Repensar géneros não é tarefa fácil. Repensar géneros que têm menos de meia dúzia de anos diria que é uma tarefa ainda mais complicada. Mas foi a isso que se comprometeu o estúdio TrampolineTales, cujo jogo de estreia, Luck be a Landlord, se tornou um verdadeiro e inesperado sucesso de vendas.
Neste segundo jogo, Maze Mice, encarnamos um rato em busca de sobrevivência num mundo dominado por gatos de todas as formas e feitios, o que inclui felinos fantasma, e esta salada é o contexto para se repensar os bullet heaven. À primeira vista o objectivo é simples: sobreviver nestes labirintos ao estilo de Pac-Man. Mas por trás dessa simplicidade, esconde-se um jogo de estratégia, coordenação e, acima de tudo, astúcia, bastante original.
À semelhança de Vampire Survivors, Maze Mice leva-nos por uma jogabilidade semi-automática: os ataques disparam sozinhos, e cabe-nos a tensa missão de movimentar o rato protagonista através de hordas inimigas. No entanto, o estúdio TrampolineTales introduz aqui duas dinâmica próprias: o ambiente labiríntico e a passagem do tempo.
Ao invés das vastas (e por vezes infinitas) áreas abertas que o género nos costuma trazer, temos os combates a desenrolarem-se em corredores apertados, onde o posicionamento e a leitura do mapa são tão importantes como o poder de fogo. E onde os anos de experiência de estar sempre em movimento por labirintos similares que Pac-Man nos deu entra aqui em acção.
Como em qualquer bom roguelike, Maze Mice recompensa o progresso com upgrades que por vezes roçam o absurdo. Vemos ratos aparentemente indefesos perante os seus inimigos felinos naturais transformados em verdadeiras máquinas de combate, com disparos eléctricos em cadeia, campos magnéticos de defesa ou enxames de mini-ratinhos suicidas que explodem ao contacto com os inimigos é um twist curioso ao género.
Cada run é diferente pelas builds que podemos ter, e que podem ser ou devastadoras ou caóticas, dada a variedade de itens, sinergias e ratos jogáveis que temos. Só é pena, pelo menos pelo que atingi nesta fase de Early Access, que só tenhamos um labirinto disponível.
Maze Mice tem uma abordagem retro, com a utilização de pixel art a resultar em sprites coloridos e em animações expressivas. Surpreende-nos que os ratos tenham personalidade, e o mundo à sua volta, apesar de limitado a apenas um labirinto estático, seja enriquecido graças à variedade e à quantidade de inimigos.
Agrada-me que o jogo não se leve demasiado a sério: as descrições dos itens, os inimigos caricatos (ou carigatos?) (como gatos-ciborgue ou aspiradores assassinos) e os eventos aleatórios garantem constantes momentos de desafio, mesmo quando estamos prestes a morrer pela vigésima vez.
Outro elemento interessante de Maze Mice e que o diferencia de outros jogos do género, é a inspiração em dungeon crawlers (e também em Superhot), onde o tempo só avança se nos movermos. Se pararmos de mover o nosso ratito, todos os inimigos param também, demonstrando que este jogo não acontecem tempo real, mas antes num sistema de turnos simultâneos que passam despercebidos até pararmos de nos mover.
Esta é uma diferença diametral para os restantes bullet heaven, já que estes se apoiam no frenetismo de um tempo e de um movimento que não param, mas Maze Mice quis ir mais longe.
Maze Mice é mais do que uma simples tentativa de beber do sucesso de Vampire Survivors: é uma variação engenhosa, que pega na fórmula básica do género e muda os seus pontos essenciais. No lugar do espaço aberto temos um labirinto claustrofóbico, e o frenetismo do tempo que não pára deu espaço a um jogo onde os inimigos só se movem quando nos mexemos. Preocupa-me a repetição do espaço, e do singelo labirinto, mas acredito que existam aqui elementos para variar o sabor habitual dos bullet heaven.