Quando me perguntam que modas abalam o meu dia-a-dia penso em Zombies, jogos open-world na terceira pessoa repletos de peças e pecinhas para colecionar e enervar, pessoas que ativamente usam as redes sociais para dizer “bom dia” ou colocar mensagens retiradas daquelas páginas de Facebook com frases lamechas ou inspiradoras, e claro, Steampunk. Não sei de onde surgiu, nem como surgiu, mas o gótico deu lugar ao steampunk e começa a ser cada vez mais notório a sua ascensão na cultura-pop como jogos, filmes e BD. Dishonored é um fashion victim, mas no bom sentido da palavra, em vez de se render aos robôs e humanos mecanizados compostos por roldanas e rodas dentadas em sítios que não fazem sentido, oferece um mundo coeso, limpo e bastante atraente.

SteamWorld Heist e Bloodborne são alguns jogos que usam a cultura SteamPunk e as suas “variantes”. Bloodborne inspira-se na era vitoriana, era que ocorre antes da revolução industrial mas que ainda assim contem ligeiros traços dessa mesma cultura, já SteamWorld Heist, o mais tradicional dos dois, vemos robôs movidos a vapor fumando cachimbos e usando cartolas. Dishonored é um misto dos de ambos, pelo menos a nível de ambiente, e é por isso que o adoro.

Eu, fã do envolvente e credível mundo de Bloodborne, nunca fui admirador da forma como se retratava este tipo de “cultura”. Óculos gigantescos na testa, vestimentas negras ou castanhas repletas de folhos e peças metálicas reluzentes, em mundos repletos de tecnologia movida a vapor. Nunca gostei particularmente, não repreendendo quem goste, simplesmente não ligo este estilo à minha pessoa, e talvez fosse por isso que estivesse reticente em pegar em Dishonored 2. Digo de antemão, não joguei o primeiro. “Que sacrilégio, meu Deus!”, dirão alguns, mas de forma a desculpar-me, em 2012 andava encantado com Journey, absorvido por The Walking Dead da Telltale, confuso por Mass Effect 3 e revoltado pelo trágico acidente que foi Assassin’s Creed 3. Contudo antes de pegar neste segundo título decidi jogar o primeiro um pouco, não o terminei, mas ainda consegui jogar algumas horas.

Três parágrafos e ainda nem falei do jogo que este texto pretende analisar, noutros tempos e redações estar-me-iam a crucificar… bem. Dishonored 2 começa de forma abrupta, nunca deixando claro o que raio se passa no evento que desencadeia o curso das nossas ações futuras. Aos olhos de Emily Kaldwin vemos o reino a ser tomado de assalto por uma suposta tia que nunca conhecemos, irmã da falecida mãe do jogo anterior, ex Imperatriz de Dunwall. Caos e desordem instalam-se em nosso redor, e num súbito e forçado momento somos obrigados a escolher entre a jovem e Corvo, pai da rapariga e protagonista do título anterior da série. Optei por jogar com a Emily e não podia ter saído mais satisfeito ao experimentar um novo conjunto de poderes.

A equipa do Arkane Studios optou por uma decisão arriscada mas que acaba por compensar por completo a todos aqueles que queiram aumentar o valor de repetibilidade do jogo. Corvo Attano e Emily Kaldwin não poderiam ser mais diferentes a nível de gameplay, tornando a nossa primeira escolha uma das mais importantes do jogo. De um lado o protagonista masculino do primeiro título, capaz de manipular o tempo e criar um vasto número de ratazanas com as quais podemos ordenar matar ou até mesmo manipular usando Possession, menos furtivo, e do outro lado a sucessora do trono, nova, ágil, capaz de imobilizações à distancia usando o efeito Mesmerize ou Doppleganger para confundir os adversários, que quando combinados com o “efeito” Domino concede brilhantes momentos de estratégia e superação.

A forma como os poderes e os elementos em nosso redor se interligam torna Dishonored 2 elegantemente belo. A liberdade de escolha de ações e movimentos permitem engendrar elaborados planos que noutros jogos facilmente falhariam por mais que tentássemos. Fez lembrar Deus Ex, tanto no mundo como no gameplay, promovendo uma abordagem Stealth em vez de corpo-a-corpo, embora gostasse de um pequeno refinamento no sistema de cover. Foram várias as vezes em que após duas tentativas falhadas visualizei a solução utilizando dois, três ou até mesmo quatro poderes em simultâneo para o resultado perfeito, algo que somos obrigados a alterar consoante o ponto da cidade em que nos encontramos, e que cidade…

Karnaca é o corpo de toda a história durante a maior parte da mesma. Um lugar repleto de segredos, falcatruas e contrabandos, onde a expressão “as paredes têm ouvidos” se encaixa na perfeição. Imaginava eu que encontraria um mundo repleto de geringonças e veículos mecânicos a pairar pelo ar, com cidadãos a exibir as suas mais recentes aquisições tecnológicas, mas não. Em vez disso deparei-me com um mundo mais “terra-a-terra” com tons pastel a tornar tudo coeso e vivo, mas também, morto. Recordo-me de ir de barco até à cidade, e ficar encantado com o que observava, mas mal aportei, observei que nem tudo é o que parece. Por entre a reluzente água dos mares que banhavam a cidade, vermelho. E vermelho era o tom que se fazia notar à sua costa. Ratos, mosquitos gigantescos, canais movendo água turva e encarnada, nem tudo é o que parece, nem tudo é belo, pelo menos nos padrões normais da palavra.

Contudo, é importante notar que o jogo nunca ultrapassa a mesma barreira gráfica e realística que Bloodborne tanto se esforça em fazer. Os tons pastel e o grafismo digno de um filme de animação Stop-motion, retira alguma seriedade, descredibilizando o que facilmente poderia ser grotesco e visceral, tornando-se para mim um dos pontos mais agradáveis da série. Numa altura em que muitos se esforçam por gráficos e mundos super realistas, Dishonored 2 opta por uma personalidade própria distinta dos demais, realçando que se de facto querem “realismo” o importante é trabalhar nos pequenos detalhes como os sussurros entre pessoas, comentando o impacto das nossas ações na cidade ou então as abrangentes formas que temos para navegar pela cidade. Uma excelente direção artística que casa perfeitamente com a seriedade pretendida pelo equipa de produção.

Curiosamente a parte que menos me prendeu foi a história. Notoriamente previsível, nunca oferecendo nenhum elemento de surpresa, algo que contraria tudo o que o gameplay me vinha a oferecer durante a minha sessão. O aborrecimento narrativo acaba por ser abafado pela liberdade da cidade e pela alteração rítmica com que nos deparamos todos os capítulos, oferecendo ao jogador algo novo para lidar e adaptar. Quer sejam novos tipos de inimigos quer seja uma mansão mecanizada, capaz de se transformar de forma à abordagem que pretendamos, quer seja ela agressiva, condenável mais tarde num dos dois finais possíveis, ou não letal. É pena a história não usar estes pontos positivos de forma a oferecer algo mais para colar o jogador ao elemento narrativo.