Sabendo que uma das limitações da nossa mortalidade é a incapacidade de aprendermos tudo aquilo que desejaríamos, tenho sempre um certo amargo de boca de não ter tido a programação como ferramenta na minha formação. Atribuiria a culpa disto, se me permitirem, a sentir que fiquei entre gerações: as que são mais velhos e que graças aos microcomputadores aprenderam a programar por necessidade e engenho, e aos bastante mais novos que lentamente tiveram essa ferramenta inserida nos currículos escolares.
É claro que a minha incapacidade para programar poderia ser facilmente resolvida, ora veja-se o caso do fundador desta casa que aos 48 anos decidiu mudar de vida por completo e foi aprender programação. No meu caso, apesar da boa vontade, com o muito que tenho dedicado de aprendizagem – sobretudo línguas – já fiz as pazes comigo mesmo ao reconhecer que não vou aprender programação.
Um fenómeno interessante a que tenho assistido nos últimos anos é o de videojogos e até jogos de tabuleiro que têm inserido a programação (e a sua aprendizagem) como elemento mecânico dos próprios jogos. Já alguns me passaram pelas mãos, mas uma proposta de unir este elemento pedagógico com um The Legend of Zelda tradicional foi o suficiente para me chamar a atenção.
Desenvolvido pelo estúdio Didactoons e publicado pela Artax Games, Glitch Hero é uma aventura clássica com foco em puzzles e uma forte abordagem educativa, prometendo-nos uma interessante exploração de masmorras e um mundo recheado de desafios que põem em acção o nosso raciocínio.
À primeira vista, Glitch Hero é um prato cheio para jogadores, como eu, fãs de jogos como The Legend of Zelda. O level design das dungeons e o estilo de exploração evocam comparações inevitáveis e imediatas com a emblemática série da Nintendo, com cada dungeon a exigir atenção e lógica, mantendo-nos desafiados através de quebra-cabeças criativos e progressivamente mais difíceis.
Nesta peça indie de edutainment a aprendizagem básica de programação é feita através dos referidos puzzles. Neles temos de “ordenar” a nossa protagonista, Ada, a resolvê-los através da execução de ordens, qual código de programação. A dificuldade destes quebra-cabeças é que temos “peças de código” limitadas, e portanto temos de executá-lo na perfeição para que a função programada tenha sucesso.
Cedo aprendemos a capacidade de repetir estas funções ou atribuir-lhes condições (como as habituais “if then”) o que permite uma interessante abordagem mecânica, e sobretudo um bom elemento de aprendizagem aos mais novos que dão os primeiros passos na programação.
Por outro lado, as similaridades com The Legend of Zelda acabam sendo uma faca de dois gumes (ou dois legumes, como diz o outro). Enquanto que os puzzles têm o interesse do desafio e da pedagogia, o combate é bastante insípido, com o principal problema a residir na lentidão e na falta de fluidez dos ataques. Acções como golpes “leves” parecem arrastadas, retirando parte da emoção que o combate deveria proporcionar. Esse problema é ainda mais evidente em batalhas contra bosses, onde o ritmo truncado e compassado torna estes confrontos frustrantes, ao invés de épicos.
Glitch Hero é uma aventura peculiar que combina puzzles desafiantes e uma proposta pedagógica salutar, no entanto, ao tentar seguir os passos de jogos como The Legend of Zelda, tropeça em si mesma por culpa de um combate mal-executado. Um jogo interessante para os mais novos, mas se estes nunca contactaram com um jogo de Zelda, porque rapidamente lembrar-se-ão do que é um bom jogo do género em termos de combate.