Para quem cresceu com jogos de 8 bits, consegue identificar directamente de onde vem a inspiração para os precision platformers criados por uma série de criadores indie que decerto cresceram entre a admiração e o trauma que incontáveis vidas virtuais perdidas lhes causaram.
Não sendo novidade a existência destes jogos de plataforma duros de roer, é curioso como o surgimento de Super Meat Boy (abrindo a porta para Celeste, N++ entre tantos outros) acontece numa fase em que os jogos de plataformas quase exclusivamente se circunscreviam a títulos tridimensionais pejados de acção.
Triple Take insere-se nesse segmento de jogos de plataformas que exigem uma precisão hiper-controlada, imprópria para ansiosos. Onde cada movimento é cuidado, elevando a nossa utilização de motricidade fina para um patamar de exigência elevado.
Mas o que este jogo do estúdio FlyAway se promete a fazer está mesmo ali no nome, sem enganar. Uma abordagem tripla, se aceitarmos a tradução livre. É que no meio deste jogo de 2 bits que para muitos pode parecer, à primeira vista, apenas mais um jogo retro com gráficos minimalistas e monocromáticos se esconde uma ideia interessante que o torna verdadeiramente único.
Triple Take possui 50 níveis, mas na realidade é mais certo afirmar que são 150 (sim, como os Pokémon, mas não é essa a razão). É que nos é pedido em cada um desses 50 níveis que o joguemos por 3 vezes seguidas. Mas não de forma igual.
Em cada uma das três vezes que completamos um nível há muito que se altera. Blocos que são removidos obrigando-nos a perseguir novos caminhos, plataformas que desaparecem e que dificultam os saltos, ou armadilhas, paredes e perigos que são adicionados. É neste misto de sentimento de familiaridade com o layout de cada nível e a criatividade nas mudanças que ocorrem em cada uma das suas 3 iterações que reside o interesse que nos mantém agarrados horas a fio a Triple Take, até vermos o fio à meada.
Peguemos nesta criatividade mecânica e adicionemos um mistério que vai correndo por trás da história. Especialmente os momentos estranhos em que o jogo minimiza o executável e começa a “conversar” connosco através de pequenas janelas do próprio Windows. Uma ideia deliciosa que vai adensando a narrativa meta que o jogo nos vai criando, como se ele próprio tivesse noção do que é e de que o estamos a jogar.
Acredito que o preconceito que jogos em 2 bits possam gerar impeçam a maioria dos jogadores de mergulharem em Triple Take, desconhecendo que aqui reside um dos mais originais e desafiantes precision platformers que foram lançados nos últimos tempos. Se nada disto vos convenceu resta-me aconselhar-vos a ouvir a banda-sonora original de Tobias Roberts para este jogo, e se ainda assim não foi suficiente, penso já ter gasto as minhas três tentativas.