
Scarlet Nexus poderia ser uma adaptação de um qualquer anime a videojogo, algo que Bandai Namco está mais que habituada a fazer. Mas não, estamos perante um universo original, criado por nomes ligados à série Tales of, e que curiosamente vai dar origem a uma série animada. E de facto, a primeira coisa que salta à vista é a qualidade das animações, do grafismo em cel shading. Mas é quando pegamos no comando que confirmamos onde o jogo realmente brilha: nos seus intensos combates.
Este novo título foge do conceito habitual dos RPGs da Namco, como Tales of Vesperia ou Tales of Berseria. Estamos perante um RPG de ação, com combates intensos, que mistura ataques melee com habilidades especiais de telecinésia, permitindo arremessar praticamente todos os elementos do cenário contra os inimigos. Mas este sistema é fluído e muito bem integrado nos combos, fluindo de forma natural, tornando a ação ainda mais divertida. Mas já lá vamos.
Scarlet Nexus é aquilo que a Bandai chama de brain punk game, porque mexe com habilidades mentais, viagens no tempo e introduz monstros, conhecidos como The Others, como aberrações que invadem as cidades para devorar os cérebros da população. A história está longe de ser fácil de digerir, por ser realmente longa e elaborada, e apresentada em duas partes, ou melhor, em duas perspectivas distintas dos protagonistas Yuito Simeragi e Kasane Randall, com cerca de 25 horas cada para completar.
As campanhas apresentam eventos da história principal distintos e cada personagem é acompanhada pelo seu próprio grupo de companheiros. Assim, para terem uma total imersão na trama devem completar ambas as campanhas.

Nesta história, as duas personagens pertencem à OSF, a Other Suppression Force, uma task force criada para lidar com as criaturas, numa vibe muito próxima de Attack on Titans. Até porque as Other podem ser criaturas gigantescas, deformadas, e altamente bizarras. Provavelmente o design mais bizarro de inimigos para lá da série Souls.
A OSF é uma força especial que recruta jovens com habilidades únicas. Os protagonistas lidam com a telecinésia, mas outros têm a capacidade de invisibilidade, de se teleportar, usar elementos como a eletricidade, o fogo ou ultra velocidade. O melhor é que essas habilidades únicas estão integradas na ação de uma forma exemplar.
Como referi, a mente e o cérebro são elementos centrais em toda a trama, mas também na jogabilidade. É que todos os soldados da OSF estão igualmente ligados através de uma tecnologia chamada Brain Link. Na prática, embora o protagonista possa ser acompanhado de mais três companheiros presencialmente, as habilidades das restantes podem ser configuradas e utilizadas no combate, mesmo sem a sua presença. E podem utilizar até oito habilidades dos companheiros em simultâneo.
Ao contrário dos combates por turnos, as personagens são totalmente autónomas nos seus ataques. Podem configurar as suas responsabilidades e prioridades, tais como curar o grupo ou atacar de imediato os inimigos, por exemplo. E devem ser recuperadas quando tombam em combate. Mas o importante é ter em conta a sua habilidade especial, que necessitam, ora para resolver puzzles práticos durante a exploração, como nos combates. Pois os inimigos podem ter fraquezas a determinado elemento, sendo possível combinar habilidades para resultados eficazes.

Por exemplo, através de telecinésia arremessar um bidão de água para cima de um inimigo, e depois usar a habilidade da personagem que lida com a eletricidade; ou derramar combustível e depois atear fogo. São várias as combinações que podem ser feitas, para além dos combos gerados pela espada do protagonista. Todas as habilidades são geridas por cooldown de recuperação rápida, permitindo usar constantemente as mesmas, tornando o combate divertido e intenso.
Os inimigos também têm escudos e proteções que muitas vezes necessitam ser quebrados para sofrerem danos. Outras têm pontos fracos que devemos descobrir a melhor abordagem. Como por exemplo, um monstro cujo ponto fraco são as pernas, mas quando nos aproximamos ativa uma gaiola de proteção. É necessário usar a invisibilidade para quebrar o escudo, e depois atacar com tudo.
Os combates são realmente o ponto forte da aventura, com diferentes aberrações para enfrentar, uns até são invisíveis sendo necessário usar poderes de clarividência para os detetar. Os combates parecem mesmo saído das mãos da Platinum Games ou da Capcom, como se tivéssemos a jogar Devil May Cry, intensos, desafiantes e repletos de adrenalina.
As habilidades telecinéticas dos protagonistas são intuitivas, bastando premir o gatilho direito para arremessar objetos a um alvo pré-definido; ou usar o gatilho esquerdo para interações mais complexas, nomeadamente empurrar veículos ou outros objetos que se seguem de quick time events para efeito mais letal. As habilidades da personagem têm uma barra que vai enchendo constantemente com os ataques físicos dos combos, pelo que alternar entre ambos é simples e divertido de executar.
O melhor mesmo é que o jogo faz um excelente trabalho a ensinar progressivamente as opções e variações, tornando mais fácil absorver todas as suas mecânicas. E tal como os demais RPGs, a experiência acumulada serve para distribuir pontos numa árvore cerebral, dando acesso a mais combos e melhorias nos ataques gerais.

Algo que a equipa não descurou na narrativa é a importância de cada personagem secundária que nos acompanha. Os jogadores terão tempo de conhecer a fundo cada uma delas, não apenas nas extensas sequências animadas, como diálogos. O estúdio fez um excelente trabalho neste campo, oferecendo um misto de sequências geradas com o motor do jogo, que parece anime, assim como constantes diálogos em forma de quadros que parecem saído das revistas de manga. E todas as interações são vocalizadas, originando dezenas e dezenas de horas, tanto em inglês como em japonês.
E para aprofundar ainda mais o conhecimento das personagens, entre cada capítulo há uma espécie de intermission, onde todos se encontram no esconderijo, havendo missões específicas para melhorar a relação pessoal com a mesma, incluindo a oferta de prendas. É um conceito semelhante a um Mass Effect, por exemplo, mas o propósito é mesmo conhecer um pouco mais do background destas personagens muito interessantes. Além disso, na prática, melhorar os seis níveis de afinidade com cada uma, significa acesso a uma melhoria da sua respetiva habilidade especial no combate.
Talvez um detalhe que passe despercebido por muitos jogadores, é o excelente guarda-roupa das personagens. Se notarem, todas elas apresentam uniformes militares, mas cada um com elementos únicos, como capas ou gabardines, que lhes dão um toque de personalidade adicional.
Também os cenários onde decorre a ação são detalhados e muito interessantes no seu geral. Todas as áreas funcionam como mapas interligados como hubs. Apesar de dar um ar de open world, o jogo é extremamente linear, mesmo ao nível da exploração. O que não é significativamente mau.

No entanto, não se espere uma maior profundidade para além da campanha narrativa. O jogo tem um sistema de Quests mas é muito pobre, normalmente é pedido para eliminar determinado tipo de inimigo, de uma certa forma ou golpe. Ou recolher um número específico de itens que se encontram no cenário ou como espólio dos inimigos. Apesar de recebermos as quests em personagens espalhados pelas zonas da cidade, podem reportar de imediato assim que as terminam, diretamente da lista. Um sistema básico, dirigido apenas para os completionists.
Scarlet Nexus é excelente, um dos melhores RPGs do ano, com valores de produção elevados. Tem uma direção artística excelente, uma banda sonora de luxo e um elenco de personagens que ajudam a aprofundar uma narrativa, por si complexa, num trabalho muito bom dos atores. Mas é o sistema de combates que torna a experiência ainda mais divertida, tornando este RPG muito recomendado, mesmo para quem não aprecia este tipo de produções nipónicas.













