Este é o Prince of Persia que sempre desejei.
Esta é a melhor forma de começar a análise e de certa forma é verdade. Apesar de ter gostado muito da transformação da obra de Jordan Mechner pela Ubisoft, pelo estúdio de Montreal quando o mundo conheceu o fantástico universo de The Sands of Time, os jogos originais são exatamente de plataformas, com perspetiva 2D side scrolling. E agora, se houvesse um jogo excelente para ser transformado num metroidvania, esse teria de ser o Prince of Persia.
The Lost Crown foi produzido pela Ubisoft Montpellier, o mesmo que criou os excelentes Rayman Origins e Rayman Legends, ainda no tempo em que Michel Ancel liderava o estúdio. Mas já lá vão 10 anos desde o lançamento de Legends, tirando alguns lançamentos para smartphones, o estúdio não produziu mais nada. E Beyond Good & Evil 2 ainda está no segredo dos deuses. The Lost Crown é o acordar do estúdio e não o poderia ter feito da melhor maneira.
Bastam alguns minutos com o jogo para percebermos que estamos perante algo bastante especial. Com a ajuda da indústria indie, o mundo tem recebido excelentes títulos metroidvania, uns mais ambiciosos que outros, uns bem mais desafiantes, outros lindíssimos. E Prince of Persia: The Lost Crown vem capitalizar essa experiência, apresentando um misto entre o desafio e recompensa, num mundo belíssimo e repleto de mistérios. E isto sem se afastar demasiado do universo Sands of Time, em que as areias ou neste caso, os fragmentos do tempo, continuam a ter uma grande importância na história e mecânicas do jogo.
Estamos perante um título massivo, com um mapa gigantesco que se vai descascando como uma cebola à medida que vamos descobrindo novas habilidades que abrem caminho a uma passagem anteriormente bloqueada. É a mecânica mais tradicional do género, mas que a Ubisoft introduziu com eficácia, incluindo os muito irritantes backtrackings típicos destes jogos. Há inimigos bastante desafiantes para defrontar e há bosses excelentes, com movimentos que devem ser estudados, obrigando-nos a defender ou rebolar mediante o tipo de ataques. A personagem tem um vasto leque de golpes e combos, numa agilidade incrível quando olhamos para o primeiríssimo jogo da série. E claro, as armadilhas, dos picos móveis, às plataformas destrutíveis, os elevadores e muitas outras situações que são introduzidas nos diversos ambientes. Tudo vai se complicando à medida que avançamos pela aventura.
Lost Crown apresenta um novo protagonista, diferente da série Sands of Time. Desta vez assume-se Sargon, um poderoso guerreiro equipado com duas espadas gêmeas batizadas de Qays e Layla, oferecidas por Anahita, líder do grupo de soldados de elite Persa conhecido como The Immortals. Quando o príncipe da Pérsia Ghassan foi raptado, Sargon e os Immortals são destacados para o salvar e esse é o grande objetivo da narrativa, com algumas reviravoltas interessantes.
O jogo introduz um sistema de melhoramento da personagem bastante interessante. Em vez do tradicional sistema de RPG, teremos de adquirir pedaços de um medalhão para aumentar a barra de energia. Também pode ser aumentada através de certos talismãs raros que vamos encontrando e adicionado ao colar da personagem. Os espaços são limitados e podem encontrar preciosos slots para aumentar a sua capacidade, até porque as medalhas mais poderosas podem ocupar até três espaços. É esta gestão do colar que vai ditar a build com que jogam, mediante o estilo de jogo, mais ofensivo ou defensivo.
A personagem também vai poder melhorar as espadas numa forja, aumentando a sua capacidade de dano, assim como o arco e flecha. O arco serve também como um bumerangue de arremesso, tanto para atacar como ser usado em puzzles para destruir itens ou ativar interruptores. A personagem também está equipado com um frasco de poção para recuperar a energia, que obviamente pode ser aumentado assim como a eficiência da recuperação. Com alguns elementos típicos dos Souls, ao longo do caminho vão encontrar árvores que servem de porto seguro para registar o checkpoint, recuperar a energia e os frascos, mas ao mesmo tempo os inimigos fazem reset. Aqui podem também equipar os medalhões, assim como habilidades especiais como ataques mais fortes ou recuperação de energia. Estas habilidades estão dependentes de uma barra que enche mediante os combos executados.
Sem dúvida que os combates são um dos aspetos mais divertidos do jogo. A quantidade de combos e combinações que se pode fazer, rebolando e bloqueando os ataques, tudo é bastante fluido, a 60 FPS nas animações, além de basicamente não ter loadings quando morrem.
Quanto às habilidades especiais, Saigon vai aprender a fazer o precioso dash, aumentando a longevidade do salto, ainda que sinta imensa falta do simples “duplo salto” que ainda tenho esperança de desbloquear algures na aventura. É possível fazer uma réplica da personagem onde quiser e com um simples premir do botão somos teleportados, numa mecânica essencial a muitos dos puzzles e combates do jogo. Há ainda a possibilidade de saltitar entre dimensões, nomeadamente para explorar plataformas invisíveis num plano para aparecem no outro.
De salientar ainda que todo o mundo de Mount Qaf está interligado no gigantesco mapa que vamos pintando, como é normal no género metroidvania. Mas neste título podemos meter marcadores com símbolos onde quisermos, para identificar passagens bloqueadas, arcas, puzzles e outros mistérios que possamos querer revisitar mais tarde com novas habilidades. E ainda podem adicionar uma screenshot diretamente do jogo, sem a necessidade de ir ao mapa. Estes sistemas são excelentes e certamente vão ajudar os jogadores a completar a aventura a 100%.
O jogo tem uma duração de cerca de 20 horas ou mais, dependendo da dificuldade que tiverem a ultrapassar os puzzles, armadilhas de algumas secções e bosses. Podem sempre arranjar locais de farming para melhorar algumas habilidades da personagem e ainda fazer upgrades aos medalhões. Mas ainda assim o estúdio pensou nisso e a partir de certo nível melhorar a personagem requer uns itens especiais que apenas encontram explorando cada recanto do mapa. O interessante é que mesmo nas situações mais difíceis nunca senti grande frustração, acabando por ultrapassar os desafios depois de algumas tentativas.
Prince of Persia: The Lost Crown é a primeira gema de 2024, um jogo obrigatório para quem gosta de metroidvanias e para quem gosta deste universo, até podemos desculpar a Ubisoft por andar a adiar constantemente o remake de Prince of Persia e outros jogos da série.