Depois de uma viragem de década, a da segunda do milénio, em que os tower defense games eram reis e senhores da crescente vaga de criadores e criações independentes que surgiam no mercado, o género acabaria por entrar no ciclo de muitos outros que lhes antecederam e procederam: completa saturação e desaparecimento. Mas algo aconteceu este ano, mais especificamente este Verão, onde em catadupa chegaram à minha caixa de email uma vaga de novos jogos, novas propostas, sobre os quais irei dedicar esta semana. Um timing perfeito, diria, até porque o meu filho mais novo está a descobrir o género e tenho podido partilhar estas experiências videolúdicas.
No Creeps Were Harmed TD, do estúdio MiniMax Games Ltd. é o primeiro desta sequência.
Joguei dezenas (quiçá duas centenas de jogos do género), mas é fácil sentir que No Creeps Were Harmed TD não trazer uma abordagem ao género, mas segue uma linha de pensamento de outros jogos clássicos. A grande maioria dos TDs da última década têm um estilo muito definido e seguem uma fórmula relativamente rígida: temos sempre posições fixas e limitadas para construir torres e rotas pré-determinadas para os inimigos. No Creeps Were Harmed TD regressa às origens do género e a Desktop Tower Defense ao permitir-nos uma experiência mais dinâmica na colocação das nossas defesas.
Para os versados no género já é fácil identificar que uma das características mais marcantes de No Creeps Were Harmed TD é a liberdade que o jogo nos oferece na definição espacial do campo de batalha. Em vez de pontos fixos para construirmos as torres, temos uma fundação em forma de quadrícula, que nos permite posicionar as torres de maneira a criar um verdadeiro labirinto para os inimigos. Esta estrutura semi-aberta e a forma como posicionamos as nossas definem as rotas que os inimigos percorrerão, com uma liberdade total com apenas uma regra: temos de permitir sempre um caminho existente do ponto de spawn dos inimigos até à nossa base. Os ziguezagues que os inimigos têm de percorrer são um elemento específico da nossa definição estratégica.
Essa abordagem lembra também clássicos como GemCraft, onde o desafio vai muito além de simplesmente construir torres poderosas: é preciso também considerar a estratégia por trás do posicionamento e do direccionamento dos “corredores” de deambulação dos inimigos. Podemos encarar cada nível como um quebra-cabeças, com a diferença que aqui temos múltiplas soluções possíveis, incentivando-nos a experimentar diferentes estratégias até encontrarmos a mais eficiente num jogo que é extremamente difícil, muito graças à velocidade e intensidade com que as vagas se movem pelos níveis.
Um elemento diferenciador de No Creeps Were Harmed TD é a presença de Brian Jar, um drone que podemos controlar directamente, e que não só é responsável por construir novas torres, mas também desempenha várias outras funções no campo de batalha: disparando contra os inimigos, reparando torres danificadas e aplicando efeitos de área. Visto que um dos elementos inter-níveis que temos disponível é a possibilidade de melhorar Brian Jar, recebemos aqui mais um elemento diversificador para a nossa estratégia.
Com uma direcção de arte enganadoramente simples mas brilhantemente executada, o que sentimos também é que para além da liberdade de criação do “labirinto”, No Creeps Were Harmed TD também se destaca pela sua verticalidade e tridimensionalidade. As estruturas que temos de defender não são simples caminhos lineares, mas sim edificações complexas com diferentes níveis e camadas, com diversas faces que temos de rodar no espaço para as compreender por inteiro. É este elemento tridimensional da estrutura no espaço que nos dá ainda mais profundidade, adicionando mais uma dimensão à estratégia, obrigando-nos a considerar não apenas o posicionamento horizontal das torres, mas também como estas se relacionam em diferentes alturas e ângulos.
No Creeps Were Harmed TD não se limita à experiência solo, trazendo-nos também um modo cooperativo onde podemos unir esforços com amigos ou outros jogadores online para enfrentar desafios ainda mais complexos.
A diversidade de inimigos foi também algo que me surpreendeu: com uma variedade impressionante de oponentes, cada um com mutações que alteram seu comportamento ao longo do níveis. Estas mutações podem modificar a velocidade, resistência, ou até mesmo a forma como os inimigos interagem com as defesas, obrigando-nos a adaptar a monstros com teleporte ou outros que simplesmente explodem junto às nossas torres, destruindo-as.
No Creeps Were Harmed TD é uma grande surpresa para um género ao qual eu ainda regresso com muita frequência, e que se mostrou profundamente complexo e detalhado em oposição à ideia errónea, ao primeiro impacto, de alguma simplicidade. É curioso que um dos mais coesos jogos do género quen joguei no passado recente é aquele que vai às fundações do género e nos devolve o desafio e a estratégia semi-aberta, repensando-a para o mercado actual.