Se Morrissey e Johnny Marr dessem permissão para que o pequeno estúdio suiço Sunnyside Games utilizasse There is a Light That Never Goes Out do magnífico The Queen is Dead como música oficial de Nocturnal, diria que teríamos a união perfeita entre conceito e linha musical oficial.

Historicamente já diversos jogos utilizaram a chama enquanto ponto central. Seja enquanto fonte de poder, ou mesmo como chave de resolução de inúmeros puzzles. Nocturnal, um puzzle platformer de acção recém-lançado utiliza a chama precisamente dessas duas formas.

A coesão que sentimos nos primeiros minutos de Nocturnal, com a sua brilhante direcção de arte e animação tradicional deixam transparecer que este ponto de chegada actual não é um mero acaso. Mas quem conhece o percurso do estúdio por trás do seu desenvolvimento, e que criou anteriormente The Firm e Towaga, sabe que é apenas a representação do amadurecimento dos seus criadores.

Apesar do enredo ser limitado, e servir para unir as sequências de puzzle e combate, existe um contexto narrativo em Nocturnal. Somos um soldado que defende a Chama Eterna e que após uma tribulação marítima vê-se de regresso à sua ilha de origem, Nahran, qual Ulisses que regressa a Ítaca. Mas a sua bela ilha está vazia e transfigurada, coberta por uma neblina mortal que mergulhou o território na escuridão e por onde se escondem guerreiros de sombras que nos esperam em salas escuras.

O mistério desta neblina que cobre toda a ilha adensa-se ainda mais quando percebemos que ela é, de alguma forma, consciente, perseguindo-nos quando sente a nossa presença, como um inimigo etéreo que não conseguimos combater.

A chama não é apenas o leitmotif principal de Nocturnal, estabelecendo a essência narrativa do jogo, mas a sua principal mecânica. Todos os puzzles são resolvidos com o alumiar de archotes dependurados pelas paredes. Para isso utilizamos a nossa espada, que se incendeia por um período limitado quando entra em contacto com o fogo.

A gestão do tempo da chama é, aliás, um dos grandes desafios do nível. Conseguirmos escalar uma série de plataformas para acender mais um archote, sabendo que estamos a lutar contra-relógio para que a chama não se extinga. No entanto, cada archote é uma espécie de couto, visto que o contacto com a nossa espada para o acender serve também para recomeçar a contagem de extinção da nossa chama.

A nossa espada flamejante tem ainda outras utilidades. A primeira, e mais óbvia, dada a neblina e escuridão que cobrem a ilha, é a de alumiar as salas que percorremos e dessa forma manter-nos a salvo das trevas. A outra, centra-se no combate. Os nossos ataques flamejantes não só incendeiam os adversários, como lhes dão damage-over-time, facilitando as curtas, mas desafiantes sequências de combate. E mais à frente, à medida que progredimos, vamos encontrar alguns inimigos que ora se escondem na escuridão como também são imunes a ataques normais da nossa espada, e apenas com fogo os conseguimos derrotar.

A experiência side-scrolling de Nocturnal é contida em torno deste loop bem-definido, o que levou a uma imensa sensatez dos seus criadores em circunscreverem todo o jogo numa viagem de curta duração. E neste curta viagem de luz e sombra, trazer-nos pela sua arquitectura e ambiente, laivos de inspiração do Prince of Persia original.