Sou um grande apreciador de vinho, apesar de contribuir apenas de forma marginal para o nosso lugar cimeiro na lista de maior consumo de vinho per capita do mundo. Talvez pelo facto do vinho estar tão embebido (trocadilho não-intencional) na cultura portuguesa é que a minha curiosidade pelo aclamado Viticulture me levou a analisá-lo há cerca de um ano. Já com 3 expansões no mosto, debruçamo-nos hoje em Viticulture World, que transforma um dos mais celebrados worker placement games dos últimos anos numa experiência competitiva.
Viticulture é um excelente jogo, e a Essential Edition que analisámos por diversas vezes voltou à mesa. Sempre – para quem me conhece – acompanhado com um copo de vinho celebratório, mas sempre distante da mesa de jogo. No entanto, após diversas partidas deste excelente jogo da Stonemaier Games, é fácil termos a sensação de que cada partida termina cedo demais. Quando o motor de geração de recursos do jogo começou a carburar, a partida termina, com a sensação que queríamos experimentar a eficácia do mecanismo que criámos ao longo de vários turnos.
Viticulture World é cooperativo, e por essa razão assume-se como uma forma de combater essa sensação que tivemos diversas vezes. É claro que podemos dizer que a ideia de que o jogo terminou cedo demais só pode atestar à sua qualidade e à capacidade que tem de nos manter agarrados e investidos.
Tenho visitado as memórias e conhecimento em torno de worker placement games e acredito que este é o primeiro do género que jogo, ainda que saiba de existência de mais uns quantos. É um grande desafio o de conseguir tornar num acto de cooperação um género que se move em torno da ideia de gerir um limitado número de acções e limitar por sua vez o acesso dos adversários a determinada acção.
Depois de jogadas algumas partidas de Viticulture World, é fácil reconhecer que a forma equilibrada como os seus autores incorporaram elementos cooperativos num género tradicionalmente competitivo foi eficaz. Talvez a isso se deva a inclusão de sete continentes assimétricos que escolhemos no início de cada partida e que servem de módulos ao próprio jogo. Cada continente tem regras e componentes próprios, e alguns elementos que vão sendo revelados à medida que a playthrough avança, ao estilo campanha, como se cada um destes baralhos/continente representassem capítulos de uma aventura… vinícola.
A grande maioria destes módulos apresentam um desafio bastante elevado, e percebe-se que são um dos elementos que demonstram que esta expansão está destinada a veteranos do jogo base, que necessitam de um grau de dificuldade superior, e que conhecem todos os cantos mecânicos desta vinha lúdica.
Apesar de ser um worker placement, e de termos de nos coordenar com os restantes jogadores, a forma de vencer (exceptuando quando os módulos assim o indicam) passa por conseguir que todos à mesa atinjam 25 pontos individualmente, e que o colectivo coniga chegar ao fim da barra de influência. É claro que poderá ser frustrante se apenas um dos jogadores não atingir essa meta e impedir os restantes de alcançarem a vitória, mas parte do sucesso de Viticulture World passa por esse equilíbrio entre a nossa destreza individual e a nossa capacidade de articulação mecânica com os outros.
Existe uma dimensão individual em cada jogada, ao mesmo tempo que cooperamos pelo objectivo colectivo. Se no original temos de gerir os nossos trabalhadores (aqui representados por meeples, como seria de esperar), tendo de escolher se eles vão estar a trabalhar no Verão ou Inverno, em Viticulture World o jogo resolve isso por nós: recebemos logo todos os trabalhadores, mas eles têm chapéus que os distinguem. Os dois de chapéu amarelo só trabalham no Verão, e os de chapéu azul só trabalham no Inverno, juntando-se ao trabalhador maior que pode laborar em qualquer estação. No entanto, podemos treinar trabalhadores no Inverno para que eles “percam o chapéu” e possam estar disponíveis ao longo do ano, sem restrições de estação.
Cada módulo de jogo permite-nos também fazer upgrades aos postos de trabalho e edifícios no nosso tabuleiro, conduzindo a alterações estratégicas que dependem muito da situação.
Cada partida torna-se um pouco mais longa que o jogo base, e talvez seja a forma de sentirmos que o engine building que temos de base não é abruptamente interrompido pelo fim do jogo, como muitas vezes acontece no Viticulture original.
Depois de ter adquirido e jogado tantas expansões para tantos jogos, há algo de verdadeiramente interessante quando encontro um jogo de tabuleiro cujo conteúdo adicional funciona quase como uma mudança de paradigma do que o jogo oferece. Neste caso, Viticulture World consegue mecanicamente resolver um problema que eu sempre achei que seria difícil de ultrapassar: transformar o desafio competitivo do excelente Viticulture num esforço cooperativo, onde a barra de dificuldade de todo o jogo de move acima do que o jogo original nos habituou. Tranformando esta expansão num lançamento obrigatório para detentores de Viticulture que querem encontrar um desafio superior ao que têm tido com o título base.