Fazer jogos com materiais reais é algo que deve ser fascinante, apesar das dificuldades existentes em replicar todas as suas características físicas. Na obra de Tomasz Ostafin, Papetura, tal com é fácil adivinhar pelo nome, o papel é o material que está a ser recriado, indo muito mais longe do que um simples Paper Mario. Aqui vemos personagens e todo um mundo feito em papel, em construções complexas com muitas dobragens e colagens com um resultado que me deixou boquiaberto. Aqui está o talento de um artista que não é propriamente versado em game design tradicional, mas que tem um profundo conhecimento a dobrar papel, uma arte conhecida como Origami. Não fiz uma comparação de Papetura com Paper Mario por mero acaso, são quase pólos opostos em filosofia de design, enquanto um dá primazia ao design visual, o outro prefere manter-se fiel às componentes mecânicas que o tornam num bom jogo.

Papetura é como uma peça de fruta bonita e reluzente, que se compra num hipermercado qualquer, que na altura de comer vemos como é ácida e com pouco sumo, mesmo depois de ser bem espremida. O mundo construído em papel, com peças muito intrincadas (que podiam estar muito bem numa exposição de Origami), cheias de pequenos detalhes, conquistou-me de imediato, nomeadamente as habitações onde vivem algumas personagens estranhas. Contudo, fiquei bastante curioso (estava ligeiramente apreensivo na verdade) em saber como é que Papetura ia estar na lógica de um videojogo, ou seja, como é que iria interagir num mundo de papel com a personagem principal. Este obra cai na infelicidade de ser simultaneamente curto e insípido nas mecânicas que entrega, é como beber água sem estar com sede. O nosso cérebro é levemente estimulado para resolver alguns puzzles, dado que a complexidade e criatividade não ser algo que os caracteriza.

Papetura tem uma apresentação impressionante, onde é utilizado vários tipos de papel e de dobragens.

Na prática, Papetura adotou a ideologia dos jogos de apontar e clicar, que são também conhecidos por aventuras gráficas, sem incluir nenhuma profundidade mecânica para além de um ou outro quebra-cabeça mais complicado. Normalmente, neste pequeno jogo, os puzzles precisam da atividade dos nossos neurónios (mas nada em abundância, não será preciso pensar mais do que um minuto para saberem o que têm de fazer) e da nossa habilidade em lançar projéteis. Em Papetura não há nada escrito nem falado, toda a linguagem utilizada para comunicar com o jogador é meramente visual. Quando as personagens falam e emitem som para o fazer estão a usar uma linguagem imperceptível como, por exemplo, os sims (as personagens da bem conhecida série da EA). Portanto, quando interagimos com uma qualquer personagem aparece uma balão de fala, como nas bandas desenhadas, com um desenho daquilo que quer ser transmitido para o jogador. É uma opção que encaixa bem na estética do jogo, mas o problema é que, às vezes, na resolução de puzzles, dão-nos quase a resposta escancarada e, assim, a recompensa de chegar à conclusão fica sem efeito.

Assim, com Pape (sei o nome da personagem por ter passado pela página da loja da Valve) liguei e apaguei luzes, empurrei objetos e disparei alguns itens esféricos. Não houve grande dificuldade em identificar os diferentes quebras-cabeças e em encontrar a sua correspondente solução, o único pequeno constrangimento que existe é de executar a ação necessária para resolver o puzzle. O problema ao qual me refiro é o seguinte: pontualmente, temos de ser hábeis no disparo de projéteis para que, por exemplo, atinjam os alvos que queremos atingir. Todos os jogos, seja ele qual for o género, têm de encontrar um bom equilíbrio entre a dificuldade e o desafio. Não queremos demorar muito a chegar ao resultado para obtermos frustração deste processo, mas também não queremos que a dificuldade seja demasiado baixa ou nula, senão vamos sentir que quem criou o jogo trata a sua audiência como pessoas sem capacidade mínima de raciocinar – infelizmente, é isto que acontece em Papetura.

Como se pode ver, o jogo tem uma iluminação impressionante que encaixa bem com as características do papel.

O ideal para qualquer point ’n click é almejarem ser um Monkey Island. Porém, para atingir este estatuto não basta trabalhar bem as mecânicas, é necessário que haja uma boa narrativa que interliga tudo. Papetura tem um aspeto visual bastante agradável, nomeadamente para quem aprecia dobragens de papel e tudo o que se pode construir deste material tão maleável e versátil; aqui até se notam as texturas de papel próprio para escrever, assim como de papel mais macio como o dos guardanapos ou papel absorvente. Tem, porém, a falta gritante de uma narrativa propriamente dita e bem estruturada, um conto infantil com uma moral encaixaria muito bem neste grafismo, algo que quebre o silêncio que faz ao longo dos sessenta minutos que entrega.

Não tenho qualquer aversão a jogos curtos (um dos meus favoritos; Thirty Flights of Loving, dura cerca de quinze minutos), mas Papetura não nos diz absolutamente nada do início ao fim do jogo, não nos faz sentir qualquer emoção pelas suas personagens, porém é bom para nos manter curiosos quanto ao mundo que ainda temos por descobrir. De que serve o prazer da descoberta se não nos leva a nada? Até um puzzle de um qualquer Picross é mais agradável do que chegar ao encerramento ambíguo de Papetura. Em termos mecânicos, o jogo precisava de uma ligeira afinação, está quase num bom ponto em que não nos deixa frustrados e que cada vitória nossa mereça uma celebração. É com comer um Bolo Rei e o sabor que nos fica nas papilas gustativas é a amargura de uma casca de laranja que se comeu por engano. Se gostam da presença de papel num jogo, optem, preferencialmente, por algo mais substancial e tradicional como Paper Mario. Papetura de mais tempo de desenvolvimento para apurar o que há nas mecânicas e criar o que não há na narrativa. Infelizmente, Papetura é mais um jogo independente que qualquer um vê o seu valor, mas que não atinge o potencial que exibe.