Nos últimos anos é-me impossível cruzar-me com um qualquer vilão bilionário com um ego desmesurado e uma necessidade de sobre-compensação genital inflada, sem me lembrar do herói de muitos pela internet, Elon Musk. Somem às avultadas somas de dinheiro que o sul-africano possui uma adoração de milhares (ou milhões) de zelotas em todo o mundo e facilmente o veremos a tornar-se uma espécie de Lex Luthor do mundo real que investiu dinheiro em tratamentos capilares.

IXION, o novo jogo dos Bulwark Studios, traz-nos um Elon Musk virtual mas assustadoramente real, Vanir Dolos, CEO e fundador da empresa com o mesmo nome que prometeu à Humanidade o acesso a viagens estelares com o desenvolvimento da sua tecnologia dos Motores Vohle. Mas – e perdoem-me o semi-spoiler que até está presente no trailer inicial – quando activamos esse mesmo motor na nossa estação espacial Tiqqun em órbita na Lua o resultado é catastrófico. A Lua é destruída com o impacto, o que leva à evaporação dos oceanos e consequente extinção da vida na Terra. A empresa para o qual trabalhamos enquanto administradores, a DOLOS, é então declarada inimiga da Humanidade pelas Nações Unidas.

Cabe-nos, enquanto Administradores da Tiqqun, a missão de garantir a sobrevivência da tripulação da estação espacial, e, tanto quanto sabemos, da Humanidade. À excepção de algumas centenas de cápsulas criogénicas que vamos recuperando pela galáxia, e cujos integrantes farão parte da nossa tripulação, depois do regresso de Tiqqun à Via Láctea, um número de anos após o acidente lunar, todas as informações que sabemos é de que a vida na Terra terminou, para sempre. Temos de criar as condições ideais para procurarmos outros planeta habitável, visto que os saltos espaciais dados com o motor Vohle causaram danos estruturais irreparáveis ao casco da estação, obrigando-nos a estar constantemente a repará-lo.

IXION é jogado em três camadas. A primeira, no interior de Tiqqun, é um city-builder mais ou menos tradicional. Temos de gerir a população, as suas necessidades e os recursos que obtemos. O espaço limitado em cada um dos 6 sectores circulares são um problema grande, especialmente por mecanicamente IXION herdou de Settlers a necessidade de ter os edifícios todos conectados por estradas entre si.

Visto que a produção energética é limitada, um outro nível de preocupação que temos de ter reside na gestão da energia consumida a cada segundo. Podemos (e devemos) aumentar a nossa capacidade energética através da instalação de painéis solares no exterior, mas dado o quão escassos são os recursos electrónicos que temos para os construir, durante muito tempo teremos inclusivamente de ir ligando e desligando edifícios para que tenhamos potência para manter os sistemas de produção intactos.

Uma adição mecânica implementada em IXION e que demorei bastante até dominar por completo reside na sectarização da própria estação. Começamos com o sector 1 desbloqueado, e é aí que começamos a construir no início da nossa viagem, mas cedo nos é pedido que desbloqueamos o sector à nossa esquerda, o sexto de seis sectores conectados entre si ao longo da estação circular. A grande dificuldade que reside nesta sectarização – e que nos leva a encararmos os diversos sectores como colónias independentes – é que os recursos e a população não são partilhados. Uma das minhas tentativas que desembocou em game over aconteceu porque no Sector 6 eu tinha uma terrível falta de recursos e tinha uma série de construções vitais interrompidas por essa razão. 

Apesar de IXION não nos obrigar a ser excessivamente micro-gestores, o facto de que temos de criar regras e excepções de partilha de recursos entre sectores dificulta, e muito, a missão de levar a Humanidade a um planeta habitável.

Começando pela gestão de recursos e de espaço: para existirem trocas de materiais entre 2 sectores, tem de existir em cada uma delas uma reserva dedicada a esse material, duplicando a ocupação de espaço. 

Uma forma que encontrei para tentar suprir este problema e poupar espaço e recursos passou pela microgestão de que cada nave de carga assignada a que sector poderia transportar determinado material. Desta forma, se num sector é transformado carbono ou sílica, então apenas na doca desse mesmo sector é que as naves podem entregar esses recursos. Conclusão a que cheguei após muitos falhanços.

Se o interior de Tiqqun representa a camada mais micro da gestão, e se a gestão das poucas construções exteriores da estação (como painéis solares e motores) são feitas na camada intermédia, e já que falamos de naves de carga temos de olhar para a camada macro de gestão em IXION: a vista espacial.

É aqui que parte da história vai avançando, e se numa fase inicial estamos confinados às órbitas da Via Láctea, passadas poucas horas o jogo vai-se abrir pela exploração espacial.

Nesta visão macro de IXION, mais próxima com um jogo como Homeworld, temos de utilizar os 3 tipos de nave que construímos (científica, de carga e mineira), para além da própria estação Tiqqun para descobrir recursos e resolver eventos.

Não obrigando a excessiva microgestão, podemos determinar as prioridades para as naves mineiras e de carga, indicando quais os recursos são prioritários para serem trazidos a bordo da Tiqqun, deixando-nos espaço para enviar sondas à procura de recursos específicos, e a nave científica para investigar, recolher pontos de ciência (para desbloquearmos novas tecnologias) e para resolver eventos que nos farão avançar na história.

Depois desta descrição as camadas de gestão e estratégia em IXION, entre city-builder seccionado e jogo de estratégia espacial ao estilo de Homeworld parecem muitas, e na realidade, são. Já recomecei o jogo 7 vezes e penso que esta playthrough actual vai levar-me novamente ao Game Over (o que já me aconteceu por descontentamento da população que me depôs enquanto Administrador, mas também por ter levado a estação a ficar completamente destruída).

Apesar de ser verdade que existe muito, muito mesmo que necessitamos de conhecer, explorar, gerir, sem erros (já que internamente não nos é permitido mover edifícios, temos mesmo de os destruir e reconstruir noutro local), os parcos recursos, os sistemas e cadeias de produção, a visão micro e a satisfação da tripulação resolvendo eventos internos, e ao mesmo tempo explorar o espaço e encontrar, o quanto antes, o porto seguro para que a Humanidade recomece, o retorno é muito recompensador.

No meio de tudo isto existe um enredo interessante, bem escrito e com um bom voice acting que nos mergulha ainda mais em toda esta trama em torno da mega-corporação DOLOS e do seu fundador. Onde a voz da IA que nos acompanha, Edden, a servir de companheira sempre presente na solitária missão de gerir o último reduto da Humanidade pelo vazio do espaço.

IXION é um city builder muito difícil e desafiante, mas no qual vamos aprendendo e conhecendo cada vez mais à medida que vamos jogando. Um jogo com muitos elementos mecânicos complexos e com um desafio elevado, mas onde a satisfação de chegar cada vez mais longe e de gerir com maior eficácia é recompensadora por si só. E para mim , que sou um verdadeiro devorador de jogos do género, IXION é um dos títulos mais originais que joguei em muito tempo e é verdadeiramente obrigatório para apaixonados por city-builders.