Antes de mais, um abraço sentido a todos os que reconheceram a referência no título deste artigo, que sejam bafejados pelo vento do Norte e que sigam para o Sul. Deixando também um aviso que as referências marítimas podem não ter ficado por aqui, mas também, o que esperamos de alguém que vive em Portugal?

Já sem medo de soar repetitivo, os criadores indie têm mesmo a capacidade de pegar em elementos aparentemente sem possibilidade para se misturar, misturá-los, e criar algo interessante. Como se os mais talentosos dos criadores independentes tivessem a capacidade alquímica de pegar em azeite e vinagre e misturá-los em algo novo, um vineite ou um azagre, que surpreenda todos pela sua capacidade de temperar uma salada.

Ship of Fools é um roguelite marítimo cooperativo, onde temos de sobreviver, atacar e manter o barco intacto perante todas as ameaças que enfrentamos.

Admito que a grande maioria das horas que dediquei a Ship of Fools (e foram muitas) não me permitiram degustar o jogo em toda a sua plenitude. O modo cooperativo e a forma como os criadores pensaram o desafio e as mecânicas necessárias para chegar o mais longe possível na nossa viagem marítima não são aproveitadas ao máximo se olharmos para Ship of Fools como apenas mais um jogo single player.

Cada viagem e cada segmento de escolha do rumo que vamos tomar é escolhido num mapa náutico com hexágonos. É aqui que as nossas escolhas ao estilo de jogo de tabuleiro vão despoletar eventos e encontros contra grupos de inimigos e bosses. Existe alguma informação iconográfica proceduralmente gerada no mapa que nos permite direccionar as nossas escolhas, evento após evento, mas a nossa travessia é feita sobretudo pela exploração do desconhecido. Será que este hexágono para o qual nos dirigimos vai permitir-nos visitar uma ilha abandonada com um tesouro? Ou com um novo membro para a tripulação em formato de personagem jogável desbloqueável, com habilidades passivas únicas? Ou será mais um combate com diversos inimigos de dificuldade variável? São estas incógnitas que tornam interessantes cada nova playthrough de Ship of Fools.

O loop de combate – aquele onde passaremos grande parte do nosso tempo – leva-nos a estar limitados espacialmente ao convés do nosso barco. Temos aberturas para canhões a bombordo e a estibordo e parte do desafio cooperativo de Ship of Fools passa por gerir a posição do nosso equipamento. Visto que a nossa embarcação se encontra a meio do ecrã, o surgimento de adversários acontece um pouco por toda a parte no mar que nos rodeia. O que nos irá obrigar a pegar nos canhões, municiá-los, e apontá-los aos inimigos, ora estejam eles a bombordo ou estibordo.

Em termos de canhões existem dois tipos: os automáticos e os manuais. Os primeiros disparam automaticamente, mas ainda requerem algum nível de manutenção, já que temos de manualmente recarregar as suas munições. Os segundos, totalmente manuais, têm de ser municiados, apontados e disparados por nós. Qualquer destes casos permite que os canhões sejam recolocados onde melhor nos convier.

A manutenção do barco não fica por aqui: dados os danos que os inimigos possam infligir ao nosso casco, temos também de utilizar a madeira disponível – um dos recursos mais importantes do jogo – para remendar o navio antes que os danos sejam tantos que naufraguemos.

A grande maioria da madeira que encontramos é obtida após a pescarmos com uns arpões, também eles finitos. Aliás, a gestão dos parcos recursos obtidos em cada viagem são um dos elementos principais deste jogo. 

Em alguns cofres de eventos encontramos também itens que podemos equipar na nossa embarcação para nos facilitar a tarefa de sobreviver aos perigos do mar. Upgrades que podemos colocar no navio e que alteram o tipo de ataque, a resistência do barco, ou o ritmo de ataque, entre muitas habilidades disponíveis. No entanto, o espaço para equipar canhões e add-ons no navio é muito limitado, e na nossa gestão deste equipamento podemos deitar borda fora os nossos canhões e upgrades, propositadamente ou não.

No final de cada run – como um bom roguelite – mantemos as moedas colectadas para comprarmos upgrades permanentes ao nosso barco, já que tudo aquilo que encontramos em cada viagem é perdido com o naufrágio do nosso navio. 

Ship of Fools é extremamente original e criativo na forma como mistura uma aventura roguelite com a necessidade de cooperação, num jogo divertido que apesar de nos permitir jogar a solo, brilha na sua totalidade na companhia de outro membro da tripulação.