Como fã incontestado de aventuras gráficas fico sempre feliz de ver criadores independentes a manterem o sangue do género a correr com cada novo lançamento. Para além disso, é um ponto adicional se os criadores puderem trazer algo da sua cultura local para os jogos, e ninguém pode questionar o estúdio finlandês Act Normal Games de o fazer.
Rauniot, é o seu recém-lançado jogo de estreia, uma aventura point ‘n click pós-apocalíptica que tem lugar na região Norte da Finlândia, nos campos de Saana, perto do final dos anos 1970. O que sabemos desde o início deste jogo é que em 1975 um grande desastre natural precipitou a civilização para o colapso, com motins e guerras nucleares a sucederem a esse evento, terminando com a Humanidade como a conhecemos. Grande parte dos continentes estão submersos, e a poluição nuclear é quase omnipresente, contribuindo ainda mais para o decréscimo dos reduzidos números de humanos vivos.
O ambiente é desolador, com crianças a nascerem com mutações, ou a morrerem durante o parto, levando as suas mães com eles, deixando pais a vaguear pelo planeta com recurso ao canibalismo para sobreviver.
Rauniot, como podem perceber é um jogo depressivo. Se não o perceberam basta olharem os primeiros instantes para os tons térreos do jogo para sentirem que não existe uma ponta de alegria neste jogo.
Todo o voice acting é finlandês, uma opção que não pode ser mudado. Aliás, há algo de estranho em Rauniot atípico até para o mais pequeno indie lançado nos dias de hoje: poucos ou nenhuns são os settings que podem ser alterados por nós.
Rauniot não quer de todo dar-nos a mão pelos seus puzzles, muito pelo contrário. Sinto até, dada a lógica muito fechada de alguns dos puzzles que este jogo não só nos quer dar a mão, como se o tentarmos recebemos um pontapé no abdómen como resposta.
Se olharmos para os grandes jogos do género, até quando a transição para elementos 2.5D ou mesmo 3D foram implementados no canto do cisne das aventuras gráficas da segunda metade dos anos 1990, o que sentimos é que por muito desafiantes que os puzzles desses títulos fossem, assim que descobrimos a resposta, sorríamos.
Rauniot é críptico na sua lógica e no seu humor negro e seco. E mesmo eu sendo um fã destes elementos, sinto que este jogo falhou-me por completo, mesmo na sua curta duração.
Um dos grandes culpados por este desencontro que Rauniot me provocou consigo mesmo foi a estranha decisão dos seus criadores de ilustrarem todas as acções com um FMV que ocupa todo o ecrã com duas grandes barras negras em cima e em baixo e que tornam tudo dolorosamente lento. Clicamos em algo para a nossa protagonista e vemos o lento FMV de plano aproximado dos seus olhos e uma frase do que ela viu. Clicamos numa boneca insuflável e temos um lento FMV de um plano aproximado da cara da boneca. Tudo em Rauniot é tão lento que a incapacidade que temos para poder passar à frente estes monólogos, reflexões e simples interacções com objectos.
Tenho pena que todo o game design e interacção do jogo, com estas decisões estranhas estraguem aquela que é possivelmente uma das aventuras-gráficas com um ambiente negro e depressivo mais bem conseguido que vi em muito tempo. Para muito contribui o voice acting totalmente finlandês, que nos submerge ainda mais nesta história desoladora.
Rauniot acerta quase na perfeição no ambiente, agindo com uma visão ainda mais sépia de Wasteland, mas falha, para mim, nos elementos de aventura gráfica, ao enfadar-nos com os FMVs desnecessários e aborrecidos.