Há uns meses, tive o prazer de jogar A Blind Legend e escrever um artigo sobre ele. Também tive a oportunidade de entrevistar a Dowino, estúdio por trás deste e outros jogos.

João Machado (JM) – Antes de mais, quero agradecer a vossa disponibilidade para esta entrevista, e prometo que vou resistir à tentação de fazer piadas e jogos de palavras à volta de visão. A primeira pergunta que tenho para vocês é porquê criar um videojogo onde não há visão envolvida? De onde veio a ideia?

Dowino (D) – A ideia veio da cabeça do Nordine enquanto ele ouvia uma demo de som binaural chamada “barbearia virtual”. Ele reparou durante essa experiência fantástica que era possível localizar sons de uma forma precisa sem a ajuda dos olhos. A partir daí ele achou que era possível fazer um “videojogo” sem qualquer gráfico.

JM – Num mundo onde tudo é maioritariamente apresentado visualmente, quão difícil foi criar um jogo onde o mundo é apresentado apenas por som?

D – Esse factor influencia cada passo da produção: do script ao level design, e até à comunicação (é difícil fazer um trailer sem imagens). Para nós foi um grande desafio pensar de forma diferente e tentar fazer um jogo com “menos” em vez de “sempre mais”.

JM – Têm receio que o público considerem o vosso jogo um gimick em vez de um jogo completo como qualquer outro suportado num meio visual?

D – Não, porque nós criámos esta experiência não só para invisuais mas também para gamers. É importante para nós fazer um jogo que não exclua ninguém.

blindLegend

JM – No que diz respeito a tecnologia, placas gráficas e monitores vão sendo melhorados para manter-se a par das exigências do público, acham que mais jogos como A Blind Legend, irão causar um upgrade na tecnologia sonora?

D – Não propriamente porque A Blind Legend pode funcionar com qualquer aparelho de som ou headphones. Mas é claro que a experiência será melhor com equipamento de alta qualidade.

JM – A Blind Legend, assim como outros jogos standard consegue ser bastante linear, não há muito poder de escolha no caminho que podemos seguir. Acham que o facto que este jogo é totalmente voice acted e não tem imagens para o suportar o torna mais limitado? Por exemplo com a tecnologia actual, poderiam fazer um RPG com mais escolhas se tivessem fundos monetários e tempo para tal?

D – Já foi um desafio fazer este jogo. E ele é bastante complicado no início para pessoas que conseguem ver. Foi por isso que quisemos manter a história e caminho simples. Mas é claro que seria possível fazer um RPG ou multiplayer, ou melhorá-lo de várias maneiras.

JM – Vou assumir que pessoas invisuais testaram o vosso jogo. Qual foi o feedback? Quais as opiniões de quem habitualmente não pode jogar um videojogo?

D – Realmente foram os nossos primeiros testers. Foram difíceis de agradar de início porque achavam que a localização sonora não era realista o suficiente. Como estão acostumados a localizar tudo deste modo tinham expectativas muito altas. Agora, acham que está óptimo e estão muito contentes que tenhamos desenvolvido algo com tanta ambição. E estão a pedir mais.

JM – De certo modo, este jogo faz-me pensar nas peças de rádio antigas, ou audiobooks mais recentes com uma perspectiva mais interactiva. Era essa a vossa intenção?

D – Nada disso. É por isso mesmo que não há só história e escolhas no jogo mas também várias lutas. Nós quisemos fazer um hack & slash sensorial.

JM – Guerreiros e samurais cegos são muito comuns na literatura, cinema e até banda desenhada ou séries de animação. O vosso cavaleiro cego é inspirado em alguém em particular?

D – Claro que histórias de samurais cegos ou heróis como Daredevil foram algumas das nossas referências, mas construímos Edward Blake pensando que teria sido um cavaleiro famoso como qualquer outro.

JM – Quando encontrei o vosso jogo fiquei curioso, depois de o testar ele roubou toda a minha atenção. Há mais projectos semelhantes em que estejam a trabalhar que possam revelar? Mais aventuras cegas talvez com samurais, ou um western ou noutro ambiente?

D – De momento não. Estamos a trabalhar num jogo completamente diferente: Smokitten, um jogo para deixar de fumar.

smokitten-1

JM – Em que mais estão a trabalhar que possam dizer? O que podemos esperar de vocês no futuro?

D – Estamos a trabalha em vários Gamesforchange lidando com vários assuntos como poupança energética, pobreza, cooperação laboral, etc…

JM – Obrigado.

D – Obrigado.