
Caça ao Indie #306
Há frases que me irritam. Lugares comuns que entraram no léxico quotidiano e que me fazem erupções cutâneas de as ouvir. Uma delas é “pensar fora da caixa”. Uma daquelas frases irritantes que parece que ouvimos numa conferência para jovens empreendedores patrocinada pela IL, ao lado de uma série de anglicismos que poderiam ser substituídos por palavras correntes da língua portuguesa.
Os dois indies de hoje falam de caixas e de quebra-cabeças, em exemplos em que é a própria caixa quem é o puzzle.
Sokobos [PC]

Vamos a um momento The More You Know? Conhecem o subgénero de jogos de puzzle intitulado Sokoban? Um género que deve o seu nome ao jogo japonês homónimo lançado no NEC PC-8801 em 1982? Um tipo de jogo bidimensional que envolve empurrar uma série de caixas para um espaço limitado, sendo que estamos impossibilitados de puxar as caixas, e facilmente podemos encravá-las na parede ou umas contra as outras.
Já todos jogámos jogos do género – ou pelo menos níveis do género – mas aquilo a que Sokobos se compromete a fazer consegue ser original puxando ao mesmo tempo por elementos revivalistas, tanto mecânicos como artísticos.

Misturar elementos visuais dos tempos da Atari com mecânicas contemporâneas, encapsulando em tudo isto uma direcção artística e conceptual da Grécia Antiga.
Somos Ésquilo, a quem os Deuses dotaram de uma força sobre humana (e talento literário, se percebem a minha referência), e que tem a tarefa de erigir um templo a Zeus. Cada nível é uma parcela dessa construção, em que vamos arrastando diversos blocos distintos para a sua posição, cumprindo os 60 puzzles Sokoban que o jogo tem ao nosso dispor.

Em termos de qualidade de vida, Sokobos tem dois aspectos interessantes: a possibilidade de fazermos undo a um número ilimitado de passos, e a capacidade de saltarmos um nível se ficarmos bloqueados.
Com um género que faz 40 anos este ano, Sokobos conseguiu ser simultaneamente entusiasmante e original, num desafio refrescante que por vezes faz tangente com uma tragédia grega.
The Last Cube [Switch, PS4, PC, Xbox One, Mac, Linux]

Falando em puzzle games que utilizem caixas e mecânicas revivalistas, encontramos The Last Cube, criado por Max Samarin no seu estúdio Improx Games. Sabem aqueles puzzles que alguns jogos de plataformas tridimensionais nos trazem, em que temos de rodar um cubo com diferentes faces de forma a que ele fique assente com a face correspondente num local específico? É claro que sabem. Só não sei se à semelhança com Sokobos se existe nomenclatura para isso, se o souberem, informem-me.
Em The Last Cube nós somos o próprio cubo, o titular último cubo que tem de atravessar um mundo misterioso e desolado, resolvendo sucessivos puzzles pelo caminho.

Em cada zona existem autocolantes que podemos colar às faces do nosso cubo. Mas ao contrário do que muitos jogos fizeram com este tipo de puzzles e mecânicas, em The Last Cube os autocolantes conferem-nos atributos específicos, que mudam, por exemplo, a nossa forma de locomoção, sendo que estes poderes só são ativados quando a face correspondente está visível no topo do cubo.
A complexificação dos níveis vai obrigar-nos a carregar connosco uma panóplia de adesivos diferentes com poderes distintos, e a resolução de cada puzzle vai obrigar-nos a planear muito bem cada passo, cada utilização de poder e cada movimento.

É curioso ver como é que tendo por base uma mecânica que já tantas vezes vimos, Max Samarin conseguiu fazer algo verdadeiramente original, repensando as mecânicas associadas, complexificando-as, e criando um puzzle game interessante e desafiante.













