É sabido que a Stonemaier Games tem coleccionado sucessos ao longo dos últimos anos, que se tornou uma das mais importantes editoras e conseguiu o feito notável de tornar o seu nome sinónimo de qualidade. Do ponto de vista comercial e crítico um dos seus maiores sucessos é mesmo Wingspan, desenhado pela game designer Elizabeth Hargrave, que não só é mundialmente considerado um dos melhores jogos de sempre, como até aqui na capoeira – ora não estivéssemos a falar de aves – está nas preferências do Pedro Nunes e nas minhas.

Quando Wyrmspan foi anunciado temi que Jamey Stegmeier estivesse a contrariar o que conheço dele – e que até pode ser ouvido nesta entrevista em podcast – e tivesse decidido enveredar por um caminho simples de cash grab. Mas depois de diversas partidas de Wyrmspan, é fácil de perceber que este jogo alicerça-se no sucesso de Wingspan, mas leva a jogabilidade para um campo e para um público diferentes. 

Wyrmspan mantém o espírito do seu antecessor espiritual e é dirigido a fãs de engine building games um pouco mais complexos que Wingspan, assim como para queles que entraram no género graças a ele. Concebido por Connie Vogelmann, este jogo substitui os pássaros graciosos e brilhantemente ilustrados de Wingspan por dragões majestosos e diversificados, levando-o temática para um ambiente de fantasia distinto do jogo original. 

Embora Wyrmspan compartilhe muitas das mecânicas centrais de Wingspan, Vogelmann introduziu novos elementos mecânicos que alteram a dinâmica do jogo e o tornam numa experiência mais complexa. O jogo mantém a ideia base de “coleccionar” criaturas, mas neste caso trocando aves por dragões — e utilizar recursos para alimentá-los e ao mesmo tempo engrenar o nosso motor. 

Todos aqueles que como eu já estejam habituados ao loop de Wingspan vão aqui encontrar algumas diferenças mecânicas, como a adição do tabuleiro suplementar da Dragon Guild e a necessidade de escavar cavernas para abrigar os dragões.

Este tabuleiro suplementar é partilhado por todos os jogadores e leva-nos a avançar de forma circular, num progresso que não só permite que recolhamos recursos valiosos, dotando-nos de mais uma camada de opções estratégicas. Da primeira vez que joguei – e dada a sua inexistência no jogo que conhecia melhor, Wingspan – acabei por menosprezá-lo o que rapidamente contribuiu para o meu último lugar na partida. A subtileza deste elemento partilhado, em especial os recursos que vamos ganhando em cada “passo” é algo que influencia a construção e eficácia do nosso motor.

A outra grande diferença neste jogo em comparação com Wingspan é que antes de podermos adicionar dragões à nossa colecção, temos de escavar a montanha e abrir cavernas para os podermos receber, o que adiciona uma camada adicional ao processo de construção de motor. Esse passo extra pode parecer desnecessário para quem se habituou meramente a instalar aves em ninhos no jogo de Hargrave, mas obriga-nos a pensar ainda mais e com menos margem de erro na sequência das nossas acções.

Os recursos alimentares e os ovos regressam também em Wyrmspan, mas agora são complementados por algo novo: as moedas de dragão. Estas moedas são o elemento que nos permite realizar acções, “pagando-as”, mas também têm outra utilização: serem gastas para adquirir dragões mais poderosos. 

Ao contrário de Wingspan, onde o número de ações por ronda diminui à medida que o jogo avança, em Wyrmspan as ações podem (e devem) expandir-se à medida que o jogo avança. Há diversas maneiras de obtermos mais moedas de dragão, contribuindo para uma experiência de jogo mais complexa, onde a gestão eficiente destas moedas é ainda mais essencial, já que são sinónimo de acções e também de pagamento de criaturas extremamente poderosas para o engine building.

Como é fácil de perceber, apesar de não sentir que Wyrmspan seja um jogo difícil per se, este destaca-se por ser uma proposta mais complexa e ligeiramente menos acessível do que Wingspan. As novas mecânicas e a menor dependência da aleatoriedade fazem com que este jogo seja mais adequado para jogadores experientes que procuram um desafio maior, e onde o tema da fantasia com dragões também pode atrair um público diferente, talvez mais inclinado a jogos com temáticas mais épica e profunda.

Wyrmspan é uma reinterpretação ambiciosa e, para mim, bem-sucedida de Wingspan, conseguindo preservar o espírito do original enquanto adiciona novas camadas de profundidade estratégica e complexidade. Embora possa não ser tão acessível para jogadores casuais, oferece-nos uma experiência mais envolvente para todos aqueles que procuram um engine building game ainda mais estratégico que Wingspan. E, respondendo à pergunta que eu próprio me coloquei quando o jogo foi anunciado: Wyrmspan e Wingspan são semelhantes e distintos o suficiente para que possam coexistir nas nossas prateleiras sem que canibalizem a nossa atenção: partindo de um mesmo pressuposto, conseguem na realidade bifurcar em duas experiências perfeitamente distintas.