Heroísmo em rosa pastilha-elástica

Desde a experiência que tivemos ao jogá-lo no Showroom da Nintendo há mais de um mês, que tudo o que o Nintendo Direct e sucessivos trailers que foram sendo apresentados para Kirby Triple Deluxe demonstraram uma grande potencialidade no novo jogo da HAL Laboratory. A ansiedade de o jogar de uma ponta à outra era demasiado incontrolável para esconder.

É verdade que a fórmula de Kirby pouco mudou desde o seu primeiro jogo para o Game Boy, e poucas foram as experiências feitas sobre a série e que se tenham desviado muito da norma estabelecida. Sugar, engolir e cuspir* constituem uma tríade muito simples de acções que se tornaram marca-registada do personagem para que haja um desvio significativo.

Como disse anteriormente, Kirby  é um dos meus guilty pleasures, e um dos quais não abdico. Não só é um dos meus IPs da Nintendo favoritos, mas também um daqueles por quem construo os meus maiores muros de expectativas. Não só porque após mais de 20 anos é seguro dizer que as mecânicas da série estão mais do que aperfeiçoadas, como há algo de verdadeiramente fofo e agradável na bolinha cor-de-rosa com um impressionante poder de sucção. E admitamos: existe maior prazer ao espalhar o caos nos campos de batalha de Smash Bros. do que com uma figura esférica (tipo pastilha que tínhamos no fim de um gelado Epá) que pode “marretar” todos os adversários para fora da arena?

Kirby Triple Deluxe 01

Kirby, Patinador do Gelo, vendido em conjunto com a Barbie-Elsa do Frozen.

 

Ainda que historicamente a componente de plataformas não seja propriamente difícil nos jogos de Kirby, o que os qualifica quase sempre é a forma como os poderes dele nos permitem descobrir segredos e/ou ultrapassar com alguma facilidade os níveis. É aliás na dificuldade que reside um dos poucos, senão o único defeito que encontro em Kirby. Ainda que notoriamente o público-alvo seja mais infantil, grande parte dos mundos são passados como se de uma brisa de Verão se tratassem. A dificuldade, ou melhor, o desafio deste Kirby: Triple Deluxe reside quase exclusivamente na procura de todos os tesouros escondidos: desde as Sunstones que nos permitem avançar pelos níveis e pelos mundos e pelos chaveiros, os elementos coleccionáveis deste jogo. Mesmo os bosses de final de mundo e os bosses intermédios são ultrapassáveis com relativa ligeireza.

Num jogo que começa com o seu arqui-inimigo King Deedee a ser raptado e o seu castelo a ser levado para as nuvens, Kirby acaba por ter à sua disposição uma diversidade de poderes para o salvar (possivelmente a maior até à data, contando inclusivamente com 4 novos poderes). A complexificação que sentimos centra-se essencialmente na diversidade de movimentos e combinações que são possíveis de fazer com cada uma das habilidades captadas dos inimigos. E é possivelmente esta nova camada de complexidade que traz ao jogo uma outra abordagem que responderá às exigências de jogadores mais velhos.

Mas se há uma habilidade nova que me deixou sérias dúvidas sobre o seu equilíbrio é o poder Hypernova, que Kirby obtém através do consumo de uma Miracle Fruit. Com este poder a sua capacidade de sucção torna-se tão forte que consegue desenraizar árvores do chão. O que pareceu à primeira vista, quando experimentámos o jogo no Showroom é que pouco ou nada conseguiria parar o Todo-Poderoso Kirby, o Ultra-Aspirador, e que sendo assim o desafio seria quase nulo. A realidade é que as secções de níveis em que temos acesso este poder acabam por ter boas ideias e curiosas experiências em torno desta sua capacidade em aspirar/mover grandes objectos no cenário.

Kirby Triple Deluxe 02

Novo limpa-vidros que limpa e suaviza: Kirby!

 

Outro bom aproveitamento das potencialidades da 3DS centra-se no uso do giroscópio. Alguns dos puzzles que aparecem em K:TD são resolvidos através dessa componente da portátil da Nintendo, e que nos permite mover carrinhos-de-mão, blocos de pedra, ou taças com água entre outros objectos que compõem alguns (ligeiros)  quebra-cabeças que são constituídos por uma dose infinitamente superior de diversão do que de dificuldade.

Mas a grande inovação e ex-libris deste Kirby: Triple Deluxe é a utilização da tridimensionalidade. Não apenas porque o uso da autoestereoscopia da Nintendo 3DS seja brilhante (que o é), e porque permitiu aos seus criadores trazer-nos um dos jogos de Kirby visualmente mais fantásticos até à data, mas porque a utilização de 2 planos distintos serviu como pano de fundo ao crescimento do próprio jogo. Ao percorrermos as plataformas do mundo deste K:TD vamos ter de oscilar entre o primeiro e o segundo plano para ultrapassar o jogo, mas também para descobrir segredos que por lá se escondem. E são os momentos em que vemos um cofre lá atrás, em segundo plano, que começamos a procurar incessantemente a forma de sermos transportados para lá.

Em relação ao story mode, e à profusão de segredos tenho porém de criticar um desnível em relação aos jogos anteriores. Se parte da magia de Kirby se centra em saber (e antever) que poderes absorver para a zona x ou y do nível, e que era essa a forma de conseguirmos aceder a todas as áreas secretas, percebemos aqui um abrandar dessas opções. Encontrar Sunstones ou chaveiros escondidos é mais uma tarefa de encontrar a estrela que nos teleporta para segundo (ou primeiro) plano do que ter a habilidade certa no momento certo.

Kirby Triple Deluxe 03

Deixa cá apanhar isto que dizem que é especial!

 

Os outros modos apresentados trazem uma outra longevidade ao jogo que vai para além do seu modo de história. Em especial aquele pelo qual todos esperavam desde o seu anúncio no Nintendo Direct: Kirby Fighters. Um modo que se apresenta como uma espécie de Smash Bros. ligeiro em que se opõem Kirbys de poderes diferentes que se digladiam pelo pódio do poder mais poderoso. Passando a redundância é claro. E lembrando uma espécie de Highlander das bolinhas cor-de-rosa com olhos.

Deedee’s Drum Dash é um jogo de ritmo/plataformas que nos coloca na pele (e nas penas) do arqui-rival de Kirby e que, não sendo o momento mais extasiante deste K:TD, acaba por ser um bom momento de diversão simples e descomprometida.

O melhor: o aproveitamento das potencialidades mecânicas da 3DS; a diversidade de poderes e os modos adicionais; a diversão pura e simples.

 O pior: extrema facilidade; pouca exploração dos poderes como forma de encontrar tesouros escondidos.

Kirby: Triple Deluxe é o lançamento esperado, visto que não há nova portátil da Nintendo que não tenha, mais cedo ou mais tarde, uma visita da bola rosa. O grande mérito que aqui existe é no facto de que mesmo num jogo em que aparentemente não havia muito para inventar, soube-se perceber a estrutura que o iria receber e adaptar a jogabilidade e as mecânicas a elas. Poderia ser apenas mais um jogo de Kirby mas soube ser algo mais: ao recriar as plataformas simples da série e dar-lhes outra camada. Uma segunda camada, aliás, e que constrói o próprio jogo na sua diversidade. Kirby Fighters serve como aperitivo a um dos grandes lançamentos da companhia para este ano e deixa-nos a todos a ansiar por mais, e a desejar que chegue Junho para que possamos por as mãos no novos Smash Bros. Apesar do modo história ser um pouco fácil demais, completá-lo vale mesmo a pena. Porquê? Ora, como diria a River Song de Doctor Who: “Spoilers…!” 

*nota: pede-se aos leitores que evitem derivações e descontextualizações do tema, porque não é mesmo essa a nossa intenção. Não esquecer que estamos a falar de um jogo PEGI 7.

 

Kirby: Triple Deluxe é um exclusivo 3DS