Alguns dos nossos leitores (e até alguns membros da redacção) podem atestar as minhas palavras: partilhar videojogos com os filhos é das melhores sensações que podemos sentir. E se para mim o sentimento não é inédito, e puxando pela memória a experiência de ter um roguelike family-friendly também não, mas há algo de verdadeiramente divertido em Juicy Realm, especialmente quando jogado em modo cooperativo. 

Nota: este artigo vai estar cheio de piadas secas e maus trocadilhos sobre fruta e sumo. Pedimos desculpa desde já por isso.

Desenvolvido por um pequeno estúdio chinês de duas pessoas chamado SpaceCan, Juicy Realm até podia ser apenas mais um twin-stick shooter roguelike genérico não fosse a sua brilhante direcção artística e exímia execução a obrigarem-nos a dar-lhe atenção. Num mercado cheio de marca branca do Continente, ser um Compal Vital ACE é um delicioso elemento diferenciador.

Preparado para a kamikancia ou a melancikaze.

Já nem me lembro se existe justificação conceptual para andarmos aos tiros a fruta humanóide para além de uma suposta inversão da cadeia alimentar causada pela evolução, mas isso pouco interessa, porque assim que começamos a deambular pela floresta inicial sentimos que o jogo tem secções é que não é pêra doce. As simpáticas maçãs e melancias que por lá andam estão armadas até às sementes e querem-nos limpar o couro, provavelmente porque depois de alguns séculos as plantas chegaram ao topo da cadeia alimentar. E agora, vegans?

O visual, como dissemos, é divertido, e perfeito para jogar com uma criança ao lado. Apesar das chuvas de tiros que tornam Juicy Realm duro de roer, mas não tanto como outros roguelikes que roçam o bullet hell, onde habitualmente há sangue jorra polpa, onde costuma haver cadáveres existem pedaços de frutas óptimas para uma sobremesa. Espero que nenhuma fruta ou vegetal tenha sido magoado na elaboração deste jogo, senão de certeza que vai haver molho. Ou pelo menos calda de fruta de certeza.

Apesar de ser também direccionado para os mais novos, a dificuldade de Juicy Realm mostra porque é que em muitos aspectos ele é um verdadeiro filho da fruta. Temos um dash à nossa disposição que nos permitem passar nos intervalos da chuva mas as armas têm munições contadas, e se estas nos falharem vamos mesmo ter de atacar no corpo-a-corpo, numa verdadeira luta homem-fruta que deixaria os envolvidos do Apito Dourado a corar. 

Sim, esta arma chama-se Steam e dispara tags de desconto.

Pelo caminho vamos descobrindo novo equipamento como quem vai à zona de frescos do hipermercado e descobre o que é uma “anona”, “fruta-pão”, uma “begaia” e uma “jaca”. Destas apenas a “begaia” foi inventada, e estávamos apenas a testar a vossa capacidade de concentração. Como os sumos de fruta. Perceberam?

As boss fights são divertidas e envolvem o reconhecimento de padrões de ataque das frutas gigantes que nos atacam. Seja a melancia gigante cuja casca grossa a torna invulnerável a disparos e que necessita de umas explosões para ficar exposta, ou o bolo de fruta e chantilly que vai perdendo a armadura em forma de cobertura. Conhecermos e deflectirmos os ataques dos inimigos e aproveitarmos a suas fraquezas, o habitual dos jogos desde tempos imemoriais ou para os mais jovens aquilo que Dark Souls “inova” mas em que os monstros podiam ser comidos com maça e kiwi.

Frutas não hei de eu comer?

Juicy Realm é relativamente curto, com um ciclo e diversidade de níveis limitado, o que o torna ora um excelente jogo para speedrunners ou uma espécie de porta de entrada frutada para os roguelikes para pequenos e graúdos. Mas acaba-se demasiado rápido e sente-se que apesar de divertir durante o tempo que dura, acaba por ser muita parra e pouca uva.

Com personagens jogáveis com habilidades diferentes, há algum sumo em Juicy Realm, mas não tanto que espremido dê muito tempo de consumo. É um doce néctar que quase se bebe de um trago, mas que se sente que apesar do pouco volume foi feito com frutas de alto calibre. É mais um shot de concentrado de sumo do que uma caneca de refrigerante, e por vezes é mesmo isso que queremos para matar a sede.