Forspoken é o primeiro título do estúdio interno da Square Enix, Luminous Productions, em exclusivo para PS5 e PC, apontado como um jogo de nova geração. O estúdio é composto por grande parte dos elementos da equipa que trabalhou em Final Fantasy XV, estreando o motor proprietário Luminous, herdando dessa forma o mesmo nome. Forspoken utiliza essa mesma tecnologia, atualizada para o hardware atual, e desde logo foi listado como um dos mais exigentes em hardware para PC e a mostrar os efeitos de ray tracing na PS5.
Mas infelizmente, o estúdio não conseguiu entregar uma experiência realmente emocionante, falhando em diversos aspetos. Para começar, o mundo aberto criado para este palco de jogo é pobre, com atividades repetitivas e normalmente pouco apelativas. E está longe de oferecer o potencial gráfico de jogos que brilharam no ano passado como Elden Ring, Horizon: Forbidden West ou God of War: Ragnarok. Há momentos que roça a qualidade do que víamos numa PlayStation 3.
E os modelos das faces das personagens, animações e autenticidade ficam muito aquém daquilo que estamos habituados a ver em, por exemplo, Final Fantasy. Os diálogos e a maioria das cut scenes estão ao nível de um MMO, sem qualquer ambiente cinematográfico, algo que os principais jogos da Square Enix cumprem com grande perfeição.
Algo correu mal nesta produção que tinha muito potencial, mas saiu antes de estar polido para as exigências atuais. Mas outros problemas alastram-se a pilares mais profundos deste título: A escrita é pobre, os diálogos roçam muitas vezes o ridículo e existe uma grande inconsistência narrativa. Já para não falar na falta de química entre a protagonista e as outras personagens, tudo é debitado sem sal.
A narrativa de Forspoken agarra-se ao conhecido cliché de uma jovem, chamada Frey Holland, que foi transportada do seu bairro em Hell’s Kitchen, em Nova Iorque, para um mundo de fantasia chamado Athia. Isso foi possível graças a uma pulseira mágica que lhe confere poderes místicos, sendo ao mesmo tempo sentiente, com o nome Cuff. O jogo procura explorar a química entre Frey e Cuff, mas mais uma vez faltou ao estúdio capacidade narrativa para criar momentos e diálogos que fossem bem escritos e divertidos. Por outro lado, há um grande exagero no jargão, colocando a jovem rebelde citadina, a debitar fucks e asneirada, num mundo que muito provavelmente não entende o termo.
Outro aspeto negativo é que o jogo retira constantemente o controlo das mãos do jogador, com pausas desnecessárias, quebrando a fluidez do jogo. Diálogos com a própria pulseira que poderiam ser feitos enquanto caminha obriga a parar. Mas muitas sequências in game ficamos segundos a olhar para a personagem sem poder mexê-la na transição dos diálogos com o gameplay.
E ainda sobre a inconsistência dos diálogos e narrativa, num momento vemos a personagem a sentir-se mal por ter tirado a vida a uma pessoa, que era um boss, para dizer logo a seguir que se sentia muito bem por lhe ter dado uma coça. Ou quando chegamos a aldeia e vemos todos os habitantes a sofrer, a diminuir a nossa vitória porque ainda há muito para fazer, para logo a seguir haver uma grande festa a celebrar a mesma. Há comida e bebida à farta, mas na rua, há a população a morrer de fome.
Felizmente o estúdio acertou no combate e é o aspeto que salva o jogo da mediocridade. É realmente divertido utilizar os vários poderes de Frey concedidos pela pulseira, que podem ser melhorados e aumentados com pontos acumulados ao longo da experiência. A personagem absorve as rochas e terra do cenário e arremessa-os aos inimigos como arma primária. Mas depois pode ativar diversas habilidades, desde uma planta que funciona como arma estacionária, um tentáculo que causa dano a diversos inimigos e cura a personagem; há escudos e paralisias aos inimigos, entre outros.
Em certa parte da aventura vai desbloquear outras habilidades relacionadas com os elementos básicos. Depois da terra, desbloqueia o fogo que ronda em torno de uma espada mística e aqui pode-se explorar os combates de proximidade e alternar com a distância, um ponto que já havia sido demonstrado na demo publicada um tempo antes. Depois seguem os poderes baseados em água e mais uma vez abre mais uma árvore de talentos associados. E é divertido e fácil alternar entre todos eles, numa interface intuitiva. Certos inimigos são mais resistentes a um tipo de ataques, cabendo ao jogador descobrir as melhores combinações.
Além dos diversos ataques e combos, a personagem ganhou igualmente uma grande agilidade, aquilo que o estúdio lhe chama de parkour mágico. Nos combates é utilizado para se esquivar rapidamente dos ataques dos inimigos, criando escudos de emergência quando sofre dano, numa experiência muito divertida. Quando não está em combate, Frey utiliza os seus poderes para se deslocar rapidamente pelo cenário e trepar cenários verticais. Mais uma vez, cada elemento do poder garante também uma forma de locomoção. Com o fogo pode criar chicotes para balançar entre plataformas e com a água é possível deslizar rapidamente numa prancha de gelo.
Ainda no que diz respeito aos elementos RPG do jogo, a personagem pode equipar diferentes túnicas e colares, que podem ser melhorados com perks específicos. E os jogadores podem optar por diferentes builds, utilizando também pinturas mágicas para as unhas, que conferem buffs e debuffs mediante a forma como se deseja jogar. É um sistema de RPG muito light, simples de gerir, mas eficaz na ação.
O mundo de Athia é, no geral, pobre, sobretudo desinspirado em zonas como as áreas vulcânicas, onde os gráficos parecem ter saído de uma PlayStation 3. E as cidades, quando comparado com Final Fantasy XV (um jogo que utiliza a mesma tecnologia) deixam também muito a desejar. Os habitantes parecem estáticos e a cidade sem vida. Existem alguns cenários naturais mais verdejantes, que são mais vivos e bonitos, mas não chegam para equilibrar o todo. Mas não se tente olhar para o céu: é um enorme cartão azul com nuvens rabiscadas. Compare-se com jogos como The Witcher 3 que tem muitos anos em cima para se sentir a diferença.
É um jogo com contrastes visuais acentuados e talvez a pergunta que se faz é: como é que este jogo devora os recursos das máquinas? Tirando o ray tracing e HDR que são os efeitos que puxam pelo hardware, o jogo oferece um sistema de partículas impressionante. Os efeitos das magias da personagem, a terra que é sugada para se transformar em rochas de arremesso ou o fogo gerado pelas habilidades são muito bons. E o sistema de iluminação também me parece detalhado. Mas isso é apenas um enfeite, em cima de algo pobre, que não justifica.
Tal como muitos jogos de mundo aberto, existem dezenas de colecionáveis para encontrar, entre arcas, documentos e outros itens. Há diversas atividades, mas pecam pela repetição constante: corridas ou eliminação de inimigos em contra-relógio, pequenas dungeons com boss final; encontrar torres que assinalam mais atividades no mapa; cabanas de repouso que servem como fast travel; estátuas que aumentam os poderes da personagem; além de diversos locais onde é necessário eliminar o inimigo para aceder a uma nova peça de equipamento para a nossa personagem. Há ainda monstros mutantes para enfrentar, normalmente mais difíceis de derrotar.
Existem algumas quests secundárias dadas pelos habitantes, as chamadas Detours. Estas podem passar por encontrar itens, matar inimigos ou simplesmente captar fotografias em certas paisagens assinaladas. Há um mini-jogo de dança que foi mais básico que alguma vez vi num jogo, premindo 3 ou 4 vezes num botão. Pareceu ser mais uma sequência interativa do que propriamente um desafio.
Forspoken é a primeira grande desilusão do ano. Um título que até tinha potencial, com um sistema de combate divertido, mal empregado numa aventura de mundo aberto pobre em atividades, narrativa pouco interessante e inconsistente, assim como um rol de problemas técnicos e de design que não podem estar num jogo de nova geração.