Final Fantasy XVI tem sido muito bem recebido pelos fãs da saga, ou pelo menos, por grande parte, que não viram com bons olhos a introdução de um mundo aberto no 15º capítulo. Pessoalmente sempre considerei que a série é aberta a experimentalismos, seja a nível mecânico ou narrativo e por isso não vi nada de mal no anterior jogo. Da mesma forma que temos que conviver com o fato de que Final Fantasy 14 é um MMO com mensalidade e mais uma vez, muitos fãs passaram ao lado. Não joguei todos os capítulos da saga, mas Final Fantasy 14 foi um deles, incluindo todas as expansões lançadas até à data e não há dúvida que muito do seu ADN está patente na nova aventura, mesmo que muitos jogadores não o detetem, porque lá está, não jogaram o MMO. 

E a razão é simples: o produtor Naoki Yoshida herdou a responsabilidade de criar o XVI, como uma recompensa pelo excelente trabalho no MMO. Basicamente salvou o jogo do desastre inicial, dando-lhe nova vida e a meu ver, construiu uma das melhores narrativas e personagens de toda a série, mesmo sendo um MMO. Mas para o novo capítulo, Yoshi P não assumiu a cadeira de diretor, cargo da responsabilidade de Hiroshi Takai, mais conhecido pelo trabalho feito na série SaGa e The Last Remnant. Igualmente bons créditos. E para fechar o elenco de nomes, o diretor de combate é Ryota Suzuki, que trabalhou anteriormente na Capcom em Devil May Cry 5 e Monster Hunter World. 

E é exatamente aqui que FFXVI se distingue dos anteriores jogos: o sistema de combate pretende ser over the top, rápido e frenético, que muitos catalogam do “tipo Devil May Cry”. De facto, o jogo tem um sistema de combate tipicamente de ação em tempo real, algo pouco comum na série principal, mas que ao longo dos anos se foi aproximando deste formato. Ainda assim, este não é de todo um Devil May Cry, são propósitos diferentes. Pode encher o olho, mas o combate é menos tático e longe da variedade dos combos que um DMC ou Bayonetta oferecem. 

Inicialmente o sistema de combate até me deixou um pouco a desejar, por limitar ao premir freneticamente o mesmo botão de ação. Mas ao longo da história vamos desbloqueando Eikons, interpretação para este jogo dos Summons dos anteriores títulos da série. Cada um tem um domínio de um elemento, como o fogo, o vento, o gelo ou a eletricidade e os jogadores podem utilizar habilidades associadas geridas por cooldowns. Na prática, esmaga-se o quadrado para atacar com a espada e vai-se rodando os Eikons que estejam disponíveis para aumentar o dano, sejam ataques individuais ou de área. 

Este sistema inspira-se igualmente num MMO ou mesmo um RPG tradicional, através de um sistema de rotação de habilidades que devem dominar para maior eficiência nos combates, sobretudo os mais complexos. O gatilho esquerdo alterna entre eles e podem usar sempre que esteja novamente disponível. 

E se acharem que é complexo trocar constantemente de Eikon, o jogo convida a equipar anéis que ajudam a concentrar no mesmo botão de ataque todas as habilidades especiais. Podem dessa forma jogar com apenas uma mão durante os combates de tão simplificado que fica. E para completar, outro anel coloca um aviso com um timer no ecrã a avisar os jogadores para premir rapidamente o R1, ou seja, para se esquivarem ao ataque. A aventura começa desta forma, com estes anéis, que para o bem da diversão recomendo que seja a primeira coisa a retirar. É um modo easy para um jogo que por si já é consideravelmente fácil. 

Quando tiram os anéis, trocando-os por equipamento que realmente aumenta as estatísticas ou salientam as capacidades das habilidades, como por exemplo a diminuição do tempo de cooldown, vão então descobrir um combate mais divertido e intenso. Neste caso, vai ser preciso ler as animações dos ataques dos inimigos, como o levantar a espada ou a conjuração de uma magia. E neste caso, a equipa de Ryota Suzuki fez um bom trabalho, descartando os habituais sinais telegráficos para nos avisar, tornando o combate mais intenso e cinematográfico, sem elementos intrusivos. 

E tenho desta forma de dar a mão à palmatória que apesar de considerar inicialmente simplório e repetitivo, os combates começam a tornar-se mais intensos mais adiante na aventura, sobretudo contra inimigos mais poderosos, com uma barra de stagger que tem de ser anulada. O crescente do desafio, mas ao mesmo tempo a habituação de alternar as habilidades acabaram por me fazer mudar um pouco a opinião em relação à primeira dezena de horas. 

Existem elementos que não são bem explicados, mas quando dominam elevam a diversão. Por exemplo, o jogo dispensa o típico botão de bloqueio de ataques, mas se atacarem no timing correto que o inimigo não só conseguem bloquear como deixá-lo atordoado por um segundo. Além disso, o botão circulo ativa uma habilidade que pode ser defensiva ou dash, mediante o Eikon. Além de que podem esquivar-se freneticamente da maior parte dos ataques, sem a ajuda de qualquer anel. Tudo somado, quando ultrapassam as 20 horas de jogo e dominam os combates, consegue-se finalmente perceber a “big picture” do sistema criado, um pouco dentro da filosofia “fácil de usar, difícil de masterizar”. E isso é agradável. Uma nota adicional para o sistema de câmara, sempre colocada num inimigo mais próximo. Basicamente não precisam de mexer o analógico direito para gerir a câmara, libertando o jogador para focar nas habilidades especiais. Poderia ser um desastre, mas a câmara funciona realmente muito bem. 

Os bosses principais são muito bons no geral, com muitas mecânicas típicas de um encontro num MMO, com diferentes fases e padrões de ataque. É preciso decorar os principais ataques e é neste aspeto que a equipa de Yoshi P se transcendeu. Vencer uma destas batalhas dá direito a pousar o comando e limpar o suor, porque alguns demoram mais de meia hora a finalizar. Mesmo que morram, podem sempre recomeçar do início de cada nova fase. Este é o melhor ponto de inspiração em FF14 que realmente me pareceu muito bem conseguido. 

Outra variação dos encontros e esta sim, tem deixado os fãs de olhos arregalados são os combates entre os titãs Eikons, quando o protagonista se transforma por completo contra outro monstro. É uma homenagem aos combates Kaiju, cheios de quick time events e animações. Mas são muito simples de resolver. Senti que estava mais a participar numa cut scene interativa do que propriamente num combate desafiante.

Perdeu-se também uma oportunidade para controlar os restantes membros do grupo durante os combates. Certamente que daria mais variedade à ação. Estes são completamente independentes. Apenas podemos dar algumas instruções ao nosso lobo Torgal. 

Sei que tenho feito diversas comparações de Final Fantasy XVI com o MMO anterior, mas estas são inevitáveis, mesmo a nível de design. O facto de Yoshi P ter dividido o seu tempo entre os dois jogos é notado nas soluções encontradas para algumas das suas mecânicas. Um dos pontos que menos gostei foram as quests secundárias. Estas estão presentes para encher chouriço, sem histórias de fundo em grande parte delas, sendo a maioria para matar inimigos, encontrar itens ou situações ainda mais básicas. 

As recompensas deixam a desejar, por isso, a não ser que sejam obcecados pelo complecionismo, podem ignorar, da mesma forma que devem ignorar as side quests de FF14. Veja-se que estas são assinaladas pelo mesmo símbolo, um ponto de interrogação a verde. Se jogaram o MMO vão ainda reparar que algumas têm o símbolo “+”, o que significa que embora sejam secundárias, têm maior importância na sua recompensa. Por exemplo, uma delas dá acesso ao Chocobo, que se ignorarem ficam sem a montada na aventura. 

Há ainda um sistema de caça de monstros específicos, oferecidos no acampamento principal num quadro gerido por um Moogle. São inimigos mais fortes e mais complexos de derrotar. 

Este não é definitivamente o RPG tradicional que esperariam, mas um jogo de ação com elementos muito ligeiros de RPG. Os pontos de experiência que acumulam ao completar quests e a derrotar os inimigos fazem a personagem subir de nível sim, mas apenas para aumentar automaticamente as suas estatísticas. Algo que qualquer jogo de ação decente faz. Não existe qualquer controlo do jogador na construção da build da personagem. As espadas melhores ou anéis com mais pontos de estatística vão aparecendo naturalmente e são upgrades simples, quase automatizados.

A única coisa que os jogadores podem modificar é o alinhamento dos Eikons. Ao longo da aventura vão desbloquear novas formas, com habilidades diferentes. E apenas podem ter três equipados simultaneamente. Podem investir pontos de habilidade acumulados para desbloquear ações associadas ou melhorar as mesmas. Mas como o jogo incentiva a experimentar cada novo Eikon que vão desbloqueando, nunca chegam a ter muito tempo para aprofundar cada uma delas. Algo que fica para o modo Game Plus. 

Há ainda que destacar o design preguiçoso dos mapas. O jogo divide-se entre dois momentos essenciais. Por vezes a ação torna-se totalmente linear, num corredor em que temos de matar inimigos e assistir a cut scenes, puxando a história para a frente. Pessoalmente não me importava que toda a estrutura fosse linear desta forma. Por outras, a necessidade de deixar os jogadores respirarem, sim, mas oferecendo pequenos mapas em forma de hub, com alguma liberdade de exploração, ainda que o incentivo seja quase nulo. Nesta altura falam com as personagens, recebem quests principais e secundárias, que eu considero um filler. Não gostei deste ponto, por mais uma vez se aproximar da forma despida de um MMO. 

Mas um dos melhores aspetos introduzidos nesta aventura é o sistema de Active Time Lore. Acho que a equipa encontrou a forma quase perfeita de manter o Lore sempre presente na aventura. Quantas vezes encontramos personagens, locais ou eventos que já não nos lembramos e que nos fazem perder o fio à meada? Em Final Fantasy XVI podem premir o painel tátil do comando a qualquer altura e ativar um menu que dá acesso aos tópicos de informação enquadrados no que está a acontecer, a descrição do local, personagens e outras, mantendo-nos sempre a par do Lore. 

A história deste Final Fantasy XVI é bastante boa e talvez tenha sido o principal elemento a agarrar-me até ao fim. O ambiente mais negro e adulto, deixando de lado o colorido mágico mais típico da série, oferecendo uma fantasia inspirada em Game of Thrones. Há uma grande complexidade na trama e algumas reviravoltas inesperadas, desencontros e encontros de puxar a lágrima. Mas o melhor são mesmo as personagens: a química imediata com o protagonista Clive, mas outras como Sid e Dion revelam-se muito carismáticas. Mesmo os vilões têm profundidade, ainda que por vezes com excesso filosófico. Mas sendo um dos melhores aspetos da aventura, deixarei para os jogadores interessados explorarem. 

Como RPG, Final Fantasy XVI parece sofrer de uma falta de identidade, abusando da inspiração no conceito de MMO. O combate é inicialmente simples e muito aborrecido, mas acaba por se revelar intenso, sobretudo na última dezena de horas quando têm praticamente todos os Eikons disponíveis para criar um alinhamento mais amplo de habilidades. Falta-lhe maior profundidade tática e os elementos tradicionais de evolução da personagem e exploração do equipamento. 

Mas estamos perante um bom jogo, que me custou muito inicialmente a entrar, mas que acabei rendido na sua segunda metade: a história, as personagens, as cut scenes dramáticas e o voice acting são envolventes. Nada que surpreenda se compararmos ao excelente trabalho feito em Final Fantasy 14 neste campo, mas ao mesmo tempo, poderia ser um jogo bem melhor se não fosse mesmo a colagem excessiva ao MMO. Cheguei mesmo a pensar a certa altura se esta não seria uma nova expansão, mas que ganhou direito a aventura independente. Opinião polémica, eu sei. São 40 horas narrativas, ignorando a maioria das quests secundárias, por isso, é uma aventura longa que merece o “bang for the buck”.