À terceira é que é de vez

Para mim o momento mais marcante em Gears of War 3 (GoW3) é passado numa metrópole devastada por um engenho nuclear.
É impossível ficar indiferente ao ambiente pós-apocalítico de Char, no 4º acto da campanha singleplayer (Ashes to Ashes).
As estátuas de cinza, a arquitectura destroçada, retorcida e empoeirada daquela que foi em tempos uma moderna cidade, são uma das melhores ilustrações deste tipo de cenário que tenho memória enquanto adepto de videojogos.

E isto é dizer muito, tendo a conta a enormidade de jogos que se baseiam neste imaginário.

Há um misto de desolação e encantamento ao olharmos as figuras humanas carbonizadas. Marcus Fenix, o líder do nosso esquadrão e protagonista da série Gears chega a suspirar “This is a mass grave people. Let’s show what respect we can.”

Mas nada disto é novo, poderão retorquir. E de facto não é.
Nem isso nem o resto dos mapas, das mecânicas, da narrativa e de tudo o que compõe este GoW3.

E, no entanto, ao acabarmos de jogar a avalanche de modos de jogo presentes na mais recente oferta desta série da Epic, nada disso parece importar. Tudo está tão bem feito que sucumbimos à ‘força bruta’ desta obra prima de jogabilidade em estilo shooter. Passe a óbvia literalidade da expressão.

Há aqui pormenores que revelam a evolução de toda a mestria técnica obtida pela equipa em títulos anteriores. E só esse facto lança um sério desafio para o futuro da concorrência.
Simplesmente não parece possível pedir mais deste Unreal Engine e os developers de GoW3 parecem querer lembrar-nos disso a cada esquina que cruzamos.

Pode dizer-se muita coisa acerca destes invasores mas certamente nada em relação aos seus processos digestivos. Tudo marcha, até navios de guerrra.

Concentremo-nos no essencial.

A saga de Gears of War foi lançada em 2006 e desde então tem marcado a comunidade de videojogos com o seu estilo visual carismático e vagamente inspirado num ‘Conan, o Bárbaro’ em versão sci-fi militarista.

Muito humor negro, piadas de caserna e uma franca tentativa de caracterizar a camaradagem e, ao mesmo tempo, o desespero inerente a este grupo de heróis.

Claro que a narrativa nunca sai propriamente deste registo série ‘B’ mas, por outro lado, o facto do esquadrão a que fazemos parte ter perfeita noção que é o último bastião contra a invasão alienígena dos Locust e Lambent (um nome que não resulta muito bem em português) confere a coerência necessária para dar vida a este mundo de perda, destruição e guerra constante.

Nesta última encarnação, talvez por, supostamente, se tratar do canto do cisne da série, tudo cresceu em relação aos títulos anteriores. Há mais modos de jogo, mais opções multiplayer, mais bosses de tamanhos absurdos, mais e melhores armas e, em termos relativos, a jogabilidade é de um polimento exemplar.

No modo campanha a acção decorre durante um período particularmente difícil para os combatentes da Coalition of Ordered Governments (COG).
Tendo derrotado a horda dos Locust do segundo jogo a humanidade vê-se agora a braços com uma nova investida.
Uma surpresa avassaladora, eu sei.

Dom 'Ti Manel' Santiago e a sua horta de produtos biológicos.

O inimigo não são apenas os ex-derrotados Locust mas também os tais Lambent, que referi anteriormente – Uma raça alienígena de depósitos de combustível ambulantes que partilham o péssimo hábito de explodir quando algo não lhes corre de feição.

Como é óbvio a missão de sobrevivência da raça humana fica ainda mais ameaçada.
A este punhado de homens e mulheres (agora temos acesso a personagens femininas) que constitui a única alternativa credível de defesa à invasão, resta apenas o refúgio num vaso de guerra que vagueia em alto mar.

A partir daqui e durante os cerca de 5 actos e 30 capítulos em que decorre a história principal temos direito a cenários bastante diversificados (embora com uma palette de cores ligeiramente amarelada)

A duração deste modo de jogo principal tem um tempo aproximado de conclusão de 13 horas.
Estas podem aumentar ou diminuir consoante o nível de dificuldade e o facto de a abordarem a sós ou na companhia de, no máximo, mais três amigos.

E não se iludam. Se há jogo da Xbox 360 de que tenho memória de verdadeiramente clamar pela presença de mais alguém é este GoW3.

Não por haver algo de errado em jogá-lo a solo. Foi aliás o que fiz da primeira vez que o joguei. Mas depois, para completar a minha opinião sobre os outros modos de jogo, convidei os meus parceiros aqui do Rubber e, sinceramente, é uma experiência muito mais divertida.

O equilíbrio ao nível de dificuldade, introduzido para compensar o facto de jogarmos com mais parceiros, é eficaz e garante que a qualidade da campanha não perde pelo facto de estarmos em modo co-op.

As referências a outros media e os pormenores (sempre os pormenores…) são do mais alto nível. Um dos meus preferidos são as caixas de munições inalcançáveis. Um mecanismo tão simples e tão eficaz na produção de uma gargalhada sincera.

Depois, ainda para quem quer jogar acompanhado, temos o retorno do modo Horde, lançado na parte II desta série.

O conceito é simples, somos até 5 humanos e tentamos resistir o máximo de tempo possível ao avanço das hordas sucessivas de Locust. Mas agora, na versão 2.0, podemos usar créditos ganhos em batalha para construir defesas que nos ajudam a conter as vagas inimigas. Há barreiras de picos, peças de artilharia, bonecos de contraplacado (que por alguma razão que desconheço servem na perfeição para enganar aliens) e, como não podia deixar de ser, munições para serem compradas no pouco tempo que temos para nos preparar até sermos novamente invadidos.

Podem e devem jogar acompanhados, embora eu tenha experimentado das duas formas e devo dizer-lhes que até não me saí muito mal sozinho até à 4ª ou 5ª vaga.
Depois, bem… depois é o caos!

Beast é outra maravilha de gozo e perversão. Imaginem ter acesso às personagens dos vossos Locust preferidos (que são desbloqueados por créditos que vamos ganhando) e terem um tempo limite para matarem o máximo de humanos que conseguirem.

Louvável esta tentativa de descendentes transmontanos. Mesmo debaixo de fogo eles lutam por manter viva a tradiçãos dos Pauliteiros de Miranda.

Não vou sequer revelar muito mais porque é um clássico instantâneo que merece ser desfrutado sem qualquer tipo de spoiler.

Mais conservadores mas igualmente divertidos são os modos de Arcade (a campanha singleplayer com pequenas alterações que potenciam o nosso score), Versus, que incluí mais mapas e modos de jogo do que me lembro em outro shooter do género e Team DeathMatch que me pareceu perfeito ao nível de jogabilidade tanto a solo, com oponentes gerados por computador, como online onde mapas do calibre de Bullet Marsh (um download gratuito do Xbox Marketplace) mostram-nos o porquê da longevidade deste título.

Em termos mais negativos pode dizer-se que existe algum desgaste no universo de Gears of War. O mundo de Sera chegou, provavelmente, ao fim da sua validade enquanto cenário de jogo.
Se terminarem agora este IP podemos dizer que será a atitude certa para fechar um ciclo em beleza.

É inegável a potência que se tornou Gears of War no mundo dos videojogos.
Três títulos de luxo que elevam a arte de um bom shooter até onde ele pode ir.

A evolução em praticamente todos os aspectos (com a possível excepção da narrativa) não deixa margem de dúvida para afirmar que GoW3 é possivelmente o melhor jogo do género no vasto catálogo da Xbox 360.
A não perder por ninguém que goste de um bom jogo de acção a solo mas, acima de tudo, indispensável para todos os que gostam de jogar online.
Acredito que daqui a 3 ou 4 anos ainda haverá quem o jogue na rede.

(Exclusivo Xbox 360)