que serve para apresentar ao jogador não só as ações com o gato, mas como o próprio mundo. Até que o jogo se abre um pouco mais, apresentando-nos pelo menos duas áreas centrais da cidade que requerem mais exploração, com diversas personagens para interagir, receber simples missões secundárias e outros elementos curiosos. 

Apesar do nosso companheiro ser inteligente, B12 sofre de amnésia. Durante a história vai recuperando a noção da sua existência, sendo um dos pontos interessantes a explorar pelo jogador. A recuperação dos fragmentos de memória está também ligado aos colecionáveis a procurar durante os capítulos da aventura. No total, bastam umas 5 ou 6 horas para completar a aventura, um pouco mais para completar tudo. E apesar de curto, como já se esperaria que fosse, é uma viagem que vale bastante a pena. 

Um dos aspetos interessantes é a jogabilidade. Sabemos que o gato se comporta como um gato, mas isso não o impede de interagir com os elementos do cenário, com a ajuda do pequeno robot que o sobrevoa. A ideia é encontrar os caminhos para os objetivos, muitos deles temos apenas pistas. Encontrar códigos para destrancar computadores ou cofres, e claro, aceder a objetos que podem ser entregues aos robots. Mesmo as missões secundárias giram em torno destes elementos, como um músico que precisa de pautas das melodias que podem ser encontradas na cidade.

O jogo não é desafiante, no geral, mas ainda assim tem alguns elementos frenéticos. Uns pequenos insetos atacam as criaturas orgânicas e mesmo sintéticas, obrigando o gato a usar a sua agilidade para os evitar. Mais à frente descobre-se uma arma que os elimina, mas com utilização limitada, que se torna parte dos puzzles para resolver. 

O que é igualmente interessante neste mundo, é que as máquinas não estão habituadas a criaturas orgânicas. E o gato acaba por se tornar uma espécie de messias ao ajudá-los, muitas vezes a fazer coisas tão básicas como passar por pequenos locais estreitos, que os mesmos não conseguem fazer, para executar algo.  

A componente audiovisual é um dos aspetos mais importantes desta experiência. Os cenários futuristas, mas decadentes, praticamente pós-apocalípticos é um contraste que continua a funcionar, um misto de abandono da cidade, mas com os locais mantidos a funcionar pelos robots, o que convida a explorar. E depois toda a tensão das músicas, leva-nos a registar como provavelmente uma das melhores bandas-sonoras do ano. Esta foi certamente inspirada em Vangelis para Blade Runner, por isso, não só visualmente lembra o filme clássico, como também na componente sonora. 

Stray é um grande jogo, que se manteve dentro das expectativas. Ainda assim não deixamos de sentir que poderia ser um pouco maior se o estúdio introduzisse mais algumas mecânicas diferenciadoras e puzzles relacionados. E como não tem elementos que justifiquem repetir a experiência, sendo fácil e rápido de platinar, é muito bom enquanto dura, mas rapidamente o vão arrumar. Com um ano atípico no que diz respeito ao lançamento de jogos e com realce dos títulos indie, não é muito difícil de colocar esta aventura na lista dos melhores de 2022. Joguem, sobretudo se tiverem uma subscrição Plus, pois será gratuito na PS5, e vão ter uma experiência imersiva e divertida enquanto dura.