Apesar dos metroidvanias serem um dos meus géneros favoritos, e um daqueles ao qual eu tento jogar tudo o que sai, da experiência mais desconhecida, até ao recente regresso de alguns projectos de empresas AAA, estaria a mentir se dissesse que Narcalid será um dos que mais gostei de jogar nos últimos anos. Mas isso não lhe retira algo: quase tudo o que este jogo recém-chegado em Early Access ao Steam se propõe a fazer é verdadeiramente único quando comparado com o resto do mercado. 

Desenvolvido pelo estúdio Lotus Mountain Creative, Narcalid é uma abordagem inédita no mundo dos metroidvania, com uma visão original e com uma mensagem subjacente que pode ter impacto real nas nossas vidas. É-nos mecanicamente difícil não ver a similaridade com clássicos como The Lost Vikings, onde os personagens têm todos habilidades únicas, mas também na forma como combina mecânicas de exploração, resolução de puzzles e cooperação

Como percebemos logo que acordamos de hibernação neste mundo, uma das principais características de Narcalid é a possibilidade de controlarmos quatro personagens, cada um com habilidades únicas, necessários de interligar para a resolução dos desafios de cada segmento. Assim como em Lost Vikings, a sinergia entre o elenco é essencial para progredir no jogo, pois cada habilidade deve ser utilizada de forma interligada e coesa: cada membro da nossa equipa tem uma classe própria, com habilidades associadas à sua especialização.

Se há algo que faz Narcalid destacar-se no género metroidvania é a possibilidade de multiplayer cooperativo de até quatro jogadores, podendo juntar-se numa sessão local, em modo split-screen. Esta opção não é apenas um bónus da equipa da Lotus Mountain Creative, mas uma parte central do design do jogo, incentivando o trabalho em equipa e a coordenação. 

Outro elemento que o distingue da maioria dos metroidvanias, é que Narcalid se distancia do combate como principal forma de progressão, focando-se na resolução de puzzles e na utilização criativa das habilidades dos personagens para resolver conflitos de forma pacífica. Esta ênfase em evitar a violência, enquanto se superam obstáculos e se encontram soluções criativas, reflete uma filosofia de crescimento pessoal promovida conceptual e narrativamente pelo jogo.

Essa filosofia é aplicada de forma fascinante em Narcalid através da maneira como a meditação está integrada nas mecânicas do jogo, não se tratando apenas de um tema tangencial, mas de algo que realmente influencia a jogabilidade. À medida que avançamos na historia são-nos apresentadas mecânicas que nos incentivam a practicar a meditação e a aplicar princípios de atenção plena para resolver certos puzzles. O jogo ensina-nos, de forma subtil, técnicas de meditação, ajudando-nos a criar um ambiente mais contemplativo e relaxante. Se algum dia esperaria ser um metroidvania a pôr-me a meditar na vida real? Não. Mas é por isso é que temos dedicado os últimos 14 anos a descobrir pérolas como esta.

Essa fusão entre os desafios lógicos e o exercício mental faz com que não tentemos apenas resolver problemas, mas também que pratiquemos habilidades de relaxamento que podem ser úteis fora do jogo. E na fase de ansiedade em que ando, nem imaginam o quanto precisava disto.

Com estas camadas de contemplação, é seguro assumir que Narcalid não é apenas mais um metroidvania. Seja pela sua abordagem pacifista, pela possibilidade cooperação em Rui Parreira (ah, uma chalaça no meio de um artigo mais sério) e a integração de prácticas de meditação na definição do seu game design, Narcalid oferece-nos uma experiência singular. O estúdio Lotus Mountain Creative traz algo verdadeiramente inovador para o género, um jogo que nos desafia não apenas com a sua complexidade de puzzles, mas também com a proposta de reflexão e relaxamento que extravasa os limites do ecrã, para a vida real.