Durante os últimos dois ou três anos assisti a um aumento enorme da qualidade da pixel art em jogos indie. Embora me pareça que a tendência para fazer jogos nesse estilo tenha estabilizado, talvez pela diminuição da novidade, ainda são a larga maioria na categoria indie, o que não significa que não encontremos jogos lindíssimos fora dessa categoria. Frontier Hunter: Erza’s Wheel of Fortune é um excelente exemplo disso mesmo, mas é muito mais do que apenas isso.
Erza volta a ser a personagem principal deste jogo da IceSitruuna Studios. Depois de conseguir a licença de caçador no primeiro jogo da franquia, Erza é agora uma figura bem estabelecida no exército imperial. Neste jogo finalmente são inventadas as naves voadoras que permitem as viagens entre continentes mas, mais importante do que isso, permitem que seja ultrapassada uma barreira criada por uma tempestade e se explore uma parte do mundo completamente desconhecida para todos.
Frontier Hunter: Erza’s Wheel of Fortune é um metroidvania, roguelite, e é exactamente na história que peca um bocado, pois em nenhum momento as personagens parecem muito surpreendidas com todos as novas criaturas e monstros que vão e falam disso com a mesma ligeireza com que o nosso Presidente Marcelo fala da pedofilia na Igreja. Felizmente a história não se resume apenas a este arco principal, existindo muito mais arcos para seguir como os relacionamentos entre Erza e as personagens que vamos desbloqueando e vão integrando o nosso grupo ou, de forma mais engraçada, o relacionamento de Erza (e posteriormente as restantes personagens) com Diablo, uma entidade mitológica que habita um gancho para cabelo de Erza e consegue comunicar através dos pensamentos.
Já aflorei este tema, mas o jogo é lindíssimo, e isso é uma bênção, mas também uma forma de perceber que o jogo tenta competir numa categoria para a qual não está ainda preparado, já que o esforço feito para mostrar todos os detalhes, todos os planos, para criar personagens diversas, distintas e únicas, também permitem que sejam detectadas as falhas com maior facilidade. Há que perceber que baseio esta análise numa versão do jogo anterior ao lançamento e que muitíssimos bugs e glitches já foram corrigidos nas múltiplas actualizações que o jogo sofreu nestes dias, mas ainda há alguns, os mais irritantes podem significar mesmo perda de progresso, especialmente após o jogo se tornar mais complexo nas mecânicas, e isso aliado à componente gráfica tornou relativamente comum eu avançar através de mecânicas que creio que não foram pensadas para ser usadas, apenas aconteciam porque o cenário ser tão intrincado permitia que os nosso bonecos acedessem a pequenos espaços aos quais me parecem não poderiam ser acessíveis e, por sua vez, permitiam o desbloquear de partes do cenário que não deveríamos aceder nessa fase.
Descobrir estes pequenos glitches passou a ser um foco da minha atenção, e com isso é que acabei por perder algum progresso, já que a algumas zonas que acedia já não conseguia sair. Isso também me permitiu descobrir outros detalhes importantes, por exemplo, pensava que todos os personagens tivessem um frame igual, mas não, o seu tamanho é diferente. A diferença é mínima, mas existe. Na prática não se nota, mas era importante para aceder ou sair desses espacinhos que falei antes.
A música está perfeitamente adaptada a cada situação e o mesmo posso dizer sobre os efeitos sonoros, já o voice acting está um pouco abaixo do que já esto habituado a encontrar nestes jogos, mas nada que estrague o ambiente, até porque há momentos muitíssimo bem conseguidos, especialmente pela representação do Diablo. Como já se espera nestes jogos, quer a representação de alguns estereótipos, quer a representação das interacções de cariz amoroso são muito engraçadas e acabam por consolidar e dar muita cor a toda a história.
Quanto ao jogo jogado, está muitíssimo bem executado. Cada personagem pode ter duas armas e tem acesso a imensos golpes e truques que pode encontrar ao longo da exploração, aliás, a exploração é o foco principal de todo o jogo e, porque não dizê-lo, a parte mais entusiasmante. Nunca deixei de ter a curiosidade de saber o que estaria numa nova sala, já que o mapa está muito bem desenhado, permitindo ter uma visão perfeita do que já sabemos e do que está por saber, e também porque a recompensa por explorarmos é equilibrada, dado que frequentemente sentimos que vale a pena investir e espiolhar todas as salas, já que sabemos que podemos encontrar algo valioso.
Embora a miríade de golpes e estilos de luta entre os diferentes personagens seja extremamente satisfatória, permitindo estilos tão distintos como jogar à xoninhas, de longe, ou estar constantemente na cara dos monstros a tentar eliminá-los com combinações consecutivas de golpes e quebras, notei que há algumas falhas no reconhecimento dos inputs por parte do jogo e, embora isso não seja grave, é um mini aborrecimento, já que acontece com alguma regularidade, e não apenas nas lutas, também nos saltos ou no reconhecimento que estamos a tentar agarrar uma saliência.
Sem nos forçar a nada, o jogo mostra-nos que a correcta combinação do uso das personagens facilita imenso a progressão, especialmente para derrotar os bosses, mas não nos obriga literalmente a fazê-lo, da mesma forma que não nos obriga a sermos imaculados na selecção dos golpes para derrotar os inimigos, mesmo quando nos mostra que, se investirmos tempo a perceber como, cada inimigo tem uma maneira óptima de ser combatido, ou seja, recompensa quem tenta jogar bem, mas não exclui o jogador mediano, onde me incluo, de poder aproveitar tudo o que de bom o jogo tem.
Outra mecânica que não funciona especialmente bem é a de podermos chamar um dos elementos do nosso grupo para ajudar, criando momentos de 2 para 1, se é que posso dizer isso. Por norma a IA não é nada boa nestes momentos, já que a nossa ajuda frequentemente não parece perceber que não foi chamada para tomar um café e fica ali especada a olhar enquanto eu levo na boca.
Frontier Hunter: Erza’s Wheel of Fortune está muitíssimo bem desenhado. Alia gráficos lindíssimos, a música lindíssima, uma história que vale a pena seguir, nem que pelos arcos secundários, uma progressão fluída e satisfatória e um combate bem executado que recompensa o melhor jogador e não exclui o mediano. É uma recomendação fácil para quem o quiser experimentar.