É preciso viver debaixo de uma pedra para não ter ideia do que é Scythe, e a importância que este teve para catapultar Jamey Stegmaier e a Stonemaier Games como nomes maiores do mercado dos jogos de tabuleiro. O retrofuturismo que Scythe nos trouxe com a sua reinterpretação dos 4X acabaria por abrir as portas para uma série de expansões que viriam a expandir o seu universo em termos mecânicos e até narrativos.
A história de Expeditions passa-se anos após os acontecimentos de Scythe: The Rise of Fenris, num momento de História Alternativa no qual iremos investigar a queda de um meteorito junto ao Rio Tunguska, descobrindo, pelo caminho, uma corrupção antiga despoletada pelo evento.
Não precisamos mais do que segundos para perceber que Expeditions existe no mesmo universo de Scythe. As ilustrações do magnífico Jakub Rozalski levam-nos de imediato para o ambiente quasi-Tales from the Loop de Simon Stålenhag que definiu toda a jornada de Scythe, com um passado alternativo onde máquinas estranhas ocupam a Europa do pós-Guerra.
É também mecanicamente que encontramos esse filão de continuidade entre Scythe e Expeditions, e onde este assume um lugar reconhecível para os fãs do famoso jogo de Stegmaier.
Começamos por escolher o nosso personagem e o mech correspondente, com poder próprio, e com ele a carta de companion que fará parte do nosso deck inicial, numa proposta de assimetria total para com os restantes jogadores. A escolha de acções lembra muito o próprio Scythe, mas desta feita o “painel de controlo” do nosso mech tem 3 possibilidades contíguas – Move, Play e Gather – e uma adicional, Refresh. Tal e qual Scythe, não nos é permitido executar a mesma acção em dois turnos subsequentes, e somos obrigados a optimizar o nosso motor através da escolha dessas acções.
Num tabuleiro constituído por 20 hexágonos colocados para baixo, e que têm de ser explorados (ora não fosse o nome deste jogo Expeditions), ao usarmos a acção de Move temos algumas regras para responder: podemos deslocar-nos 1, 2 ou 3 espaços, temos de terminar num hex vazio, e se passarmos por um espaço ainda não revelado o nosso movimento termina de imediato. É então revelada a face frontal do hexágono, e recebemos um token de mapa por termos “cartografado” aquele espaço.
A acção de Gather é igualmente simples: recolhemos os recursos indicados no hexágono, ou, extraordinariamente, poderemos cumprir os poderes associados a esse mesmo espaço, tal como obter a carta disponível na zona circundante, ou “terminar” um achievement. À semelhança do estabelecido em Scythe, temos uma série de achievements que podemos obter se os cumprirmos, e o primeiro a terminar o seu quarto título (de uma série de possibilidades distintas) despoleta o fim do jogo.
A acção de Play permite-nos jogar cartas da nossa mão, recebendo os benefícios posicionados no canto superior esquerdo da carta. A forma como Expeditions entende a definição de “mão” resume-se ao posicionamento das cartas em relação ao nosso tabuleiro pessoal de personagem: à esquerda as cartas da dita “mão”, à direita às cartas jogadas.
Algumas das cartas têm uma bonificação se lhes atribuímos um trabalhador da cor correspondente. Estes trabalhadores ficam “presos” à carta até que a acção de Refresh seja efectuada.
A acção de Refresh é a única opção que temos para recuperar as cartas já jogadas, assim como os trabalhadores que lhes atribuímos, permitindo também, em troca de um turno no qual apenas refrescamos o nosso tabuleiro, voltar ao ponto onde poderemos, no próximo turno, escolher qualquer uma das 3 acções.
Existem diversos tipos de cartas e que se correlacionam não só com o jogo, mas também com o nosso mech. Cartas de Artefacto, que funcionam como upgrades ao nosso mech, e Cartas de Meteorito que poderemos acoplar definitivamente ao nosso tabuleiro se lhes retirarmos a corrupção associada. O último, as Quests, são cartas que envolvem o cumprimento de requisitos simples para serem terminadas, usualmente envolvendo algo tão simples como chegar até ao hexágono com um número determinado para serem consideradas como terminadas.
Ao contrário de Scythe, Expeditions tem um mínimo de interacção entre jogadores, sendo que este se resume a termos jogadores estacionados em hexágonos com acções ou recursos que queremos obter (impedindo outros de lá parar no seu turno), ou vermos um adversário a conseguir obter para si uma carta presente no mapa e que queríamos para o nosso engine building.
Tirando esse aspecto, Expeditions não tem combate, e o foco de todo o jogo centra-se mesmo em exploração, e nunca em domínio territorial. A diversidade de achievements tal e qual como em Scythe leva a que os caminhos para a vitória sejam diversificados e com alta adaptabilidade de jogo para jogo.
Os componentes, como podemos ver pelas fotos, são o que esperamos de um jogo da Stonemaier Games: todos de elevadíssima qualidade, desde as bandejas e insertos feitos à medida, passando pela miniaturas e pelos tokens. O modo Automa, para jogadores a solo, também não poderia faltar.
Expeditions é um jogo diferente de Scythe, mas por várias razões (sendo uma delas a frase impressa na caixa identificando-o como uma sequela deste) há muito de um jogo para outro. Talvez a falta de interacção entre jogadores, e a ideia de que as expedições estão individualmente isoladas nos seus próprios turnos colocam Expeditions na área dos jogos de exploração e distante temática e mecanicamente do quase 4X do seu antecessor. Tenho curiosidade em saber se as expectáveis expansões de Expeditions trarão interacções, perigos, novas mecânicas e qual a continuação desta história alternativa aos acontecimentos de Tunguska, acreditando que essa possa ser a forma de transformar este título que é actualmente apenas um bom jogo, mas que o possa tornar em algo verdadeiramente maravilhoso.
Para fãs de Scythe, Expeditions é o próximo capítulo lógico e natural, fazendo algo curioso e algo inesperado: apresentar-se como uma excelente porta de entrada para este universo para quem nunca antes contactou com ele.