Bem-vindos ao verdadeiro simulador de “Como brotar e gerir uma localidade nos tempos medievais” que combina uma série de mecanismos provenientes de outros videojogos, oferecendo ainda uma mão-cheia de novidades elegantes mas que elevam os níveis de ansiedade. Manor Lords é uma criação do one-man studio de Slavic Magic, com o polaco Grzegorz Styczen a ter concebido uma bela caixinha de surpresas, tendo arrancado o desenvolvimento deste city-builder antes do ano 2020, lançando-o no Patreon a Julho de 2020. Desde então, Manor Lords foi crescendo de dimensão e de expectativa, atingindo as dezenas de milhares de pré-vendas antes do seu early release, o que criou quase um culto em seu redor.
E porquê? Bem, vou falar da minha perspectiva e experiência pessoal, uma vez que a expectativa gerada pelo público em geral (um obrigado ao José Gonçalves pela dica), comentários positivos de investigadores históricos especializados na era Medieval (um agradecimento extra ao Paulo Dias que deu o empurrão final) e vídeos de gameplay, elevou o meu interesse ao máximo possível.
Por isso, começo logo por fazer um aviso: a vossa primeira experiência vai ser confusa. O tutorial de Manor Lords não é o mais claro e preciso, o que vai criar uma lista de dúvidas que só serão resolvidas através de uma experiência pessoal, e, mesmo assim, irão subsistir questões. Para tal, recomendo a procurarem alguns vídeos de “Como se faz X” após terem disponibilizado uma hora ou duas do vosso tempo ao jogo. Isto significa que vão ter, com toda a certeza, recomeçar um novo jogo e refazer tudo o que perderam, mas agora de uma forma mais assertiva.
O factor “realidade” tem um peso enorme, já que a construção de burgage plots – casas – terá de ser desenhada pelo utilizador, e implica isso não serem na sua maioria “contidas” mas alongadas e esticadas, possibilitando ter um quintal e uma zona residencial maior, que quando evoluírem possa ter outro tipo de serviços. Complexo? Sim. Complicado? Só a primeira vez. Depois de perceberem como “brincar” com os desenhos das estruturas, tudo se torna mais fácil.
Este é apenas um pequeno pormenor da vasta jogabilidade, que exige o máximo de atenção ao senhor destas terras. Uma desatenção, ou um minimizar da janela do jogo para actualizar o Twitter e ver emails, pode significar fome, problemas financeiros, doenças, precariedade dos serviços, etc. Manor Lords está assente também num pacing interessante, sentindo-se o ano a passar, não só por causa das estações do ano (cada uma tem as suas variáveis e efeitos próprios), como também do que muda de mês por mês.
A cada novo mês, se a vossa a taxa de aprovação pela população residente fora acima de 50%, irão receber uma nova família, para além de uma ou duas famílias aumentarem de membros, necessitando só de ter uma morada que lhes permita tal crescimento.
E como funcionam as várias indústrias, sejam de matérias primárias, transformação destas em produtos finais ou de aspectos mais básicos como transporte de mercadorias/materiais? Cada uma destas indústrias tem de ter o número mínimo de uma família associada ao posto de trabalho, o que implica dois detalhes: terem em atenção ao crescimento da vossa localização, não desenvolvendo um excessivo número serviços se não têm população suficiente; e capacidade de micromanaging, retirando uma dada família de um posto de trabalho, para a colocarem noutro que tenha necessidade de funcionamento. Como isto pode parecer latim, dou um exemplo. Durante os meses de Agosto a Novembro, eu retiro duas a três famílias de certos trabalhos para as designar como trabalhadores dos campos agrícolas, que vão estar no seu ponto rebuçado na chegada de Setembro. Depois de ter extraído trigo, cevada, algodão, etc, volto a remover uma família, colocando-a em novo serviço, agora no moinho. E por aí fora até terem produzido pão e enviado tal produto para os mercados que vocês próprios desenham, sendo depois distribuído pelas famílias.
A certa altura irão ter de cobrar impostos, e a cada mês receberão um determinado valor (depende de quanto quiserem taxar as vossas terras), com esse elemento a impactar a tal taxa de aprovação. Se a vossa localidade tiver bem guarnecida por serviços, múltiplas opções nutritivas e combustível (lenha ou carvão para manter as casas quentes), então a subida de impostos não será tão mal recebida. Caso contrário… bem, “Addio, adieu, aufwiedersehen, goodbye”, como diria José Cid!
Ora, como visto, Manor Lords é um “bicho” que respira e tem vida própria, estando sempre a desafiar a atenção e inteligência do utilizador, que vai ter de perceber os desafios não só daquele mês, mas o que poderá acontecer no futuro. É um puzzle interactivo que implica um esforço considerável em termos de atenção e capacidade para encontrar soluções, especialmente quando chega o inverno…
E nem falo da parte militar, que é outra longa, muito longa, conversa, já que requer a extração de minérios, conversão destes em placas de metal ou madeira e, por sua vez, enviados para as tais casas alongadas, onde finalmente irão se transformados em armas ou equipamento militar. Mas não entrem em pânico, que em caso de terem cobrado impostos, podem sempre recrutar mercenários para vos ajudar a proteger o território em caso de invasões (neste momento, vocês são sempre alertados de quando se sucederão tais ataques).
Posso recomendar o jogo nesta fase do seu desenvolvimento? Posso e devo. São 40€ mas para quem gosta deste género de videojogo e quer se aventurar na era medieval, é um excelente veículo para vos levar a viajar até uma era que é excessivamente mal tratada – tudo advém do conceito historiográfico de “Dark Ages”, que não significa em idade das trevas em termos da Humanidade, mas sim da quase inexistência de fontes na zona que compreende actualmente o Reino Unido. Apanhei bugs? Apenas um, mas nem sei se posso chamar de erro de computação ou de desenvolvimento, podendo ser até ter algum tipo de propósito.
Importante reter que o jogo está em Early Access, e por isso há uma série de ferramentas, opções e facetas que não estão ainda disponíveis, e que quando forem inseridos, irão beneficiar a experiência ao ponto de podermos considerar Manor Lords um dos melhores city-builders e jogos de estratégia de sempre.
Se quiserem esperar até que Manor Lords esteja totalmente pronto, com todas as suas funcionalidades disponíveis e já comum interface de melhor calibre, então esperem. Porém, devo dizer que se apostarem em jogar agora, não vão ficar desiludidos e irão dedicar horas para tentar descobrir todos os segredos por detrás deste mundo criado pela Slavic Magic.
Antes de terminar, ficam quatro três dicas para vos facilitar a vossa primeira experiência:
– O tal “bug” que mencionava, está impresso logo quando começam um novo mapa, com o workers camp a ser uma espécie de primeira “casa, que vão ter de demolir após construírem os primeiros burgage plots, de modo a que os aldeões se mudem para uma morada fixa;
– Primeiras três estruturas, a par das casas e poço de água, a colocar, são: logging camp (para o abate de árvores que são depois usados para construção); hunter’s camp (caça de animais selvagens); e traders post (central de comércio). Este último é importante para financiar as tais obras nas casas alongadas, pois para construir um campo agrado habitacional ou um galinheiro, custa entre 15 a 25 pratas;
– No hunter’s camp, baixem o número de carcaças que podem caçar para as ‘5’, de modo a terem sempre os vossos mercados recheados e assim a população satisfeita;
– Construam apenas um edifício de cada indústria. Não vale a pena criarem cópias de cópias, quando o vosso número de famílias é reduzido.