Se os dois fighting games “principais” fossem reduzidos a uma questão de equipas como aquele pesadelo chamado Twilight eu seria claramente Team MK. Adoro Street Fighter, mas por razões que já aqui descrevi tenho uma ligação afectiva muito grande com a série criada por Ed Boon e companhia. O problema entre as duas é que a série da Capcom conseguiu ser consistente, ainda que com altos e baixos, mas Mortal Kombat entrou num ribanceira interminável desde que passou a jogo tridimensional. Seria apenas em 2011, com o reboot da série já sob o chapéu da WB que Mortal Kombat se reencontraria e faria aquele que é para mim o melhor momento da série.

Esse reboot teve um grande peso narrativo, mas ao contrário de outras experiências passadas, muito bem desenvolvido. É impressionante a forma como os NetherRealm Studios foram afinando a sua marca nesta década com um aperfeiçoado sentido narrativo, criando não só dos melhores enredos para um fighting game, como tornando a interligação entre o combate e a história momentos de fluidez orgânica.

Mortal Kombat 11 surge assim não como um volte-face na série, mas sim como uma conclusão ao arco começado no jogo de 2011, tanto em termos narrativos, como em termos mecânicos, onde aplica mais algumas alterações ao mindset de MK desta década. 

MK11 apresenta uma nova vilã: Kronika, uma deusa que controla o tempo e cujo objectivo é eliminar Raiden que andou nos jogos anteriores a alterar o continuum temporal. Felizmente, diria um whovian, que não são fixed time points, senão lá teria o Doctor de intervir.

Ainda que o seu poder seja imenso, Kronika acaba por recrutar alguns dos Kombatentes (lamento a utilização do K, mas continua a ser a forma como o léxico de MK funciona) do presente e do passado, o que cria algumas das linhas de diálogo mais campy, mas também mais deliciosas do jogo. Ver um Johhny Cage quarentão a confrontar a sua versão mais jovem é um momento divertido, que contribui para um enredo que se vai sabendo equilibrar entre os momentos de humor ligeiro e a seriedade da ameaça de Kronika, e do próprio Raiden corrompido que decide acabar com a ameaça sobre o Earthrealm matando os seus opositores.

Já aqui referi também que o primeiro filme de Mortal Kombat, realizado por Paul W. S. Anderson é um dos meus filmes de luta favoritos, sendo que a sua sequela é um dos piores filmes que tive o desprazer de alugar em VHS num videoclube. A conclusão do arco de história destes 3 jogos do reboot de MK, com o seu enredo bem-definido e uma abordagem cinematográfica no seu desenrolar, acabam por ser, para mim, as sequelas que o primeiro filme merecia, mesmo que num medium diferente.

Como nos anteriores, a transição das cutscenes para o combate é feita de forma tão inteligente e fluída que ficamos com dúvidas se é o combate que desponta dos vídeos ou se são os vídeos que vão desembocar nos momentos jogáveis. O aperfeiçoamento da sensibilidade destas mesclas tinha sido feita de forma brilhante em Injustice 2 e ganhou aqui o próximo patamar de definição.

O ritmo do combate, como seria de esperar, é mais compassado. Longe do frenetismo de outros jogos do género, Mortal Kombat 11 regressa fiel à sua identidade nesta década, em que o conhecimento profundo das capacidades, movimentos, alcances, ataques especiais e combos dos nossos personagens transformam o combate num jogo de gato e rato pela abertura perfeita para dar dano ao nosso adversário.

Numa certa clarividência mecânica, os criadores dos NetherRealm Studios apostaram em criar duas barras especiais que se enchem à medida que vamos desferindo e bloqueando golpes. Uma delas pode ser usada tanto para bonificar um ataque e a outra para special escapes.

Os ataques X-Ray, que tantas delícias fizeram pela sua violência gratuita, transformaram-se em algo diferente. Sempre que um lutador tem a sua barra de vida abaixo dos 30% tem a possibilidade, uma vez por ronda de desferir um Fatal Blow, que funciona em termos mecânicos e estéticos como um X-Ray.

Porém, o mote deste MK11 é mesmo customização. A aposta de game design de MK11 está toda na customização dos personagens, cada um com 3 slots para colocarmos o que quisermos, de movimentos específicos a skins. A customização não se fica por aqui, e para todos aqueles que gostam de “afinar” o comportamento dos seus inimigos nos modos single player, MK11 permite que façamos alterações à IA e à eficácia que esta tem em cada aspecto do combate, tornando a experiência single player completamente customizável.

A forma de fazer grind de unlockables está ostensivamente bloqueada atrás de uma parede de 3 tipos de moedas diferente, ganhas em jogo, para além de microtransações com dinheiro real de uma 4a moeda, os Time Krystals. A aposta neste modelo de negócio, infelizmente, acaba por mais uma vez estar presente em MK, mas visto que o conteúdo principal não está bloqueado desta forma, restando questões cosméticas, não existe prejuízo para o jogador. A menos que queria gastar o seu dinheiro, é claro…

Visualmente brilhante, com diversos modos single player, onde destacamos o modo de história por mostrar o desfecho do enredo que começou há 8 anos, com personagens novos e tantos outros modos multiplayer, Mortal Kombat 11 vem aprovar (se é que ainda alguém requeria provas disso) a decisão da WB Games em criar os NetherRealm Studios como uma aposta brilhante nos seus jogos de combate. Não só elevou Mortal Kombat para o patamar qualitativo e de sucesso comercial onde ele já esteve, como tem aqui neste MK11 um final condigno a um dos melhores arcos narrativos de um fighting game de sempre.