Por Rui Pedro Leite

A tecnologia 3D V-Cache revolucionou o mundo dos processadores ao permitir que o CPU tenha acesso a uma rapidíssima memória cache que se encontra literalmente empilhada no die do CPU e que, de uma forma muito simplista, permite que o processador que transmita e armazene mais instruções por segundo, diminuindo automaticamente o número de vezes que este tem de aceder à RAM para processar informação. Isto aumenta dramaticamente a performance em jogos, tendo como lado negativo uma maior sensibilidade do processador a voltagens e clocks mais altos. 

Depois do sucesso do Ryzen 7 5800X3D, todos contávamos que a AMD voltasse a repetir a peripécia com a nova geração Zen4 que vem estrear a plataforma AM5. 

E assim foi.

Foi com grande antecipação que olhamos para o lançamento do 7900X3D e do 7950X3D, no entanto, tanto em termos de performance, mas principalmente na relação qualidade/preço, ficou uma espécie de sabor amargo na boca. 

São processadores brutais, claro, mas onde estava a potência inovadora que vimos no 5800X3D em gaming? Bom, acontece que nem todas as cores do 7900X3D aproveitam o mágico 3D V-Cache, apenas 6 das 12 estão ensanduichadas com essa memória. Isto faz com que a performance seja um pouco aleatória, tendo em consideração que as aplicações às vezes utilizam as cores com 3D V-Cache, mas outras vezes não.

Assim, restam três opções para melhor desempenho em gaming: desativar CCD para aproveitar apenas as cores que têm 3D V-Cache, limitando a performance noutros aplicativos; esperar que exista software/firmware que possa gerir de forma eficaz a situação e esperar que os programadores façam esse aproveitamento cirúrgico aquando do desenvolvimento das aplicações.

Já no que diz respeito ao 7950X3D, apesar de ter disponíveis 8 das suas 16 cores com 3D V-Cache, estamos a falar de um processador que está atualmente no mercado a 809€. 

Resumindo, não é uma situação ideal.

E assim, quase como o Gandalf a chegar a Helm’s Deep, aparece o 7800X3D. Com apenas 8 cores e 16 threads, mas com todas as cores a beber do maravilhoso 3D V-Cache, tornando-o inevitavelmente uma besta em gaming, mas com performance parca em tudo o resto. 

E o que me levou a comprar o 7800X3D?

Estava bastante satisfeito com o meu processador, um i9-9900K overclocked a 5.1, mas tive a sorte e o azar da minha RTX 3080Ti ter queimado durante o beta testing do Diablo 4. Long story short, ativei a garantia, devolveram-me o dinheiro e fui buscar por mais uns euros uma RTX 4090. Acontece que, apesar do i9-9900K ser um processador bastante válido para gaming a 1440p em 2023, a RTX 4090 é simplesmente uma besta. Comecei a notar que a maioria dos jogos só utilizava 50~60% do GPU, com exceção do Cyberpunk 2077 que rondava os 90%. Apesar da utilização do CPU não estar nem perto dos 100%, havia aqui, claramente, um bottleneck significativo.  

Comecei por sondar o i9-13900K, mas não me pareceu uma opção muito interessante. Apesar da incrível performance que tem, a Intel continua a bater na tecla da performance “à bruta”, i.e., usar uma central nuclear para garantir performance. Funciona, mas a electricidade está cara. 

Com o iminente lançamento do Ryzen 7 7800X3D decidi esperar, e quando saíram as primeiras benchmarks caiu-me o queixo. O Tom’s Hardware escreveu que o 7800X3D é o novo “New Gaming Champ”, garantindo que é o processador mais rápido do mercado para gaming. Já a Hardware Unboxed, diz não existir processador que ofereça melhor retorno pelo dinheiro gasto, mostrando vários benchmarks onde o 7800X3D bate o 7950X3D e o 13900K, colocando-o em segundo lugar da tabela (por uma frame), virtualmente empatado com o 7950X3D na média de FPS nos 12 jogos testados. 

Eu pensei: mas isto faz sentido? Como é que a própria AMD dá um tiro tão grande no pé? Um processador de 500€ que iguala (e em alguns casos bate) um de 800€? Ora, como já disse anteriormente o 7800X3D é um processador especificamente para gaming, já em termos de performance nos benchmarks sintéticos e aplicativos ronda a capacidade de um 13600K ou de um 7700X, ambos substancialmente mais baratos. Assim, este processador não é tão polivalente como os outros, não me interpretem mal, ainda assim tem uma performance interessante, simplesmente para qualquer pessoa que não tenha como principal foco jogos de computador, é uma péssima compra na relação qualidade/preço. O 7950X3D é um processador excelente em tudo, o 7800X3D não. Já o 7900X3D, honestamente, fica numa posição difícil – nem é carne nem é peixe. 

Outro fator importante na decisão foi o facto de esta ser a primeira geração de processadores AM5, significando que ao adquirir um novo processador AMD temos longevidade garantida na plataforma, tendo em consideração que esta irá ser utilizada pelo menos até 2025 (segundo fontes oficiais da AMD), o que na prática significará (com grande probabilidade) pelo menos até 2026. Resumindo, se eu quiser trocar de processador no fim de vida da plataforma AM5, bastar-me-á comprar só mesmo o processador, mantendo motherboard e a RAM. Ainda no tema de future proofing, outro factor decisivo foi o facto das motherboards X670E já estarem equipadas com a nova tecnologia PCI Express 5.0, tanto no slot de GPU como nos slots dos NVME’s.

Adiante. 

Não podia deixar de escrever sobre este processador sem abordar a questão do drama do seu lançamento. Uma semana depois de ser colocado à venda, começaram a aparecer relatos de utilizadores no Reddit que viram o seu 7800X3D rebentar em motherboards da ASUS. Por rebentar entenda-se: o processador fritou e destruiu também a motherboard. O meu instinto disse-me automaticamente que isto tinha de ser um problema de regulação de voltagem na motherboard, mas depois apareceu o mesmo caso numa motherboard da MSI, Gygabte, ASRock, etc.

Fiquei branco.

Já tinha o processador encomendado, estava a caminho, um problema que estava a afetar os principais fabricantes de motherboards tinha de ser um problema do CPU, dos perfis, ou de algo do género. Pensei em cancelar a encomenda, mas esperei, depositei a minha fé no Steve da Gamer Nexus que prontamente se ofereceu para comprar um dos processadores e motherboards danificados, podendo assim estudar o caso com rigor. 

E assim foi, a 30 de abril de 2023 a Gamer Nexus lançou a análise desta situação, concluindo que os grandes culpados foram os fabricantes das motherboards, mas também a AMD por falta de controlo no desenvolvimento das BIOS dos fabricantes, concluindo:

Conseguimos derreter processadores AMD X3D no socket de uma motherboard ASUS X670E Crosshair Hero, mas também encontramos erros graves na BIOS da Gigabyte. A voltagem do SOC não é a única preocupação. É também a fraca implementação do OCP, pelo menos na placa ASUS que utilizámos, além de uma combinação da erosão das proteções térmicas e de sobrecorrente. Tal como referido no vídeo, nenhum teste deste tipo é totalmente conclusivo: Estas são questões complexas com variáveis funcionalmente infinitas entre utilizadores (e possíveis erros), fabricantes, versões da BIOS e a própria AMD

Por outro lado, também admitiu que tiveram de se esforçar ativamente para replicar a situação, tudo isto em versões de BIOS mais antigas – entretanto, foram lançadas novas versões a 26 de abril de 2023 que limitam a voltagem do SOC a 1.3v, diminuindo drasticamente a probabilidade de isto voltar a acontecer. 

De qualquer das formas, a AMD está a tratar da ativação de garantia de todos estes casos com a máxima urgência e prioridade, sendo que, no futuro, serão lançadas novas versões de BIOS que irão acabar por refinar a situação. Resumindo, dores de crescimento da nova plataforma AM5. 

Para acompanhar o meu 7800X3D acabei por escolher a X670E AORUS Master e um kit de 32GB de RAM da Corsair a 6000 CL30. No que diz respeito à AORUS Master, foi uma escolha óbvia tendo em consideração que é das motherboards com melhor performance na geração X670E, com uma temperatura de VRMs escandalosamente baixa. A escolha da RAM prendeu-se com o facto de ser especificamente listada nas memórias suportadas da AORUS Master, mas também pelos 6000 CL30 serem o sweet spot de preço-performance na plataforma AM5.

Antes de começar com os dados recolhidos, tenho de também referir que não foi uma instalação fácil. No dia em que montei o material novo estive 3 horas a fazer troubleshooting e o sistema simplesmente recusou-se a fazer post. Revi ligações, retirei o CPU, voltei a colocar, até meti os headers do AIO em sítios errados, propositadamente. A parte mais frustrante foi o facto do debug led nem sequer mostrar um código de erro, ou seja: estava completamente às escuras. 

Tentei o Q-FLASH para fazer upgrade para a BIOS mais recente (sem processador nem RAM), não funcionou. 

Foi um pesadelo kafkiano. Sou um hobbyist na montagem de computadores há mais de 20 anos, estive ao telefone com amigos que já tiveram lojas de hardware, falei com engenheiros de software da AMD, chaguei a cabeça ao André Marrucate, fanboy profissional da AMD que andava no meio de uma serra, nada funcionou.  

No fim admiti a derrota, peguei na minha torre e fui à Globaldata no Porto em modo “Help me Obi Wan Kenobi you’re my only hope”. 

Tenho de reservar umas linhas para fazer uma vénia gigantesca à Globaldata (sem qualquer patrocínio envolvido). Deixei lá a torre, passadas umas horas disseram que estava pronto e recebi esta imagem:

Tinha a BIOS corrupta, conseguiram flashar para uma BIOS mais antiga e paguei apenas 20€. Serviço de excelência, rápido e barato. Cheguei a casa, fiz o update para a BIOS mais recente e segui para bingo.

Esta análise vai focar-se na diferença de performance entre o meu sistema antigo (Intel i9-9900k 5.1GHz, AORUS Master Z390 e 32GB DDR4 Corsair 3200 CL16) versus o atual que é o seguinte:

 

GPU: MSI GEFORCE RTX 4090 OC

CPU: Ryzen 7 7800X3D

Monitor: Samsung Odyssey G7 32″ 240 Hz G-Sync

Motherboard: AORUS MASTER X670E

RAM: 32GB DDR5 Corsair Vengeance 6000 CL30

AIO: Cooler Master Masterliquid RGB 360L

PSU: Seasonic PRIME GX-1000W

Caxa: Lian Li PC-O11DW Dynamic Black + Cooler Master MF120R ARGB 120mm 3 pack

Teclado: Corsair K70 mk2 RGB – Cherry MX Red

Rato: Logitech G903 Lightspeed with HERO sensor

Armazenamento: NVMe KIOXIA Exceria Plus G2 1TB + NVMe Intel 1TB 660p

Áudio: Arctis Nova 7 Wireless 

 

A diferença será, obviamente, significativa, mas não menos interessante e útil para o utilizador real. A maior parte das pessoas troca de CPU de longe a longe e, infelizmente, a maior parte das análises só se foca em diferenças de performance nas duas ou três gerações anteriores ou na versão equivalente da Intel. 

A escolha dos jogos foi um pouco aleatória, mas no fundo acabei por optar por jogos que tinha na minha biblioteca e que possuíam ferramentas de benchmark incluídas. Como extra, adicionei o benchmark do 7-Zip para ter pelo menos um comparativo não gaming

Os testes foram realizados a 1440p em ultra/high settings, com o processador em eco-mode. Como extra, monitorizei a voltagem SOC no HWiNFO para garantir que não andava por caminhos perigosos.

Posso desde já confirmar que a voltagem do SOC nunca ultrapassou os 1.28V, em nenhuma situação. Em idle o CPU ronda os 15/20 watts e em stress test do Ryzen Master 80 watts a 82 graus. As temperaturas em idle são completamente caóticas (para mim), rondando os 45º/50º. Posso ser eu que não estou habituado à AMD, mas o meu 9900K nunca ultrapassava os 35 graus em idle. Fiz re-paste e confirmei tudo um milhão de vezes se o bloco estava bem colocado, as temperaturas foram sempre as mesmas. Já em gaming, consegui entre 60º a 70º, dependendo do jogo. 

Comecemos por olhar para os benchmarks mais fáceis de avaliar, ou seja, os que só tocam nos FPS.

No Cyberpunk 2077 corri os testes com gráficos em ultra/high, sem DLSS, com e sem Path Tracing.

O 9900K conseguiu uma média respeitável de 84 FPS, enquanto o 7800X3D alcançou 141 FPS, um aumento de 67%. 

Já com o Path Tracing ligado podemos verificar que a tecnologia ainda está muito verde e extremamente dependente do GPU, tendo obtido 34 FPS médios no 9900k e 41 no 7800X3D, representando um incremento de “apenas” 20%.

No Red Dead Redemption 2, o aumento foi de 40%, com 124 FPS médios no 9900K e 174 no 7800X3D. 

Já o Borderlands 3 teve resultados mais dramáticos, o 9900K conseguiu 109 FPS médios e o 7800X3D uns fantásticos 218, resultando num aumento de aproximadamente 100%. 

Por fim, o Mafia 2 Def. Edition teve a vitória mais escandalosa de todas: passou de 192 FPS em média para 653, um brutal aumento de 240%. 

No Age of Empires 2 Def. Edition que após realização do benchmark nos apresenta um resultado numérico, passamos de 1238 pontos para 1412. 

Já no Civilization 6, corri o teste de tempo médio de turno, resultando numa diminuição de 6.43 segundos no 9900K, para 5.81 segundos no 7800X3D. 

Por fim, o último teste que realizei foi de produtividade com o benchmark do 7-Zip, 10 passes, onde os resultados foram estrondosos. O 9900K fez os 10 testes em 115 segundos, enquanto o 7800X3D conseguiu terminar a tarefa nuns rapidíssimos 55, sendo 109% mais rápido do que o i9. 

Final Thoughts

Fiquei chocado com o bottleneck que o meu fiel i9-9900K estava a fazer à RTX 4090. Pensei que existiria algum choke, mas nunca sequer imaginei que iria ter melhorias de 100% ou 240% como aconteceu no Borderlands 3 e Mafia 2 Def. Edition

O 7800X3D é um excelente processador, não é para toda a gente tendo em consideração o preço e as limitações que tem em produtividade, mas é, sem dúvida, um excelente aliado para as placas gráficas mais potentes. 

Mais impressionante ainda é o facto do 7800X3D estar em eco-mode sem qualquer overclocking, sendo certo que ainda existe aqui algum untapped power significativo. Decidi colocar em eco-mode porque o drama dos Ryzens queimados foi demasiado recente, mais vale jogar pelo seguro e aguardar pelo amadurecimento das BIOS, perfis de OC e novas versões AGESA. 

Quero também acreditar que muitas melhorias se deveram à RAM, passar de DDR4 a 3200 para DDR5 a 6000 é significativo, tudo junto deu no que se viu. 

No final do dia sinto que fiz a escolha certa e estou ansioso por assistir ao amadurecimento da plataforma AM5.

A escalada que a AMD está a fazer desde o lançamento do primeiro Ryzen é impressionante, fico mesmo feliz que tanto a team blue como a team red estejam a lançar processadores tão bons, a competição é feroz e os resultados promissores, no final do dia, ganhamos todos. 

What a time to be alive.