Tiny Tina’s Wonderlands demonstra a capacidade da Gearbox Software em detetar um filão de sucesso e expandi-lo, por vezes sem muito esforço. E isso reflete-se na nova aventura que não é mais que um Borderlands passado num mundo de fantasia fantástica. Mas nesta fantasia vale tudo, porque quem está a contar a história é Tiny Tina, uma personagem conhecida do universo, como se este fosse um jogo de tabuleiro típico de um Dungeons and Dragons. Como Dungeon Master, ela faz as regras e isso significa que poderemos utilizar metralhadoras e bazucas num mundo medieval, repleto de magia, zombies e princesas. Vale tudo. 

Por isso, tendo como principal foco os fãs de Borderlands, a maioria das mecânicas baseiam-se no famoso shooter looter. Os esqueletos dropam metralhadoras, escudos de energia e outros itens para melhorarem a capacidade da personagem. E há arcas de tesouro por todo o lado com dinheiro e itens. As parecenças com Borderlands não são coincidências: este spin off acaba por funcionar como uma sequela de um DLC do segundo capítulo chamado Tiny Tina’s Assault on Dragon Keep, que foi muito bem recebido pelos fãs, ganhando assim um jogo completo. Pena que não tenha evoluído mais que isso, porque o jogo parece mais uma expansão. 

Aliás, a sua estrutura é um pouco diferente de Borderlands que apresentava um mundo semiaberto para explorar. No novo jogo exploramos um mapa semelhante a um tabuleiro, onde deslocamos a personagem. As casas servem de acesso aos níveis de ação, com os objetivos propostos pela tresloucada protagonista. E obviamente, como esta manda nas regras, terão igualmente de a ouvir constantemente a tentar debitar piadas, a maioria das vezes sem graça. 

Culpa da escrita pobre, cliché, com trocadilhos que nos passam constantemente ao lado. Porque o voice acting em si é excelente e diria mesmo, mal empregue, com a atriz Ashley Burch em grande forma no papel da protagonista, conseguindo distanciar-se da sua Aloy da série Horizon. E o resto do elenco é igualmente muito bom, salientando-se também Will Arnett como o vilão Dragon Lord. 

Para quem jogou Borderlands 3, estamos perante o mesmo jogo em termos de gameplay. As habilidades especiais da personagem são magias. Por ser um jogo com uma temática mais medieval, há um foco especial para confrontos melee. A personagem tem sempre uma arma de ataque corpo-a-corpo equipada que pode ser um machado, espadas ou punhais. Mas rapidamente vão ignorar porque os inimigos disparam à distância de todo o lado, obrigando a puxar as pistolas e metralhadoras. Claramente o jogo assenta nas mecânicas de shooting dos jogos originais e por isso o combate corpo a corpo não é divertido. 

O jogo mantém também as suas raízes como RPG e vão notar que é preciso fazer grind para melhorar as estatísticas da personagem e recolher melhores armas para poderem avançar na história. Se isso acontecer, basta revisitar as dungeons disponíveis e repetir o processo. Apenas não sei se vão achar divertido fazê-lo neste jogo. Até porque isso aumenta artificialmente uma longevidade que seria bem mais reduzida num sistema de progressão normal. 

E apesar do jogo permitir escolher uma classe, como um feiticeiro ou guerreiro, parece ser mais uma paródia aos sistemas de RPG, porque no final vão estar de metralhadora na mão ou com uma sniper a matar tudo o que mexe. A evolução da personagem e a melhoria das respetivas estatísticas são aspetos secundários, praticamente ignoráveis. No final das contas, a liberdade de escolha das personagens, que mistura elementos de raças típicas dos mundos de fantasia, resulta em algo superficial. Preferia que fossem criadas classes pré-definidas como os habituais títulos da série. 

Esta aventura inspira-se em Dungeon and Dragons e neste caso, são muitas as referências dirigidas aos fãs deste universo. Há constantes piadas e situações que muito provavelmente apenas os jogadores dos jogos de papel e caneta vão compreender. E isso não é incorreto, uma vez que é uma carta de amor dedicada a esta comunidade. 

Ainda assim há bons momentos, alguns encontros com bosses que misturam combates épicos com a paródia com que a aventura nos pauta. E podem sempre desfrutar a aventura com um amigo, que certamente será mais divertido. 

E o jogo é muito bonito e colorido. A arte em cel shading de Borderlands sempre se destacou e nesta aventura há um choque entre os elementos clichés dos mundos de fantasia, como castelos e aldeias medievais, com um toque contemporâneo, não faltando néons e elementos modernos. Há aqui claramente uma referência a mundos como Discworld de Terry Pratchett, que misturam elementos contemporâneos nos seus mundos fantásticos. 

É com alguma pena que sinto que o jogo poderia ser muito mais que uma simples paródia aos jogos de fantasia e de tabuleiro. Não é suposto levar-se a sério, mas a sua estrutura poderia ser mais divertida. Como shooter funciona bem, as armas são poderosas e a sensação de disparo é ótima, mas perdeu-se uma oportunidade de nos oferecer uma experiência mais fantasiosa que o próprio tema nos propõe. É um jogo que nos dá sensações mistas, mas sobretudo, não consegue agarrar até ao fim.