O que mais me surpreendeu em Donkey Kong Country Returns HD não foi o jogo em si – esse continua excelente. O que me surpreendeu foi uma escolha que tive de fazer.

Quando um jogo deste tipo é relançado várias vezes (primeiro na 3DS, agora na Switch), é sinal de insegurança por parte de quem o publica – neste caso, a Nintendo. Mas talvez este seja finalmente o momento do grande símio da casa de Quioto. Com vários títulos a chegarem ao serviço Nintendo Switch Online, a série tem agora hipóteses reais de alcançar uma nova audiência – a maior que a Nintendo alguma vez teve, estando prestes a pisar os calcanhares da PlayStation 2 em vendas. E isso tem a sua ironia: os jogos Donkey Kong são tão bons que custa acreditar na sua fraca performance comercial ao longo das décadas. Felizmente, temos já a confirmação de um novo título para a sucessora da Switch, ainda este ano.

“Como assim? O jogo está mais fácil?!”

Quanto à pergunta que os jogadores fazem sempre que clicam numa análise – “Vale a pena?” – a resposta é simples. Sim. Apesar de poder tornar a minha análise (que será publicada em breve) redundante para alguns (e de defender que uma análise é mais do que um veredicto qualitativo), recomendo este jogo. Dado o atraso na publicação deste texto, é provável que até já o tenham comprado. Se assim for, a Nintendo terá finalmente uma resposta clara quanto ao futuro do seu gorila – que, ao que tudo indica, passará por Donkey Kong Bananza.

Os jogos Donkey Kong têm um encanto muito próprio. Pensem num fã de Dark Souls – alguém que gosta da dor, do erro, da frustração criativa. Agora troquem espadas por plataformas, bosses por barris, e a morte por um buraco sem fundo. É isso. O prazer está na dificuldade. Na exigência. No detalhe.

Aparentemente, a Nintendo discorda. Acredita que o jogador moderno não quer frustração. Quer gratificação instantânea. E por isso criou o Modern Mode: três corações em vez de dois, nove itens por nível, ferramentas que indicam os segredos do jogo, itens que te salvam de quedas, e até protecções automáticas para as fases dos carris e foguetes. E o mais bizarro: uma vez escolhido, não podem voltar ao modo original.

O Modern Mode é tudo menos moderno. É uma almofada. Um seguro contra a frustração. Uma versão suavizada e pasteurizada de um jogo que nunca pediu desculpa por ser difícil. Esta dificuldade não era gratuita – era o núcleo. Era o que dava ao jogo a sua personalidade. Ao aliviar essa tensão, perde-se o sabor da conquista.

Não me oponho a modos acessíveis – desde que sejam pensados com intenção. O problema aqui é outro: é assumir que Donkey Kong precisa de ser domesticado para agradar. Como se a dificuldade fosse um erro de design. Como se a exigência fosse algo a corrigir. Não é.

Este modo é um produto do medo. Medo de desagradar. Medo de que o jogador desligue a consola. E, por isso, opta-se pela massagem em vez do desafio. Mas se tudo é confortável, nada é memorável. E Donkey Kong, com os seus ritmos tribais, obstáculos cronometrados ao milímetro e níveis que exigem atenção quase zen, merece ser lembrado – não diluído.

Em vez de preservar o carácter singular de Donkey Kong Country Returns, a Nintendo optou por anestesiá-lo. Não para o reinventar, mas para o tornar mais palatável a um público que, supostamente, já não tem tempo, paciência ou vontade de ser desafiado. Mas um jogo como este não precisa de concessões – precisa de ser jogado como foi concebido: com suor, frustração e, no final, aquela euforia rara que só vem quando superamos algo que parecia impossível.

O Modern Mode é sintoma de uma indústria que começa a esquecer que os videojogos também são feitos de resistência, de erro, de repetição. E que há uma alegria imensa associada a isso tudo.