Fui tão influenciado pelos jogos point ‘n click que na fase em que a indústria (motivada pela tecnologia) abraçou a tridimensionalidade e com ela muitos géneros tiveram de ser repensados, acabei por me re-apaixonar pela reinterpretação do género do qual Myst, dos irmãos Rand e Robyn Miller, foi a figura de proa.
É claro que nesta fase, especialmente com a introdução de subgéneros como as que apelidamos como filmes interactivos, acabámos por jogar jogos terríveis e que foram servindo como pregos no caixão de um género tão interessante. E sabemos também, a jusante da História, que seria esse período que serviria de declínio do género até à sua ressurreição com os jogos indie.
Como referi, Riven, lançado originalmente em 1997 pela Cyan, é uma dos ex-libris dos jogos de aventura point ‘n click tridimensionais, parte integrante de uma série conhecida pela sua narrativa imersiva e pelos complexos quebra-cabeças. Como sequela do aclamado Myst, Riven trouxe-nos uma experiência visualmente deslumbrante para a época, mesclando a utilização com bom gosto de full-motion videos, filmagem e sobre-imposição de actores e deambulação por ecrãs estáticos para criar um mundo detalhado sem sobrecarregar os limitados recursos dos computadores da época. Agora, quase três décadas depois, a Cyan trouxe Riven de volta à vida com um remake completo em 3D, quiçá, a corresponder à visão original dos seus autores mas onde a tecnologia de então permitia alcançar.
Para mim, e acredito que para muitos fãs desta série da Cyan, o apelo do Riven original residia na utilização de imagens pré-renderizadas e actores reais para representar o limitado elenco que coabitava estes espaços virtuais e misteriosos. Era essa combinação que dava a estes jogos uma sensação tangível e realista, apesar das limitações tecnológicas da época, e que se apresentavam como obras mais interessantes dos que os “meros” (e muitas vezes risíveis) filmes interactivos que tentavam capitalizar do sucesso do género.
Por outro lado, a transição de cena para cena, em ecrãs estáticos, acrescentava uma certa mística ao jogo, forçando-nos a observarmos cada detalhe da imagem com cuidado, e onde o pixel hunting assumia uma necessidade ainda mais gritante.
No entanto, o remake de 2024 abandona esses elementos em favor de um mundo completamente tridimensional com deambulação livre na primeira pessoa. Embora esta actualização (ou modernização, diriam alguns) traga uma liberdade de movimento e uma imersão distintas, há uma perda perceptível – para mim – da estética única que caracterizava o original e um dos seus maiores apelos. A tentativa de representar pessoas com foto-realismo (e falhando no processo) não captura a mesma autenticidade dos actores reais dos anos 1990, ainda que os diálogos originais tenham sido justapostos com os novos modelos 3D.
Riven sempre foi um jogo que incitava a nossa paciência e observação: somos lançados numa ilha misteriosa sem orientação, forçados a explorar a estranha arquitectura e descobrirmos o nosso propósito através de pistas subtis e pelos próprios quebra-cabeças. Agora com molvimentação livre tridimensional, esse elemento de descoberta pessoal e ritmo próprio é mantido no remake, mas sem as constrições dos ecrãs estáticos.
Apesar disso, a falta de modernizações em termos de elementos de quality of life implementados no género (em títulos 2D e 3D na última década) vai certamente afastar novos jogadores, e a ausência de dicas e sistemas de ajuda simples, como a iluminação opcional de elementos interactivos leva a que Riven pareça inflexível quando comparado com o cenário moderno. Ainda que não haja forma de perder no jogo, o que nos permite que avancemos ao nosso próprio ritmo, no entanto o mindset dos anos 1990 apode ser frustrante para todos aqueles que estão acostumados com as conveniências mecânicas e de interface modernas.
Os puzzles de Riven ficaram conhecidos pela sua complexidade e engenho, e neste remake muitos desses desafios foram refeitos, mantendo a essência do original mas modernizados e actualizados, em coesão com a nova tridimensionalidade do jogo que não existia no original.
O remake de Riven é, sem dúvida, uma obra de amor da Cyan, que nos leva a revisitar um clássico que definiu o género, e o nosso crescimento enquanto jogadores. Para os veteranos que conheceram a série original, é uma viagem no tempo, uma oportunidade de reviver memórias e enfrentar novamente alguns puzzles e uma narrativa que marcaram a História dos jogos. No entanto, para novos jogadores, a falta de modernizações significativas pode fazer com que o jogo pareça datado e menos acessível.
Mas há algo que se mantém desde 1997: Riven, em todas as suas formas, é mais do que um jogo – é um ambiente para ser explorado e compreendido, um convite para uma aventura lenta e contemplativa.