Ah, a pesca. Provavelmente a actividade que mais gosto de fazer em mundos virtuais mas que ou não tenho paciência ou vontade de fazer na vida real. Coisa que estaria aqui empatada com “lutar”, “saltar com os pés em cima de outros seres vivos” e  “matar”, não fosse a possibilidade de descontextualização das minhas palavras ser grande e ainda ir parar às manchetes do CM como ”desconhecido crítico de videojogos indica que mata em jogos para não o fazer na vida real”.

E neste momento atingi o nirvana de sítios para onde desviar a conversa inicial de um jogo para níveis nunca vistos.

O novo jogo da Astragon leva-nos então a esse local místico do qual praticamente só ouvimos falar em noticiários, a Shangri-Lá das pesca, o El Dorado da faina. Falamos, obviamente, do Mar de Barents.

Mas voltando um bocadinho atrás, à faina. Ao contrário do outro senhor, eu consigo distinguir um cão de um atum. Mas não sei distinguir um atum de uma pescada, ou pior um atum de um bacalhau a menos que este esteja cortado a meio e salgado. Adoro peixe, mas o meu conhecimento do mesmo é praticamente nulo se não tiver em consideração o acto de o comer. A minha cultura da pesca, ao contrário da de churrascaria, é nula.

Portanto, a minha grande proximidade com jogos e mini-jogos de pesca sempre se prendeu como uma vertente quase arcade e nada realista das mesmas. Fosse nos tempos idos de ir para o Shire pescar com o Leonel, seja mais recentemente no spinoff de PSVR do FFXV, a aproximação à pesca sempre foi num entendimento mecânico e simultaneamente relaxante, sem ter que me preocupar com questões excessivamente técnicas da actividade.

Antes de entrarmos naquilo que são o conjunto de pseudo-mini-jogos que constituem Fishing: Barents Sea, deixem-me que vos fale da banda-sonora. Algo aconteceu na direcção criativa deste jogo. Algo de bom possivelmente, ou pelo menos estranho. Não pensem que as composições musicais deste jogo são más, muito pelo contrário. Mas não encaixam aqui. Excelentes músicas de synthwave a roçarem o retrowave num jogo que se quer relaxante e descontraído. Seria o equivalente a um Kirby acompanhado por black metal nórdico: são duas coisas dos quais eu gosto separadamente, mas que juntas não casam.

Existe uma noção de progressão cara em Fishing: Barents Sea. Começamos com um barco velho, herdado do nosso avô, e é com ele que temos de mergulhar na faina e tentar fazer os primeiros trocos. Balde de peixe a balde de peixe e lá vamos juntando dinheiro para upgrades até que o montante amealhado nos permita mudar de barco.

Depois de semanas sucessivas a explorar jogos marítimos, é curioso que nos encontramos numa experiência mais realista. Utilizamos diversos métodos reais de pesca, seja ao “anzol” seja ao mais eficaz do ponto de vista de tempo e investimento: a rede. A nossa eficácia vai depender muito das estatísticas dos membros da nossa tripulação, que, como seria de esperar, fazem level upExiste um mini-jogo que nos relembra Cooking Mama e que nos impele a cortarmos e prepararmos os peixes que pescámos para que subam de qualidade e sejam vendidos mais caros ao final da jornada.

Curioso que este Fishing: Barents Sea tenha chegado mais ou menos ao mesmo tempo que Sailaway, já que os dois abordam lados completamente distintos da simulação: um a parte profissional e a outra recreativa. E é com essa visão que temos de olhar para Fishing: Barents Sea, como uma reprodução de uma profissão com o grind associado. Parece estranho observarmos a pesca com os olhos das mecânicas dos videojogos, mas em extremo, as nossas profissões são fruto da repetição diária de uma série de modelos com mais ou menos variáveis.

Fishing: Barents Sea é mais um jogo de nicho dentro do grande nicho dos simuladores. Competente, simples, e realista, tenta trazer a experiência da faina a um público alargado. Não consegue, porém, demonstrar o quão dura é a vida dos pescadores, e o quão violenta a profissão é. Faltar-lhe-ia isso para fazer muita gente respeitar a faina.