
Filósofos, pensadores, eternos curiosos, pessoas em desespero, todos se interrogam sobre qual o sentido da vida, desde a antiguidade aos tempos modernos. Nós vamos responder a essa pergunta, mas primeiro importa relembrar algumas das conclusões às quais alguns tentaram em vão, ou talvez não, responder à problemática mais interessante da Humanidade.
Platão afirmava que o sentido da vida era “obter a mais alta forma de conhecimento, a ideia do bom a partir da qual todas as boas coisas e justas geram utilidade e valor”. André Ventura devia ler Platão. Mas assim como as quezílias dentro do Chega, a rapaziada da Grécia também andava sempre em discórdia. Aristóteles, os Cínicos, os Epicuristas, e os Estóicos começaram logo a discordar e Platão deve ter decidido criar as suas Odisseias literárias para não aturar esta gente. Não aturar gente também deve ser uma pista para a resposta.
Avançamos uns milénios e os “ismos” tomam contam da propriedade da razão, sempre em discórdia para variar: o liberalismo, utilitarismo, pragmatismo, existencialismo, absurdismo (adoro este), enquanto a política entra em acção com o comunismo, socialismo e capitalismo.
A religião também se meteu ao barulho mas nisso todas concordam com a mesma coisa: faz o que Deus mandou, caladinho, não questiones, doze avé marias e sete pais nossos.
Até as franjas da sociedade se envolveram, como exemplificam os negacionistas, para quem o sentido da vida é gritar com megafones e pintar mal em cartão prensado. Se os faz felizes, quem sou eu para discordar.
E este artigo não ficaria completo sem referir os haloistas, aqueles que pensam ter o direito de ter um Halo sobre as suas cabeças e caem de joelhos se não recebem o Halo para se vangloriar de serem os primeiros a falar sobre o seu Halo.
No entanto quem acredito que mais perto chegou de explicar o sentido da vida foram os Monty Python, com aulas práticas de sexo, bébes a cair de vaginas e glutões a explodir após comerem um After Eight. Eu sei que é um caminho estranho de lá chegar mas tudo se resume na conclusão: “Olhem sempre para o lado positivo da vida”. E agora sim Peppa Pig.
Não sei se Peppa Pig nos ajuda a definir o sentido da vida. A razão principal para isso é que Peppa Pig é um jogo que não faz sentido nenhum. Disclaimer: eu tenho 45 anos e não sou certamente o target do jogo. Mas tenho duas filhas. Com a mais velha de 11 anos, assisti com prazer a todos os episódios da Peppa Pig. Agora, com a mais nova de 4 anos, voltei a assistir a toda a série com o mesmo prazer. Peppa Pig é uma série infantil genial que apela à igualdade, à vida saudável nos espaços livres, à amizade sincera e divertida, ao convívio acompanhado e entusiasmado com pais e avós e, acima de tudo, um convite à brincadeira em que todos se podem sujar a saltar na lama e depois deitarem-se a rir de barriga para o ar. Para crianças é uma série perfeita.
Peppa Pig, o jogo, torna todo este divertimento num aborrecido episódio interactivo. Estão lá, bem recriados graficamente, todos os locais familiares da série: a escola, a floresta, a praia, a casa dos avós e até o parque de diversões do senhor Batata. Contudo, a interação com tudo isto limita-se a andarmos para a esquerda e para a direita e a carregar no botão X para interagir. Um só botão, onde cada interação não faz mais do que dar o controle ao jogo para agir sem necessitar de nós. Mas o maior problema de Peppa é a repetição. Um exemplo: O avô da Peppa pergunta-nos se gostamos de aviões. Com o nosso entusiasmo dizemos que sim. O avô vai buscar um avião telecomandado e mostra-nos como se faz para voar. A palavra aqui principal é “mostra”. Nós não jogamos com o avião, apenas nos limitamos a ver. E se alguma vez no jogo voltarmos ao pé do avô e carregarmos no X, já que não podemos fazer mais nada, lá volta a cutscene longa do avião. Isto passa-se com todas as personagens e actividades, onde sempre que voltamos a qualquer lado é como nos vissem pela primeira vez e só podemos repetir ad infinitum (crianças, isto é uma palavra de adulto para muitas, muitas, muitas, vezes) as mesmas acções, ou inacções, que já fizemos. Cada vez que chegamos a casa da Peppa ela diz-nos que o pai dela é o pai dela. Cada vez que chegamos a casa dos avós ela explica novamente que é a casa dos avós e o que eles fazem.

Os leitores do Rubber a rirem com o facto de um gajo de 45 anos analisar a Peppa.
Não há desculpa por ser um jogo para crianças. Com 3 anos, ambas as minhas filhas já interagiam com jogos bem mais complicados no tablet ou na Switch. Será culpa da produtora? Não me parece, já que a mesma é responsável pelos jogos de Paw Patrol, Ben 10, o cavalo Spirit, entre muitos outros jogos para crianças com jogabilidade variada e afinada. Terá sido resultado de imposições da Entertainment One UK responsável pela série? Terá sido preguiça? Nunca saberemos. O que sabemos é que este é um jogo full price que se oferecerem aos vossos filhos eles vão largar rapidamente e regressar à série que é bem mais estimulante.
Um ponto positivo, talvez o único, é a utilização das vozes originais. Outra boa ideia, mas que também parece incompleta, é a possibilidade de limitarmos a jogabilidade a 5, 10, ou 15 minutos. Quando este tempo passa, estejamos em qualquer lado, aparece uma cutscene dos pais a deitarem a Peppa e a câmara desloca-se para a janela com a lua. Se quisermos podemos continuar o jogo (adivinhem lá com qual botão) e a Peppa acorda de manhã. É uma boa ideia para os pais deitarem os filhos usando o exemplo da sua heroína que também já foi dormir.
Então porquê Peppa Pig e o sentido da vida? Porque podemos estar a ensinar às crianças que o seu futuro como adultos vai ser repetir constantemente as mesmas acções e ficar a ver? Não. O Sentido da Vida é nos dado pelo irmão mais novo. Seja o que lhe perguntem, aconteça o que acontecer, a sua resposta resume-se sempre a uma palavra: “Dinossauro!”, que é o mesmo que dizer “whatever” a tudo o que acontece à sua volta. O sentido da vida, por mais que o tentem explicar nestes milénios, é mesmo esse: whatever. Que é a mesma palavra que me veio à cabeça quando terminei o jogo.













