Se Street Fighter II teve o condão de ser o primeiro jogo que joguei nas arcadas em toda a minha vida, ficando para sempre marcado como tal, e Mortal Kombat que é a série favorita da minha família (e a minha) pelas razões que aqui falei há 9 anos. Mas anos depois da hegemonia daquelas que são ainda hoje as duas maiores séries de jogos de luta, algumas vieram ameaçar o trono. Nenhuma como o fez Tekken na geração da PS1.
Com o verdadeiro bastião de vendas encontrado pela Sony no nosso País, durante muito tempo os Tekken eram sinónimo de jogos de luta em Portugal, culminando naquele que se tornou o standard do género e que foi lançado em 1998: Tekken 3, o jogo que todos queriam jogar e que ainda hoje é um dos fighting games de maior sucesso comercial e crítico com 96% de Metacritic.
O que sempre diferenciou Tekken dos restantes era a fluidez e a complexidade do seu elenco. Cada personagem era verdadeiramente diferente de jogar dos restantes, fosse nas gigantescas listas de movimentos, ataques e combos, que estavam intimamente ligados aos estilos de luta de cada um. Se os fighting games “clássicos” na arcadas nos habituaram a uma lógica de quatro botões que controlavam murros e pontapés, fracos e fortes, Tekken vinha agitar as águas ao mudar-nos o mindset para nos obrigar a reajustar o controlo dos braços e das pernas.
À época tornou-se também irónico que para mim, a pressão que a quinta geração de consolas exerceu na minha série favorita, Mortal Kombat, acabou por levá-la a abandonar o que fazia de bem e tentar repetir o sucesso do que as novas séries da moda faziam. E se a luta bidimensional de Mortal Kombat rivalizava com Street Fighter, a sua aventura por terrenos onde Virtua Fighter, mas sobretudo Tekken dominavam, fez-me afastar por quase 15 anos dos jogos de Ed Boon, e colocar a abordagem de Seiichi Ishii no pódio.
Diria que na era tanto da PS1 como da PS2 o Tekken ocupou quase indisputado a minha preferência e o meu tempo dedicado aos jogos de luta. Não era para menos: para além do título da Bandai Namco esticar ao máximo as potencialidades técnicas das consolas da Sony, este conseguiu também elevar todas as tentativas feitas por outras séries de luta tridimensionais, aprender com elas, e aperfeiçoar todos os elementos conceptual e tecnicamente possíveis com a tecnologia da época. E assumir-se, até hoje, mais do que o Rei do Torneio do Punho de Ferro, mas o Rei dos jogos de luta tridimensionais.
Sete anos depois do jogo anterior, eis que A Bandai Namco lança a oitava iteração de Tekken, precisamente numa janela próxima do lançamento das duas maiores séries do género, que publicaram os seus mais recentes lançamentos em 2023. Acredito que o adiamento de Tekken para 2024 se prenda mesmo com isso: apesar do público fiel à série, o risco de lançar na mesma janela de tempo que Street Fighter e Mortal Kombat era demasiado. O investimento financeiro e de tempo disponível para os jogadores de jogos de luta dificilmente conseguiria albergar 3 títulos no orçamento.
Ainda assim, Tekken 8 é mais uma vez o pináculo da série. Com 32 personagens jogáveis logo de início, tornando-o o maior elenco disponível de qualquer fighting game AAA no passado recente, e de alguma forma contrariando a estratégia de negócio dos seus outros dois competidores.
Dos 32 personagens disponíveis, 3 são novos: Victor, Reina e Azucena, cada um deles a lembrar o estilo de luta de personagens passados. É também nesta diversidade de estilos de luta que transforma Tekken (e a sua oitava iteração) num jogo que tem naturalmente um ponto de entrada mais difícil que SF e MK. Se os outros dois foram refinando uma abordagem arcade clássica, Tekken vem de uma geração posterior, onde o rol de movimentos de cada personagem é amplificado pelo número de stances que cada um possui, tornando-o pouco acessível a novatos, não fosse a recém aplicação do apelidado Special Style. Com este modo de controlo podemos fazer movimentos especiais pressionando apenas um botão (uma estratégia de acessibilidade que os competidores já tinham implementado) mas que senti que acaba por prejudicar Tekken. É que a já referida diversidade de movimentos não “cabe” de forma eficaz neste modo, e em Street Fighter, dada a maior limitação de golpes, este modo de acessibilidade encaixa sem que exista “perda na tradução” como se sente em Tekken 8.
Mecanicamente a grande adição de Tekken 8 é mesmo a barra azul de Heat, que numa explicação sumária é uma possibilidade que temos por round de durante 10 segundos conseguirmos aumentar o dano ao ponto de conseguirmos até penetrar bloqueios, terminando com um golpe especial. Esta barra refresca no início de cada round, tenhamos perdidos ou ganhado o assalto anterior. Portanto a decisão de quando iremos gastar este poder especial é sobretudo estratégica.
Em Tekken 8 encontramos um modo muito similar ao World Tour de Street Fighter VI: Arcade Quest. Neste tutorial narrativo com mistura de role-playing vamos deambular e encontrar personagens que nos vão ensinando movimentos e a profundidade da luta de Tekken, um elemento perfeito e mais single player para ambientar os novos jogadores da série às décadas de experiência que os veteranos já contam.
Um dos grandes elementos deste Tekken 8 é a componente online, com uma densidade e disponibilidade que poderá inspirar outros jogos do género no futuro. O oitavo Tekken está tão direccionado para uma excelente experiência online que nos traz elementos diversos para quebrar qualquer tipo de downtime. Um desses exemplos é a possibilidade de combatermos com os “fantasmas” de outros jogadores, se estes não estiverem disponíveis para jogar online connosco. Estes “fantasmas” aprendem com a forma de lutar de cada jogador e é uma excelente forma de treinarmos o seu estilo, sendo que Tekken 8 vai longe o suficiente de nos permitir lutar contra o nosso próprio “fantasma”. Num desafio maior, experimentem descarregar os “fantasmas” dos jogadores profissionais do topo do leaderboard, e… divirtam-se?
Com Tekken Ball incluído para adocicar momentos de luta “diferentes”, Tekken 8 é visualmente brilhante e assume-se também como o auge de toda a série e como o padrão dos jogos de luta verdadeiramente tridimensionais, e de que forma é que numa era em que os maiores do género se renderam a um mundo 2.5D, a sua fidelidade às suas origens colocam-no numa liga só sua.