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Com um ligeiro atraso de alguns dias, demora essa vítima de um feriado chuvoso e das responsabilidade da paternidade, o Rapaz-Ventoinha desta semana chega não na quinta-feira como é usual, mas nesta segunda-feira que acredito também chuvosa (de registar que o artigo está a ser escrito na madrugada de sábado, portanto a meteorologia é fruto de poderes extra-sensoriais).

Acho que o meu compagnon de route desta rubrica, o João Machado, há de concordar comigo: a grande dificuldade desta rubrica é O QUE escolher dentro do gigantesco e brilhante portefólio da Nintendo desde tempos quase imemoriais, até hoje. Depois de ter decidido que ia olhar para o GameBoy Advance e para o seu catálogo, e de ter escrito e riscado uma série de hipóteses, eis que a decisão da pérola desta semana ficou decidida. Advance Wars. E com isto estaria quase tudo dito.

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Famicom Wars, de 1988

Ao contrário do que muitos pensarão, Advance Wars, o primeiro de quatro jogos com o mesmo nome lançados entre o GBA e a Nintendo DS não é o primeiro jogo da franquia. Esse título é orgulhosamente empunhado por Famicom Wars, de 1988, que abriu a beligerância destes jogos de teor militarístico de estratégia por turnos. Advance Wars é na realidade o sétimo jogo da série Wars, e o primeiro a ser lançado no Ocidente, com alguma relutância da companhia sobre a abertura do mercado ocidental para Turn-Based Strategy em consolas. Um género que o estúdio que o desenvolveu, o mítico Intelligent Systems não só possuía uma expertise imensa, como um catálogo de sucesso comercial e crítico no Japão.

Para surpresa de muitos dos administradores da gigante nipónica, Advance Wars não só foi um tremendo sucesso do catálogo de primeira vaga do GBA, como acabou por abrir portas para o ocidente para outra série cujo sucesso ultrapassou em muito o de Wars, e que, sem qualquer surpresa, foi também desenvolvido pelo estúdio Intelligent Systems. Falamos, é claro, de Fire Emblem, que muito provavelmente será alvo de um artigo aqui no rapaz-Ventoinha. Fanlations dos jogos que lhe antecederam à parte, admito sem qualquer problema que eu, a par de muitos jogadores ocidentais, apenas tive contacto com a série Wars com este Advance Wars. E num período em que, enquanto jogador de jogos de estratégia em PC, via o mercado do género a tornar-se cada vez menos produtivo, foi com uma tremenda surpresa que contactei com este jogo pela primeira vez.

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À primeira vista Advance Wars tinha tudo o que um jogador ávido por TBS poderia esperar, menos um ponto importante: o visual. Era fácil sentir algum preconceito para com o jogo ao observar o visual estilizado e profundamente nipónico, que deixava antever um jogo fácil e “infantil”, imagem essa que o facto do jogo ter sido lançado para o GBA não ajudou. A expressão francófona l’habit ne fait pas le moine não poderia estar mais certa, e só estaria se o monge em questão fosse um soldado cartoonizado. Por cima de todo o aspecto simplista de Advance Wars, os seus criadores construíram um jogo de estratégia altamente complexo, acessível, com uma curva de aprendizagem perfeitamente definida que permite ao jogo ser uma excelente porta de entrada progressiva para o género e a série, como permite aos veteranos dos TBS encontrar um desafio gigantesco num jogo enganadoramente “simplista”.

Não podemos esquecer também de um factor simples: no início da década passada, quando este Advance Wars foi publicado, a ideia de um tutorial integrado/mascarado como missões de “entrada” era algo muito pouco frequente, que advinha de um período em que os jogadores e criadores observavam os manuais como fonte de informações e de pré-aprendizagem para cada jogo. O que demonstra ainda mais o verdadeiro pendor verdadeiramente inovador deste jogo, não só dentro da sua plataforma mas como subtil e silenciosamente influenciou o mercado dos videojogos como um todo, e não apenas com este factor do qual falámos.

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Entre as forças e fraquezas entre unidades distintas, auxiliadas ou prejudicadas pelo terreno em que se encontram, a utilidade dos muitos edifícios, os poderes dos diferentes Comandantes de facções, passando pela importância do clima, tudo isto condensado num pequeno cartucho de GBA, fazendo indubitavelmente de Advance Wars um dos maiores exemplos de equilíbrio perfeito de acessibilidade e desafio.

Infelizmente estamos prestes a entrar no nono ano sem um jogo da franquia Wars ver a luz do dia. É possível que a equipa responsável pela série esteja absorta no sucesso crescente e global de Fire Emblem, franquia irmã e produzida pelo mesmo estúdio, e cuja qualidade e relevância no mercado poderá estar a funcionar como ofuscamento a Wars. O que não só é uma tremenda injustiça, como é também irónico: é possível que se Advance Wars nunca tivesse sido lançado no Ocidente, o caminho de sucesso trilhado por Fire Emblem nunca tivesse sido feito. Pura especulação, bem sabemos. Mas também sabemos que Advance Wars (e qualquer um dos jogos subsequentes e lançados em inglês) são do melhor e mais subvalorizado que o mercado dos TBS tem lançado. E provam que a série Wars, apesar de não viver na ribalta como as muitas franquias fortissimas que a Nintendo possui, é um exemplo da solidez menos conhecida de outras séries menos mediáticas.